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sexta-feira, 31 de julho de 2015

O escândalo é único



Por Augusto Nunes, 30/07/2015, www.veja.com.br

Texto de José Nêumanne publicado no Estadão

Que WikiLeaks, que Swissleaks, que cartéis mexicano e colombiano de drogas, que Fifagate, que nada! O escândalo top do mundo hoje é outro. Nada se lhe compara em grandeza aritmética, ousadia delituosa ou desrespeito a valores éticos. E é coisa nossa! Embora nada tenhamos a nos orgulhar de que o seja. Ao contrário!
Após se ter oposto ferozmente à escolha de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral para dar início à Nova República; à posse e ao governo de José Sarney, a Fernando Collor, que ajudou a derrubar; ao sucessor constitucional deste, Itamar Franco, de cuja ascensão participou; e a Fernando Henrique Cardoso, o Partido dos Trabalhadores (PT) chegou ao governo federal com seu maior líder, Luiz Inácio Lula da Silva, e se lambuzou no pote de mel do poder sem medo de ser feliz.
O primeiro objetivo caiu-lhe no colo como a maçã desabou sobre a cabeça de Newton. Era de uma obviedade acaciana. Sob crítica feroz da oposição, que o PT comandava, os tucanos privatizaram a Telebrás e, devidamente desossado, o filé apetitoso das operadoras de telefones foi devorado na nova administração. Sob as bênçãos e os olhos cúpidos do padim Lula, a telefonia digital foi entregue a consórcios nos quais se associaram algumas operadoras internacionais, com a experiência exigida no ramo, burgueses amigos e fundos de pensão, cujos cofres já vinham sendo arrombados pelos mandachuvas das centrais sindicais. Nunca antes na história deste país houve chance tão boa para mergulhar na banheira de moedas do Tio Patinhas.
Só que o negócio era bom demais para ser administrado em paz. Logo os concessionários se engalfinharam em disputas acionárias, que mobilizaram a Polícia Federal (PF), a Justiça nacional, os órgãos de garantia de combate a monopólios e até instrumentos de arbitragem internacional. No fragor da guerra das teles, os primeiros sinais de maracutaia dividiram as grandes rotas com os aviões de carreira. Sabia-se que naquele pirão tinha caroço. Mas quem ficou com a parte do leão?
Impossível saber, pois este contencioso está enterrado sob sete palmos de terra. Desde o Estado Novo, os sindicatos operários ou patronais administram sem controle externo caixas que têm engordado ao longo do tempo com a cobrança da Contribuição Sindical, que arrecada um dia de trabalho de todo trabalhador formal no Brasil, seja ou não sindicalizado. Sob a égide de Lula, as centrais sindicais foram incluídas na divisão desse bolo gordo e açucarado. E o sistema financeiro, acusado de ser a sanguessuga do suor do trabalhador, incorporou a esse cabedal os fundos de pensão. Sob controle de dirigentes sindicais, estes ocultam uma caixa-preta que ninguém tem poder nem coragem para abrir.
Só que o noticiário sobre tais episódios foi soterrado pela avalanche de denúncias provocada pelas revelações da Ação Penal (AP) 470, já julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e conhecida popularmente pela denominação que lhe foi dada pelo delator, Roberto Jefferson – o mensalão. Agora, após seu julgamento ter sido concluído e com os réus condenados, este é visto quase como lana-caprina desde a eclosão de outro mais espetacular: a roubalheira do propinoduto da Petrobras devassada pela Operação Lava Jato. Mas a cada dia fica mais claro que os dois casos se conectam e se explicam.
A importância de elucidar um crime ao investigar outro foi comprovada quando, na Operação Lava Jato, a PF encontrou nos papéis de Meire Poza, contadora do delator premiado Alberto Youssef, a prova de que o operador do mensalão, Marcos Valério, deu R$ 6 milhões ao empresário Ronan Maria Pinto, como tinha contado em depoimento referente à AP 470. Segundo Valério, essa quantia evitaria chantagem de Ronan, que ameaçava contar o que Lula e José Dirceu tinham que ver com o seqüestro e a morte de Celso Daniel, que era responsável pelo programa de governo na campanha de 2002.
Mas nem essa evidência da conexão Santo André-mensalão-petrolão convence o PSDB a dobrar a oposição do relator da CPI da Petrobras, Luiz Sérgio (PT-RJ), e levar Ronan a depor, como tem insistido a deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP). É que os tucanos articulam uma aliança com o atual dono do Diário do Grande ABC para enfrentar o petista Carlos Alberto Grana na eleição municipal de Santo André. E este corpo mole pode dificultar o esclarecimento da verdade toda.
A Lava Jato já produziu fatos antes inimagináveis, como acusações contra os maiores empreiteiros do País e até a prisão de vários deles. É o caso de Otávio Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez, que presidia o Conselho de Administração da Oi na guerra das teles. Isso revela mais um investigado em mais de um escândalo. Como Pedro Corrêa e José Dirceu, acusados de receber propina da Petrobras quando cumpriam pena pelo mensalão.
A Consuelo Dieguez, em reportagem da revista Piauí, publicada em setembro de 2012, Haroldo Lima, que tinha sido demitido por Dilma da presidência da Agência Nacional de Petróleo, disse que, no Conselho de Administração da Petrobras, ele, a presidente e o ex-presidente da estatal José Sérgio Gabrielli só votavam como o chefe mandava. E agora Lula é investigado por eventual lobby para a Odebrecht no exterior em obras financiadas pelo BNDES, a ser devassado em breve numa CPI na Câmara.
E a Lava Jato chegou à eletricidade. Walter Cardeal, diretor da Eletrobrás que acompanha Dilma desde o Rio Grande do Sul, foi citado na delação de Ricardo Pessoa, tido como chefe do cartel do petrolão, acusado de ter negociado doação de R$ 6,5 milhões à campanha da reeleição dela. Othon Silva, presidente licenciado da Eletronuclear, foi preso ontem, sob suspeita de ter recebido propina.
Teles, fundos de pensão, Santo André, mensalão, BNDES, eletrolão e petrolão não são casos isolados. Eles compõem um escândalo só, investigado em Portugal, Suíça e EUA: é este Brasil de Lula e Dilma.

