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sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Roubaram até nosso século 18



Por Reinaldo Azevedo, 23/09/2016,
www.folhades.paulo.com.br

Lula poderia ter escolhido um fim mais digno.

Olho para o homem que sai vociferando palanques afora melancolia, ressentimento e bravatas e me dou conta do desfecho miserável que terá a personagem inventada pelos sonhos de reparação da esquerda intelectual brasileira. 

O retirante pobre, operário de baixa escolaridade e militante sindical que chegou à Presidência da República tinha tudo para ser um exemplo do milagre da democracia. Em vez disso, a sua maior obra, já apontei uma vez nesta coluna, foi ter recuperado a comunhão etimológica entre "política" e "polícia".
 
De tal maneira fez uso das licenças da democracia para corrompê-la que ninguém se mostra disposto a ouvir nem eventuais restrições procedentes à forma como se dá a merecida persecução penal dos crimes cometidos pelo partido, por seu representante maior e por seus sócios. 

Acuado pelos fatos, Lula decidiu reviver a figura do mártir, que, segundo ele mesmo, está sendo perseguido por ter tido a ousadia de tirar os brasileiros do século 18. A fala tem o seu encanto involuntário. O século 18, no Ocidente, costuma ser celebrado como aquele em que o homem redescobriu as Luzes. Em certa medida, o Apedeuta não nos tirou "do" século 18. Ele nos roubou também "o" século 18. 

É compreensível que Lula busque tal conforto moral. Ele já não tem mais tempo de se reinventar. Mas não é sem estupefação, embora não me surpreenda que os, vá lá, ditos "intelectuais de esquerda" se neguem a reconhecer, com o esfacelamento do petismo, o último suspiro da ilusão de que um ente de razão pode, mais do que governar, substituir a sociedade. 

Um líder e um partido que estivessem conformados com a democracia nem enxergariam na vitória dos adversários o triunfo de uma conspiração nem numa eventual virada do jogo, se um dia vier, a redenção da verdade e o juízo final. A razão é simples: esse pensamento ou pertence à esfera religiosa, escatológica, ou à cultura revolucionária. E revolução se faz com sangue. Eventualmente, pode-se tentar aniquilar o "inimigo" com mensalão, petrolão e outras corrupções da verdade e da vontade. 

Não tivesse se tornado boneco de ventríloquo da esquerda, anunciando velharias cuja exata extensão desconhece, Lula poderia ter sido nosso Lincoln, mas sem desfecho trágico. Em vez disso, tornou-se um zumbi. 

DISSONANTE
 
Escreveu Sergio Moro ao aceitar a denúncia contra Lula: "É durante o trâmite da ação penal que o ex-presidente poderá exercer livremente a sua defesa, assim como será durante ele que caberá à acusação produzir a prova, acima de qualquer dúvida razoável, de suas alegações caso pretenda a condenação. O processo é, portanto, uma oportunidade para ambas as partes". 

Sem a última frase, seria apenas uma tautologia. Acrescido o trecho daquele rabicho, aí se está diante de um entendimento torto do que é o direito numa democracia. Caberá sempre ao acusador o ônus da prova. O acusado não tem como produzir prova negativa. Não se trata, pois, de "uma oportunidade para ambas as partes" porque estamos falando de estatutos absolutamente diversos. As palavras fazem sentido, e eu cobro o sentido das palavras. De um petista ou de Moro. 

MANTEGA
 
Prisão e soltura nada têm a ver com Justiça e cumprimento da lei. Chanchada. Força-tarefa e juiz quiseram dar um recado: "Mandamos soltar e prender quando nos der na telha. São todos criminosos". E são. Mas se age como se não houvesse lei. A cereja do bolo é a divulgação do vídeo com Eike Batista. A revelação de um crime serve para lavar uma arbitrariedade. É um mau caminho.

STF e os remédios: que tal o Brasil decretar a ilegalidade do amor não correspondido?



