Por Augusto Nunes, 22/11/2014,
www.veja.com.br.
Texto de J.R. Guzzo:
Os leitores de VEJA têm o direito de perguntar a si mesmo o que, afinal
de contas, estão fazendo de tão errado assim. Ouvem dizer o tempo todo, do
governo e do seu sistema de suporte, as coisas mais horríveis a respeito da
revista que gostam de ler ─ tanto gostam que continuem a lê-la, semana após
semana, sem a menor obrigação de fazer isso. Haveria aí alguma tara secreta, ou
outro tipo qualquer de desvio de conduta? A pregação espalhada diariamente
pelos mecanismos de propaganda a serviço do governo parece sugerir que existe,
sim, uma doença muito séria com esses cidadãos: como poderiam, caso fossem
pessoas sadias, buscar informação e outros itens de interesse num veículo que
faz parte das leituras proibidas pelo Santo Ofício do PT?
Ainda na véspera da última eleição, a presidente da República, em
pessoa, prometeu que iria processar a revista “na Justiça”, aparentemente com
uma ação penal, por crimes não especificados e, segundo ela, gravíssimos.
Até agora não entrou com ação nenhuma, é verdade, mas e daí? O que
importa é afirmar que o leitor está sendo cúmplice de uma publicação
“criminosa” ─ e como tal, segundo a filosofia do ex-presidente Lula, torna-se
nazista, inimigo do Menino Jesus e participante de um golpe de Estado para
derrubar Dilma Rousseff e o governo popular do PT.
Uma página de revista, como pode atestar alguém que já passou um certo
tempo nesta vida, não é mais que isso ─ uma página de revista, apenas,
obra que reflete os limites de quem a escreve e que não está programada para
funcionar como uma distribuidora automática de verdades. Mas, no caso, esta
coluna pode garantir, com margem de erro de 0%, que não existe rigorosamente
nada de errado com os leitores, nem com sua decisão de escolher a leitura que
bem entendem. O erro está do lado de quem os acusa, pelo mero fato de lerem
VEJA, de serem nazistas, fascistas, caluniadores, mentirosos, golpistas,
homófobos, racistas, antinordestinos, defensores do trabalho escravo, inimigos
dos pobres e autores de sabe-se lá quantos crimes ainda. Cada uma dessas
acusações, obviamente, é demência pura ─ mas, se VEJA é tudo isso aí
acima, como o governo e sua tropa não param de dizer, seus leitores também o
seriam, não é mesmo? Como todos eles sabem perfeitamente bem que não o
são, o melhor que têm a fazer é ignorar a gritaria e tocar a vida para a
frente. Para que se estressar com pecados que não cometemos?
Na verdade, os leitores têm um excelente motivo para se sentir
satisfeitos: são eles, e ninguém mais, que mantêm viva esta revista. Eis aí a
chave de tudo. Enquanto acharem que VEJA tem méritos suficientes para continuar
a ser lida, os leitores formam uma linha de defesa que governo nenhum consegue
derrubar – e estarão ganhando o confronto com as forças que querem decidir o
que eles podem e o que não podem ler. Ao contrário do que gostaria a máquina de
propaganda oficial, diretamente ou por meio da vasta e caríssima rede de
auxiliares que montou na internet para agredir a imprensa livre, VEJA e os
jornalistas que aqui trabalham não precisam do governo, seus 39 ministérios,
suas verbas de publicidade, seus empregos, seus contratos de “prestação de
serviços” e por aí afora. Precisam isso sim, do público ─ e aí as coisas
se complicam para quem está mandando no Brasil, pois simplesmente não há
discurso de autoridade, ameaçam de processo, “rede social” nem nenhuma outra
invenção capaz de fazer com que os leitores da revista sumam no espaço.
É a grande frustração do mundo petista. O que não se perdoa a VEJA, mais
que qualquer coisa, é o sucesso ─ pela última medição dos auditores do
IVC, em julho de 2014, sua tiragem semanal está em 1 100 000 exemplares. Há
doze anos o governo e seus estrategistas de “mídia” tentam resolver esse
problema. Continuam no mesmo lugar.
Os governos do PT conseguiram, com muitos milhões, montar durante esse
tempo uma vasta rede de “imprensa a favor”. Mas é justamente aí que mora o
problema: imprensa a favor não vale nada. Quem a respeita? Balzac dizia que era
mais fácil escrever um romance do que arrumar o dinheiro para pagar o papel e a
impressão. No caso, poderia dizer que é mais fácil escrever publicações
inteiras de louvação ao governo do que encontrar leitores que as levem a sério.
O que interessa para quem manda, na verdade, não é publicar aquilo que
quer; é impedir que seja publicado aquilo que não quer. Isso não se
resolve fazendo insultos a VEJA em notas oficiais, blogs ou comícios. Só se
resolve com o silêncio do “controle social”.
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