quinta-feira, 30 de julho de 2015

A Lava Jato eleva as esperanças, nosso produto interno básico para vislumbrar um país limpo dessa súcia



Por Augusto Nunes, 30/07/2015, www.veja.com.br

Valentina de Botas
Se a Lava Jato fosse uma pessoa e Dilma tivesse o poder bolivariano com que sonha, a presidente reeditaria os tempos de dossiês fraudulentos para enlamear nossa operação mãos limpas. Na italiana, mais de 1.200 pessoas foram condenadas entre políticos, agentes públicos e empresários. O diretor financeiro da petrolífera estatal ENI, que drenava recursos para o PSI, se suicidou quando denunciado a exemplo de Raul Gardini, o presidente do segundo conglomerado privado do país, tipo as empreiteiras daqui. Pulverizaram-se a carreira e a biografia emblemática de dois ex-primeiros ministros, Bettino Craxi e Giulio Andreotti (o líder do Democracia Cristã, por envolvimento com o crime organizado).
A magnitude de tudo fez alguns analistas afirmarem que a operação encerrou a chamada Primeira República Italiana. Faxineira de araque nas horas vagas da presidente farsante, Dilma sequer cogitou higienizar a administração que o criador lhe transferia nominalmente porque a podridão é constitutiva, inerente, intrínseca do jeito PT de governar uma vez que o objetivo é manter-se no poder, não administrar o país. Ou, por outra, administrá-lo pelas veredas da imundície para conservar o grande sertão: o poder.
Somente necrosando tudo em volta, proliferando a carne da moral morta pelos poderes republicanos e suas instituições, coagindo a sociedade a ver-se refletida na súcia – no bordão vigarista do é-tudo-igual que só não seria entoado por quem não gosta que pobre estude em faculdade de quinta categoria ou por quem não aceita que uma mulher parva seja presidente – naturalizar espantos e tomar por normalidade a canalhice institucionalizada, somente assim os farsantes garantiriam a perenidade a que se julgam predestinados. É na paisagem de um lixão político que lulopetistas, camuflados; como alguns bichos na natureza se garantem.
Sim, a Lava Jato derrubou o PIB e prejudicou a economia: somente na república da súcia com suas campanhas do diabo e que se arrumou na vida, pois azelite-empreiteira que financiava tudo com o nosso dinheiro está ocupada na cadeia. No país esbulhado também moralmente, o PIB retraído e a economia desidratada resultam do projeto frutificado na alma presa à sarjeta de um jeca que, descendo sempre mais, sobe num palanque para defender os pobres enquanto os espolia.
Resulta da continuidade do sucateamento do país garantida numa mulherzinha espertalhona com a arrogância dos parvos alheios à própria parvoíce, insensível à luta desigual dos mais vulneráveis, à asfixia das classes médias, à angústia dos trabalhadores, ao desinteresse dos investidores pela grande pátria desimportante. Na Itália, alguns entendem, o trauma da população com a classe política foi tal que Silvio Berlusconi se elegeu.
Por aqui, há quem diga que o mesmo clima de desilusão pode ensejar fenômeno parecido. Não sei. Mas nada deve impedir o cumprimento da lei e a justiça não existe para ensinar ninguém a votar ou para elevar o PIB, mas para lavar da paisagem os canalhas que o derrubaram. A Lava Jato eleva as esperanças, nosso produto interno básico para vislumbrar um país limpo dessa súcia, única chance de o outro PIB crescer.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Ao tratar de pedaladas, Adams fala bobagem sobre o impeachment. Ou: Advogado-geral é agora chefe da oposição? Acho que não!