É evidente que país nenhum do mundo dá tudo a todos, desde que se prove a necessidade. Deus parou de despejar maná no mundo faz tempo

Por Reinaldo Azevedo, 29/09/2016,
www.veja.com.br

Sim, o tema é polêmico e remete à forma como se entende um “direito” no Brasil, que tem sempre um aspecto curioso: ele é visto segundo a ótica de quem recebe um benefício, nunca de quem arca com o custo de sua existência. Explico melhor: garantem-se primeiro os direitos e só se pensa depois de onde sairão os recursos. É do balacobaco!

Chegaram ao Supremo duas demandas. A de uma mulher, do Rio Grande do Norte, que precisa de um tratamento com um remédio caro, que inexiste no SUS. E a de um homem que pede que o Estado importe uma droga que não tem ainda registro na ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Num tema assim, é muito fácil tomar uma decisão simples e errada, como fez o ministro Marco Aurélio, relator, que já havia votado, de forma razoável, que o Estado tem de arcar com o custo, não importa qual, desde que o remédio esteja registrado na ANVISA. O julgamento havia sido suspenso diante de um pedido de vista de Roberto Barroso.

Ao ser retomado, Marco Aurélio resolveu rever seu próprio voto e mandou bala: pouco importa o remédio, tenha ou não o registro da ANVISA, tem de ser fornecido pelo Estado desde que devidamente regulado em seu país de origem. O paciente só precisará demonstrar que não pode contar com a solidariedade familiar para arcar com o custo do tratamento.

Barroso votou, basicamente, segundo as restrições propostas pelo Ministério Público Federal: é preciso haver um critério, e não se pode garantir tudo a todos. Assim, a droga tem de estar disponível no SUS, e o paciente tem de provar que dele necessita.

Caso não esteja, o fornecimento deve se dar segundo critérios:

– comprovação de que o paciente não dispõe de recursos;

– que não haja tratamento semelhante disponível no SUS;

– comprovação de que a droga é eficaz;

– que a União compartilhe o custo do fornecimento;

– e isso vale apenas para remédios com o registro na ANVISA, 

   ou, então, será preciso demonstrar que o órgão demorou mais de
um ano para aprová-lo.

Edson Fachin introduziu alguns matizes, mas deu um voto muito próximo do de Marco Aurélio.

Vamos lá

Nós todos podemos — e talvez até devamos — achar que todos os homens têm de ter acesso a tudo o que oferece a tecnologia de ponta, na área da medicina e em outras quaisquer, para tornar a nossa vida mais digna. É um fundamento.

Depois é preciso pensar nas possibilidades. O Estado não é um saco sem fundo ou uma mina de dinheiro. É claro que é preciso estabelecer alguns critérios. O voto de Marco Aurélio é um caso clássico de solução simples e errada para um problema difícil. Em última instância, ele diz: “Passem no guichê”.

Que o Estado faça um esforço para atender às demandas, sim, mas que se estabeleçam regras, que têm de atender, não há como, primordialmente a uma maioria.

Parece cruel dizer, mas é só realismo: os portadores de doenças raras, que precisam de remédios que nem estão na lista da agência brasileira, têm a alternativa de mobilizar parentes e a sociedade para tentar conseguir a substância.

O mundo é o Éden?

Essa sociedade só dos direitos, sem que se diga de onde saem os recursos, tem um fundo que é, na verdade, religioso. Parece que o mundo está destinado a ser o Éden, nós todos somos os eleitos, e o Ser Supremo nos alimenta todos os dias com maná. Bem, não é assim que toca a música. Os recursos são limitados para necessidades que, em essência, são ilimitadas.

É fácil jogar tudo nas costas do Grande Pai — no caso, o Estado, não Deus. Quando o país fica com um déficit de R$ 170,5 bilhões, aí se descobre que, então, é preciso manter os juros na casa do baralho; que é preciso cortar gastos, que é preciso fabricar recessão, que é preciso optar pelo desemprego…

“Reinaldo está dizendo que os portadores de doenças raras são os responsáveis pela crise brasileira?” Não! Não está.

Reinaldo está dizendo que não dá, como lembrou Barroso, para garantir tudo a todos. Sim, meus caros, as pessoas precisam de óculos, de próteses, de palmilhas, de remédios, de transporte, de saúde, de educação, de segurança, de comida, de renda, de camisinha, de pílulas anticoncepcionais, de pílula do dia seguinte, de remédios raros e caros, de felicidade…

O senador Cristovam Buarque (PPS-DF) chegou a sugerir que a nossa Constituição abrigasse o direito à felicidade. Já imaginaram? Seria o fim do amor não correspondido.

