Direto
ao Ponto por Augusto Nunes, 27/01/2014, www.veja.com.br.
Alguma alma caridosa precisa contar
ao neurônio solitário que toda obra física de grande porte é complexa. Se
construir estádios fosse simples, como disse Dilma Rousseff no encontro na Suíça
com Joseph Blatter, as arenas prometidas há seis anos estariam prontas. E a
presidente da República não precisaria submeter-se às humilhantes cobranças do
presidente da Fifa.
Enquanto se explica com os gringos
que exploram o futebol mundial, a supergerente de araque finge que não tem de
explicar-se com os nativos lesados pelos farsantes que forjaram o conto da
Copa. O que dirá aos pagadores de impostos forçados a bancar a farra
multibilionária — anabolizada pela irresponsabilidade do BNDES — promovida pelo
Planalto em parceria com governadores, prefeitos, cartolas e empresários de
estimação?
A reconstituição do golpe atesta que
os trapaceiros nem esperaram pela oficialização da escolha do anfitrião do
Mundial. A abertura de mais uma versão da ópera dos malandros ocorreu em 15 de
junho de 2007: numa celebração no Planalto, Lula aprovou com sorrisos cúmplices
e movimentos verticais da cabeça o palavrório de Ricardo Teixeira, ainda no
comando da CBF: “A Copa do Mundo é um evento privado. O papel do governo não é
de investir, mas de ser facilitador e indutor”.
Quatro meses mais tarde, o embusteiro
reincidiu no Rio: “Faço questão absoluta de garantir que a Copa de 2014 será
uma Copa em que o poder público nada gastará em atividades desportivas”. Em 4
de dezembro de 2007, depois de avisar que falava em nome de Lula, o ministro do
Esporte, Orlando Silva, avalizou as promessas do parceiro hoje homiziado em
Miami, a um oceano de distância do camburão.
“Os estádios para a Copa do Mundo
serão construídos com dinheiro privado”, disse o ministro que também se
transformaria em caso de polícia. “Não haverá um centavo de dinheiro público
para os estádios”. Conversa de 171, sabe-se hoje. Oficialmente, o governo
federal confessa ter enterrado R$ 4 bilhões nas arenas superfaturadas. O
desperdício real foi bem maior e muito mais obsceno, provará a abertura da
caixa preta da Copa da Roubalheira.
As maracutaias não contabilizadas
continuam à espera da ofensiva dos políticos ditos oposicionistas, das reações
vigorosas dos brasileiros que não capitulam nem se juntam à manada, das ações
do Ministério Público e da mão pesada da Justiça. Entre tantas bandalheiras, é
preciso investigar com urgência, por exemplo, a origem e o destino do dinheiro
que saiu pelo ralo da reforma do Maracanã ou da construção do Itaquerão.
As duas obras deveriam custariam
cerca de R$ 500 milhões cada uma. A primeira passou com folga de R$ 1 bilhão. A
segunda está chegando lá, o que fará do novo estádio do Corinthians o fruto
mais lucrativo da dobradinha formada pela Odebrecht e por Lula. Pai do colosso,
o ex-presidente que virou camelô de empreiteira envolveu nos trabalhos de parto
a mãe do PAC, o BNDES, o governo estadual e a prefeitura de São Paulo, fora o
resto. Quem ganhou quanto?
A cinco meses do jogo de abertura, o
colapso do projeto em execução no estádio do Atlético Paranaense informa que os
espertalhões perdulários ignoram limites. Irritado com o que viu por lá na
última inspeção, o secretário-geral Jerôme Walcke avisou que a arena de
Curitiba seria excluída do mapa da Copa se o ritmo das obras não passasse a
obedecer ao padrão Fifa. Imediatamente, o orçamento subiu de R$ 265 milhões
para R$ 319 milhões. O salto de 20% será coberto pelos cofres públicos, que já
financiaram 85% do que se gastou.
A festança dos vigaristas vai acabar
acordando as multidões que, em junho passado, impuseram aos farristas algumas
semanas de insônia e medo. Milhões de brasileiros têm sido tratados como se
fossem todos patriotas de galinheiro ou otários profissionais. A Copa que seria
o grande tiro eleitoreiro de Lula pode acertar o pé de Dilma Rousseff.
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