Por Reinaldo Azevedo, 23/07/2015, www.veja.com.br

Em 113 páginas de explicações, com mais 900 de documentos anexos, o governo federal entregou nesta quarta ao Tribunal de Contas da União (TCU) a sua defesa, argumentando que não houve quaisquer irregularidades nas chamadas “pedaladas fiscais” dadas em 2014. Em síntese: o Tesouro deixou de repassar recursos a bancos públicos, que respondiam por programas do governo. Esses entes tiveram de arcar com os respectivos custos com os próprios recursos, o que caracteriza uma espécie de empréstimo indireto. A prática é vetada pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
A síntese da defesa chega a ser tosca, mas é o que se tem para o momento. O governo disse ter feito o que outros fizeram antes, tanto na esfera federal como na estadual.
Luís Inácio Adams, advogado-geral da União, entregou pessoalmente a defesa a Aroldo Cedraz, presidente do tribunal, e a Augusto Nardes, relator, depois de um encontro com a presidente Dilma. Em entrevista, insistiu na linha de defesa do governo e aproveitou para fazer considerações absolutamente fora do lugar sobre o impeachment, informa a Folha:
“Aprovando ou rejeitando [as contas], não tem base a idéia de um impeachment. Você não cassa um mandado baseado nas contas do governo. A questão que está sendo avaliada aqui não é a conduta individual de cada agente e, particularmente, da presidente. São as contas governamentais. Não cabe responsabilizar Dilma”.
Bem, essa é apenas e tão-somente a opinião do advogado-geral da União. Nem se esperava que dissesse o contrário, não é? Ou, em vez de ser o chefe da AGU, ele seria chefe da oposição. O doutor sabe que está falando por falar.
Se o TCU recomendar a rejeição das contas, o Congresso terá de votar o relatório depois. Se acatar a rejeição, é claro que está aberto o caminho para que se apresente à Câmara uma denúncia por crime de responsabilidade com base nos artigos 10 e 11 da Lei 1.079. Adams os conhece bem, mas lembro:
“Art. 10. São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária:
1- Não apresentar ao Congresso Nacional a proposta do orçamento da República dentro dos primeiros dois meses de cada sessão legislativa;
2 – Exceder ou transportar, sem autorização legal, as verbas do orçamento;
(…)
Art. 11. São crimes contra a guarda e legal emprego dos dinheiros públicos:
1 – ordenar despesas não autorizadas por lei ou sem observância das prescrições legais relativas às mesmas; (…)
Cabe ainda destacar que o juízo de admissibilidade de uma denúncia por crime de responsabilidade, que pode levar ao impeachment, é exclusivo da Câmara num primeiro momento. Se chegar ao plenário, a decisão sobre a aceitação da denúncia é dos deputados. Se 342 entenderem que Dilma, em razão das pedaladas, infringiu a Lei 1.079, ela tem de ser afastada. E o Senado decidirá o seu destino.
Inexiste como parece sugerir Adams, uma instância que possa impedir os deputados de tomar essa decisão. A rigor, a denúncia poderia ser apresentada hoje — aliás, há outras lá  — pela oposição, por exemplo. Mas é claro que, se estiver ancorada na rejeição das contas, o pedido chega com mais força. Também Rodrigo Janot poderia fazê-lo. Mas, desse mato, não sai coelho.
O advogado-geral argumenta que a presidente não poderia responder pessoalmente pelas contas, como se estivéssemos diante de um caso de responsabilização objetiva. Opa! Calma lá! Em primeiro lugar, é responsável, sim. Em segundo lugar, as pedaladas foram dadas para tentar maquiar, de olho nas urnas, a situação fiscal miserável em que estava o governo. Em terceiro lugar, não seria difícil encontrar vídeos de debates eleitorais em que a oposição acusa a deterioração das contas públicas, o que Dilma negava de pés juntos.
A rigor, meus caros, as pedaladas fiscais também constituíram um crime eleitoral. Ou a maquiagem não servia também para manter programas dos quais Dilma se jactava e que, a sustentava, estaria ameaçados se o adversário vencesse?
É papel de Luís Inácio Adams defender o governo. Se prosperar uma denúncia contra a presidente na Câmara, ele será chamado a fazer a defesa. Parece que está tentando criar uma instância prévia para debater o que a oposição pode ou não pode denunciar. Aí, não há escapatória, ele está indo além das suas sandálias. Isso não é de sua alçada. Por enquanto, Adams chefia apenas a AGU, não a oposição.

