Criminosos notórios e confessos, que deveriam estar atrás das grades,
contratam bancas de advogados caríssimas, recebem privilégios e contam com a
lentidão da Justiça para permanecerem soltos
Por
Tábata Viapiana, 06/10/2017,
www.istoé.com.br
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rimes cometidos e curtem os
A Operação Lava Jato é um ponto fora da curva. Pela primeira vez na
história do País, autoridades e empresários poderosos foram parar atrás das
grades por crimes de corrupção ativa e passiva. Empreiteiros, políticos,
diretores da Petrobras não conseguiram fugir da caneta pesada do juiz Sergio
Moro. Mas, a bem da verdade, nem mesmo a Lava Jato conseguiu acabar de vez com
uma marca registrada do País: a impunidade.
Com quatro instâncias de julgamento, pletora de recursos, lentidão do
Judiciário, tudo colabora para que se escape das penas da lei. Não faltam
exemplos de gente condenada, mas que está livre, leve e solta.
CANETA
PESADA
Moro já condenou a maioria deles, mas
réus importantes conseguem a liberdade nos tribunais.
O ex-ministro José Dirceu, que já deveria ter voltado para a cadeia,
goza de plena liberdade em Brasília e nos fins de semana vai à festas e shows
até mesmo com a camisa do Corinthians. Dirceu já foi condenado em segunda
instância, o que obriga a execução da pena, conforme entendimento recente do
Supremo Tribunal Federal. Mas a possibilidade de embargos de declaração retarda
sua volta para a prisão. Não há prazo para o caso retornar às mãos do juiz
Sérgio Moro para que ele expeça novo mandado de prisão contra Dirceu. Vale
lembrar que o ex-ministro é reincidente: condenado no Mensalão em 2012, voltou
a ser punido na Lava Jato. Não bastasse isso, diz o Ministério Público, Dirceu
recebeu propinas mesmo depois do julgamento do Mensalão. Não se emenda.
BENEFÍCIOS
A advogada Adriana Ancelmo, esposa do ex-governador do Rio de Janeiro,
Sérgio Cabral, e condenada a 18 anos de prisão, usufrui do regime de prisão
domiciliar, que ela cumpre em seu luxuoso apartamento no Leblon. Ela conseguiu
o benefício para cuidar dos filhos, de 11 e 14 anos. A lei permite a prisão
domiciliar a mulheres grávidas e/ou que tenham filhos de até 12 anos. Na
prática, a realidade é outra. O caso de Adriana
é uma exceção, um privilégio, graças
à condição financeira e ao status da
ex-primeira-dama do Rio. Segundo dados do Infopen, o Levantamento Nacional de
Informações Penitenciárias, das 37 mil
mulheres presas no País, pelo menos 80%
são mães. Por que apenas Adriana
Ancelmo conseguiu o direito de ir
para casa cuidar dos filhos? É mais um caso da diferença na aplicação da lei entre os ricos e os pobres. Coisa que bons advogados resolvem nos tribunais.
O empresário Eike Batista, que já foi o homem mais rico do país, acusado
de envolvimento no esquema de corrupção de Sérgio Cabral, passou menos de
quatro meses na cadeia. Foram no mínimo US$ 16,5 milhões em propinas pagas por
Eike a Cabral. Hoje, em prisão domiciliar, o empresário mora numa mansão na
capital fluminense. Na imensa sala, Eike ostenta carrões que valem milhões.
Situação mais peculiar vive a jornalista Cláudia Cruz, mulher do ex-deputado
Eduardo Cunha, preso em Curitiba. Cláudia foi beneficiada pela corrupção
praticada pelo marido, mas foi inocentada por falta de provas, apesar de
ostentar na internet fotos fazendo compras milionárias no exterior. Leva vida
boa em sua mansão no Rio.
PRISÃO
Eike Batista está em “prisão
domiciliar”. Basta observar a sala de confinamento acima para ver como é chata
a vida do corrupto.
SÓ
UM PRESO
E o que dizer dos executivos da Odebrecht que confessaram crimes escabrosos?
Foram firmados 78 acordos de delação premiada com o Ministério Público, mas em
apenas um deles há cumprimento de pena em regime fechado. Os executivos
confessaram pagamentos de propina em onze países, além do Brasil, mas apenas o
ex-presidente Marcelo Odebrecht está preso (e deixará a cadeia daqui a dois
meses para o regime semi-aberto). Alguns diretores da Odebrecht sequer foram
processados.
Na JBS, a situação não é muito diferente. A empresa ganhou os holofotes
da mídia em razão das trapalhadas do ex-procurador-geral da República, Rodrigo
Janot, que concedeu benefícios excessivos nas colaborações de sete executivos.
Depois, Janot pediu a rescisão do acordo ao descobrir que os delatores omitiram
crimes e informações. Do grande grupo empresarial, maior produtor de carne do
mundo, apenas três pessoas estão presas: os sócios e irmãos Joesley e Wesley
Batista, além do ex-diretor Ricardo Saud. Não fossem áudios gravados por engano
entre Joesley e Saud, dificilmente eles teriam sido presos, e muito possivelmente,
estariam aproveitando da impunidade brasileira em apartamentos de luxo no
coração de Manhattan, em Nova York.
Mesmo desfrutando de prisão domiciliar, graças a um acordo de delação, o
casal de marqueteiros do PT, João Santana e Mônica Moura decidiu por uma
regalia ainda maior. Alegando dificuldades financeiras, pediram ao juiz Sergio
Moro que liberasse R$ 10 milhões bloqueados em decorrência dos crimes
praticados. Moro, como não podia ser diferente, negou o pedido e os recursos
permanecem retidos. Afinal de contas, até a impunidade tem seus limites.
Como
escapar da prisão apenas com um bom advogado:
Quatro
instâncias judiciais;
Depois de uma condenação em primeiro grau, o réu pode acionar outras
três instâncias superiores (o Tribunal de Justiça, o STJ e o STF).
Excesso
de recursos;
Há uma enorme variedade de recursos da qual as defesas podem lançar mão
para adiar a execução da pena, o que pode levar anos. Em muitos casos, as penas
prescrevem.
Lentidão
da Justiça;
A grande quantidade de ações em tramitação no Poder Judiciário atrasa
julgamentos que podem levar os condenados à prisão.
Delação
premiada;
Os acordos de colaboração costumam prever o cumprimento das penas em
regimes diferenciados, sobretudo em prisão domiciliar, normalmente mansões que
mais parecem clube social.