Por Juremir
Machado da Silva, 10/11/2017,
www.correiodopovo.com.br
Luciano Huck quer ser presidente
da República.
Por que
mesmo?
O que faz pensar que está habilitado para o cargo? Imagino duas
categorias de presidenciáveis: o indivíduo que tem competência específica –
como um cirurgião para operar – em gestão, direito, economia e política; e
aquele que encarna o símbolo de uma classe, luta ou capacidade de mobilização
de pessoas por sua entrega a uma causa. O que faz Luciano Huck e o técnico de
vôlei Bernardinho pensar que eles integram uma dessas duas categorias?
Bernardinho mostrou competência para treinar equipes de vôlei. Nada mais. Huck
saber fazer um tipo particular de programa de televisão assistencialista. É
tudo.
Bernardinho pensa em ser governador. Huck voa mais alto. O que eles
possuem? Visibilidade. Eis uma das distorções da democracia: o mais visível
passa a ser confundido com o mais preparado. Um campeão de xadrez deveria ser
presidente da República? Não é visto como o mais inteligente? O irônico Bernard
Shaw dizia que o xadrez é ótimo para preparar jogadores de xadrez. O presidente
deveria ser então um especialista como Henrique Meirelles? Para cada uma das
suas afirmações, sempre em tom definitivo, há alguma em contrário feita por
outro especialista. A presidência deve ser entregue a tecnocrata, a um líder
carismático ou a quem for capaz de unir todas essas facetas?
Não há resposta científica. Na democracia, a competência mais importante
é a de fazer votos. Quem votaria em Luciano Huck? O mercado. É incrível como o
tal mercado, tão apegado à meritocracia, vota em qualquer um que repita alguns
dos seus slogans brandidos como modernos. Nunca pensei em deixar o Brasil. Acho
esse tipo de desejo típico das simplificações de classe média. Mas se Huck for
eleito talvez seja o caso de pensar nisso. Claro, há pior. Jair Bolsonaro.
Eleger Bolsonaro tem a ver com uma visão simplista do tratamento da coisa
pública. É a política do coice. Se meter o pé na porta, vai. A escolha de Huck
é mais complicada. Ela só se explica pela confusão entre admiração por sucesso
e visibilidade com habilitação para tudo.
Que um apresentador de televisão ou um treinador de vôlei, sem qualquer
experiência política e administrativa e muito menos preparação teórica para
esse tipo de atuação, possam sonhar em ocupar as mais altas funções públicas do
país num passe de mágica eleitoral faz pensar em nossas limitações
intelectuais. Ou é muito fácil ser presidente ou tem algo errado na fórmula. De
repente, estamos todos dentro de um atroz reality show de autoajuda. Aí sopra
um vento otimista: a democracia pode nos salvar disso. Basta que os eleitores
façam uma escolha mais consistente e séria. Eles estão preparados para tanto? A
eleição de Donald Trump nos Estados Unidos prova que não.
Restam as hipóteses radicais: e se para o eleitor a eleição não for mais
do que um jogo no qual ele aposta sem crer profundamente no resultado? E se ele
souber que vai perder sempre? E se o eleitor for um cínico que brinca com seu
voto? Pode ser. O mercado fala sério.