terça-feira, 28 de julho de 2015

Brasil tem quase 6 mil processos relativos a crimes financeiros



Justiça tem 27 varas específicas para esses casos
Por Cássio Bruno, 27/07/2015,
 www.oglobo.com.br

 RIO — O avanço da Operação Lava-Jato é recorrentemente atribuído ao juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos que levam corruptos e corruptores envolvidos num esquema que drenou bilhões de reais da Petrobras para o banco dos réus. O magistrado se destaca pelas decisões técnicas e bem fundamentadas que têm resistido à estratégia dos advogados de defesa recrutados nas bancas mais bem pagas do país, mas é apenas a ponta mais visível da evolução da especialização da Justiça brasileira no julgamento de crimes financeiros. Desde 2003, varas federais como a de Moro na Justiça Federal do Paraná são criadas em todo o país dedicadas a crimes como os de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, muitas vezes acompanhados de corrupção e desvio de dinheiro público. Levantamento feito pelo GLOBO mostra que, atualmente, tramitam no país 5.861 processos relativos a crimes financeiros somente na primeira instância, parte em varas federais especializadas.
Hoje no Brasil já são 27 varas federais especializadas em crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de lavagem ou ocultação de bens. Elas estão em 14 estados e no Distrito Federal. Em outros 12, os casos denunciados pelo Ministério Público ainda são distribuídos entre varas criminais comuns. São Paulo é o estado que concentra a maior parte dos processos desse tipo em andamento: 2.968. Em seguida, vêm Mato Grosso do Sul, com 613, e Paraná, onde o juiz Sérgio Moro toma as decisões da Lava-Jato: 331 ações. O Ceará tem 314 e o Rio possui 302 processos tramitando. O DF tem 91 processos.
O desembargador Abel Gomes, do Tribunal Regional Federal do Rio, foi um dos primeiros magistrados a se especializar na área. Ele conta que a idéia das varas especializadas veio de uma pesquisa do Conselho da Justiça Federal, em 2000, com juízes, procuradores e delegados que apontou como maior dificuldade para as investigações a quebra do sigilo bancário de suspeitos, um recurso que atualmente é um dos mais usados pelas investigações.
— As quebras de sigilo bancário eram muito difíceis, complexas. Em regra, vinham em papéis. Não havia sequer um cadastro de correntistas único. Era difícil fazer uma quebra de sigilo de imediato e chegar a uma pessoa por trás de contas investigadas — conta Gomes, que é autor junto com Sérgio Moro do livro “Lavagem de dinheiro: comentários à lei pelos juízes das varas especializadas”.
O divisor de águas no combate à lavagem de dinheiro ocorreu em 1998, quando foi sancionada a Lei 9.613, que criminalizou a atividade. No mesmo ano, surgiu o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do Ministério da Fazenda que identifica movimentações bancárias suspeitas. Muitas investigações, como a própria Lava-Jato, nasceram de notificações do Coaf. Outro marco foi à aprovação, em 2012, da Lei 12.683, que tornou mais rigorosa as penas de crimes de lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores.
O objetivo de quem comete o crime de lavagem financeira são ocultar a origem de recursos ilegais, principalmente frutos de corrupção, tráfico de drogas, contrabandos e outros delitos. Como se trata de um crime sofisticado, que tem como intenção encobrir outros, acaba replicando mecanismos parecidos em diferentes grupos criminosos. Quase sempre são utilizadas contas bancárias e transações no exterior envolvendo câmbio, como se vê no emaranhado de contas e cruzamentos societários rastreados pelos investigadores da Lava-Jato no Brasil e no exterior para fundamentar os pedidos de prisão e de condenação submetidos ao juiz Sérgio Moro. Para o desembargador Abel Gomes, a especialização de magistrados ajudou o país a avançar na investigação dos crimes de colarinho branco.