Mas alguém paga por isso.

Quem paga?

O mundo de Marco Aurélio, tudo indica, ainda é aquele em que o Estado tutela a sociedade. Eu prefiro, e não é retórica, um em que a sociedade tutele o Estado.

Ah, sim: Teori Zavascki pediu vista, e o julgamento foi interrompido.

Um tiro nos pés… de Lula



Quem no Brasil ainda teme que Lula, duas vezes réu e agora sem máscara, ainda reine?

Por Augusto Nunes, 22/09/2016,
 www.veja.com.br

Texto de José Nêumanne publicado no Estadão

Do alto de sua empáfia, o decano dos suspeitos submetidos a investigações no Supremo Tribunal Federal (STF) e auxiliar de fatiador da Constituição Renan Calheiros, presidente do Senado, disse: “O exibicionismo da Lava Jato tira prestígio do Ministério Público”. Agora cessa o que a antiga musa canta, pois um poder mais justo se alevanta: o juiz federal Sergio Moro calou os críticos da força-tarefa da “república de Curitiba” ao aceitar a denúncia dela contra Lula.

Ainda é difícil saber se, mesmo não estando mais incólume, o teflon que protegia Lula perdeu a capacidade de lhe manter o carisma. Antes de Renan, outros críticos desdenharam do pedido de sua prisão pelo promotor paulista Cássio Conserino. Tal impressão foi desfeita pela juíza Maria Priscila Ernandes Veiga Oliveira, da 4.ª Vara Criminal de São Paulo, que não achou a acusação tão imprestável assim: afinal, não a arquivou e, sim, a encaminhou para o citado Sérgio Moro, titular da 13.ª Vara Federal do Paraná e responsável pela Operação Lava Jato, decidir. E as mesmas vozes ecoam esgares e esperneio da defesa de Lula contra o show de lógica clara dos “meninos de Curitiba”.

Acontece que em nada o dito espetáculo de uma semana atrás diferiu das coletivas anteriores, realizadas para a força-tarefa da Lava Jato comunicar à população, o que é necessário nesses casos pela gravidade dos crimes investigados e pela importância dos acusados sobre os quais recaem as acusações. À exposição sobre o cartel de empresas compareceram os mesmos procuradores, foi apresentado um libelo acusatório mais copioso (de quase 400 páginas à época e de 149 agora) e também se utilizaram recursos visuais (powerpoints) para ilustrar informações e explicações. Ainda como em todas às vezes anteriores, nesta a defesa do Lula respondeu apelando para recursos idênticos, e agora com uma agravante: a insistência numa frase para desmoralizar os procuradores, mas que não foi dita por nenhum deles: “Não temos provas, temos convicções”.

Em parte por nostalgia de suas ilusões, como milhões de brasileiros encantados com o coaxar rouco do líder que Brizola chamou de “sapo barbudo pra burguesia engolir”, em parte por medo da vingança do ex-ídolo, se lhe forem devolvidas as chaves dos cofres da viúva, os neocríticos crédulos perdem o sono. O pavor do chororô da jararaca que vira crocodilo é antigo. Em 2012, a delação proposta por Marcos Valério Fernandes, que cumpre pena pelo mensalão, sobre a compra do silêncio de um chantagista que ameaçava comprometer Lula, José Dirceu e Gilberto Carvalho na morte de Celso Daniel, sucumbiu à omissão do então procurador-geral, Roberto Gurgel, e do ex-presidente do STF Joaquim Barbosa.

O episódio acima foi narrado ao juiz Sergio Moro por Marcos Valério Fernandes, cuja versão não foi levada em conta porque seria um “bandido apenado”, ao contrário dos cúmplices com mandato, indultados no Natal pela mui compassiva companheira Dilma Rousseff. Deles só José Dirceu e Pedro Corrêa ainda moram na cadeia, acusados de terem delinqüido direto das dependências do presídio da Papuda.

A versão de Valério, no depoimento repetido quatro anos depois, coincide com outra, que não deveria ser desqualificada, de vez que foi narrada pela voz autorizadíssima do ex-líder dos governos petistas no Senado Delcídio do Amaral (sem partido-MS). Nos autos do processo criminal, Sua Ex-excelência contou que, no início do primeiro mandato, o governo Lula era “hermético” e dele só participavam aliados tradicionais. Disso Dirceu discordava, pois já tinha combinado com o presidente do PMDB, Michel Temer, a continuação da “governabilidade” gozada pelo antecessor tucano, Fernando Henrique. Ante a perspectiva do impeachment, contudo, o chefão constatou: “Ou abraço o PMDB ou eu vou morrer”. Eis aí a lápide que faltava no quebra-cabeças.

Esta explica por que a bem pensante intelligentsia brasileira cantou em coro com os advogados dos empreiteiros nababos condenados por corrupção e a tigrada petralha o refrão “Valério bandido jamais será ouvido”, que manteve Lula fora do mensalão. E esclarece futricas da República de Florença em Brasília que põem o PMDB de Temer e Calheiros a salvo da luminosidade dos holofotes da História. Assim, enquanto acompanha Gil e Caetano entoando em uníssono “eu te odeio, Temer”, a esquerda vadia e erudita se acumplicia ao direito ao esquecimento que têm desfrutado o atual presidente e seus devotos do maquiavelismo no Cerrado seco.

Sabe por que esses celebrados “formadores de opinião” rejeitam a “nova ordem mundial” (apud Caetano Veloso, promovido sem méritos à companhia de Cecília, Drummond e Rosa, citados pela presidente do STF, Cármen Lúcia, em sua posse)? É que agora a corrupção não fica impune como dantes. E a maior evidência de que o velho truque de esconder castelos de areia sob tapetes palacianos escorre nos esgotos das prisões é o fato de os empreiteiros Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro optarem entre colaborar com a Justiça ou mofar na cadeia, por mais caros e bem relacionados que sejam seus causídicos. Só ficaram soltos os felizes mandatários que gozam de prerrogativa de foro. A patota desfruta o privilégio de não responder pelos próprios crimes e modificar as leis para moldá-las à sua feição.

É por isso que, enquanto faz juras públicas de amor à Lava Jato, o alto comando do Planalto planta suas “preocupações” com a excessiva vaidade ostensiva, capaz de cuidado, comprometer o “digno” trabalho da força-tarefa. Pois saibam todos que estas linhas lêem que a fraude Lula não engana mais a grande maioria, como já enganou um dia. E que, ao contrário de antes, ele vai desmoronar, mercê do combate mundial à formação de quadrilhas que usam a Justiça Eleitoral para lavar dinheiro sujo. De fato, Dallagnol e Pozzobon atiraram nos pés. Nos de Lula…

Por: victoriraja, 22/09/2016, www.veja.com.br


Gilmar Mendes enquadra o açougueiro da Constituição



Ao inventar a punição fatiada, Lewandowski conseguiu dividir o indivisível

Por Augusto Nunes, 29/09/2016,
 www.veja.com.br

Nesta quarta-feira, durante uma aula de Direito Constitucional, o ministro Ricardo Lewandowski resolveu confundir os estudantes da Faculdade do Largo de São Francisco dedilhando a lira do delírio: “O impeachment da presidenta Dilma Rousseff foi um tropeço da democracia”, viajou o professor aloprado.

Nesta quinta, como constata o comentário de 1 minuto para o site de VEJA, o líder da bancada de Dilma no STF levou um merecidíssimo troco do colega Gilmar Mendes: “Acho que o único tropeço que houve foi aquele do fatiamento da própria Constituição, no qual teve contribuição decisiva o então presidente do Supremo”, resumiu Gilmar. 

Em parceria com Renan Calheiros e outros prontuários com imunidade parlamentar, Lewandowski inventou a punição repartida em fatias, uma ousadia despudorada que produziu o milagre da divisão do indivisível. Não é pouca coisa. Também por isso, deveria ser contemplado com a presidência perpétua da Ordem dos Açougueiros da Constituição.