— Encaro a Lava-Jato como uma conseqüência lógica de um trabalho feito pela Justiça Federal em torno da especialização dessas varas — diz Gomes.
A preparação de juízes como Moro requer treinamentos constantes e a troca de informações entre magistrados no Brasil e no exterior. No Rio Grande do Sul, no Paraná e em Santa Catarina, oito juízes de varas especializadas em lavagem de dinheiro participam de cursos de formação e capacitação continuados de no mínimo 40 horas de aulas por ano. Em abril deste ano, o tema foi sobre Direito Penal e abordou transparência e combate a fraudes. Em maio, vários juízes foram a Washington, nos Estados Unidos, para conhecer o sistema legal de combate à corrupção e à fraude pública norte-americano. A colaboração com autoridades de outros países, como a da Suíça na Lava-Jato, é outro fator decisivo em processos desse tipo.
As varas especializadas acabaram forçando também a capacitação de servidores técnicos da Justiça, do MP e da Polícia Federal. As investigações passaram a contar cada vez mais com dados de outros órgãos estatais que atuam no combate à corrupção e tiveram suas estruturas e corpos técnicos aperfeiçoados nos últimos anos, como o Coaf, a Receita Federal, o Tribunal de Contas da União (TCU), a Corregedoria-Geral da União (CGU), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e outros.
Não há dados consolidados sobre o tempo médio dos processos e nem do crescimento das ações protocoladas em varas especializadas em crimes financeiros desde a criação da primeira, em 2003, no Rio Grande do Sul. Mas a abertura de novas ações a cada ano em alguns estados revela uma evolução rápida. Em Minas Gerais, os processos de crimes financeiros saltaram de 57 para 710 em apenas cinco anos, entre 2003 e 2008. Com a solução dos casos, esse número agora está em 181.
São Paulo lidera o número de processos nessa área. A 2ª Vara Criminal, uma das seis da Justiça Federal paulista dedicadas apenas aos crimes financeiros, é responsável hoje pelos processos que apuram suspeitas de fraudes no Banco Cruzeiro do Sul. As ações são fruto de uma operação desencadeada pela PF em outubro de 2012. Dezessete pessoas foram denunciadas. Auditorias identificaram as irregularidades nas operações e atividades das pessoas jurídicas pertencentes ao conglomerado financeiro. Segundos as investigações da PF, o rombo contábil teria sido de R$ 3,1 bilhões. Os réus são acusados de crimes contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro, manipulação de mercado de valores mobiliários e contra a paz pública.
Para o desembargador Fausto de Santis, da Justiça Federal paulista, as varas especializadas em lavagem de dinheiro foram a “grande virada do Judiciário”, mas houve muita resistência:
— Até a criação das varas especializadas, estava tudo difuso. Os casos estavam em varas cumulativas e não tinham o tratamento devido ao choque entre a burocracia e a complexidade dos casos.
Professor de Direito Penal da Fundação Getulio Vargas (FGV), Thiago Bottino discorda:
— A especialização funcionou de forma diferente em cada estado. A Lava-Jato está relacionada com essa mudança legislativa, a partir de 2013, com o surgimento da colaboração premiada, que diminui a pena do acusado em troca da delação.