Por Augusto
Nunes, 06/09/2015, www.veja.com.br
Texto
de Roberto Pompeu de Toledo
Ao deixar a presidência do
conselho de administração da Petrobras, em março de 2010,
ao mesmo tempo em que deixava a chefia da Casa Civil do governo Lula para
candidatar-se à Presidência da República, Dilma Rousseff declarou-se “muito
feliz” pelo desempenho da empresa nos sete anos em que ocupou o cargo. “É um
orgulho passar pelo conselho da Petrobras e ainda mais presidi-lo. Você tem uma
nova visão de Brasil, vê a riqueza do Brasil”, disse ela, segundo
registrou o jornal O Globo (19/3/2010). Hoje a própria Dilma deve saber
quanto viu tudo errado. Sua “nova visão de Brasil” falhou em não
alcançar o caso dos navios-sonda Petrobras 10 000 e Vitória 10 000. Sua visão
da riqueza do Brasil falhou em identificar a direção dos bolsos a que tanta
pujança escoava.
O caso dos navios-sonda está detalhado
na denúncia do procurador Rodrigo Janot contra o deputado Eduardo Cunha.
Somados, os dois navios custaram 1,2 bilhão de dólares ─ quantia
equivalente à da compra da Refinaria de Pasadena ─ e resultaram
igualmente inúteis. É uma injustiça que, até agora, o Petrobras 10 000 e o
Vitória 10 000 tenham merecido menos atenção do que a refinaria. Da operação
resultaram 40 milhões de dólares em propinas, distribuídas, segundo a
denúncia, entre o diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, o
“lobista” Fernando Soares, vulgo Fernando Baiano, e o PMDB, representado por
Eduardo Cunha.
Detalhes saborosos embasam a denúncia.
Os dois navios foram contratados separadamente. A história do primeiro deles, o
Petrobras 10 000, começa no primeiro semestre de 2005, e não começa
dentro da estatal, com o anúncio da decisão de fazer o negócio e os
preparativos para a respectiva concorrência, como seria de esperar.
Começa quando a empresa japonesa Mitsui toma
conhecimento de rumores de que a Petrobras
precisava de um navio para prospectar na costa da África. A Mitsui
contata seu representante no Brasil, Júlio Camargo, que por sua vez recorre a
Fernando Baiano, conhecido por sua “íntima amizade” (assim diz a denúncia) com
o diretor Cerveró, para saber se os rumores procedem.
Feliz casualidade! A Petrobras estava,
sim, justamente pensando em comprar um navio, para operar na África. Seguem-se
meses de entendimentos entre Camargo, Cerveró e Baiano, com o objetivo de driblar
a licitação e entregar a construção do navio à coreana Samsung, parceira da
Mitsui. Sucesso! Não se enfrentou nem o incômodo de submeter os
trâmites com antecedência à diretoria. Nem a diretoria se incomodou em receber
tudo já mastigado. Em julho de 2006 foi assinado o contrato, no
valor de 586 milhões de dólares. Ninguém teve interesse em
saber se haveria melhor preço no mercado.
Se foi tudo tão fácil, por que não
tentar um repeteco? Já em setembro daquele mesmo ano a diretoria internacional da
Petrobras se dá conta de que precisa de um segundo
navio-sonda, agora para atuar no Golfo do México. Dessa vez o percurso é
inverso. Fernando Soares é que, em nome de Cerveró, procura Júlio
Camargo. A intenção era, percorrendo o mesmo processo expresso, sem
concorrência nem questionamentos da diretoria, entregar o contrato à mesma
Samsung. Sucedem-se as reuniões, na sala de Cerveró, com a
presença de Baiano e Camargo. Ao ser apresentado o contrato à
diretoria, alegou-se que encaminhá-lo à mesma construtora geraria
“economia de escala e vantagens operacionais”. Curioso é que, com
tamanhas vantagens, o preço ficava maior ─ 616 milhões de dólares.
Ninguém estranhou. O contrato para o navio batizado de Vitória 10 000
foi assinado em março de 2007.
Nenhum dos navios cumpriu sua suposta missão. O
primeiro encontrou só solos secos em Angola e foi recolhido ao Brasil. O
segundo não teve melhor sorte no Golfo do México. O grande sucesso foi a
prospecção de ambos nos cofres da Petrobras. O caso é exemplar da
casa da mãe Joana em que a Petrobras se converteu sob Lula presidente da
República, Dilma sucessivamente ministra de Minas e Energia e da Casa
Civil (além de presidente do conselho de administração), e
José Sérgio Gabrielli presidente da empresa, nenhum dos quais viu nada. O
caso de Gabrielli é prodigioso. A denúncia do procurador, vasculhando
os registros da portaria da Petrobras, constata que Soares entrou e saiu sete
vezes do prédio, entre 11h09 e 18h41 em
14 de setembro de 2006, para citar apenas um dos
dias de frenéticas negociações. Trabalhando no mesmo andar, ele não
viu nada. Ou, se viu, não achou nada de mais no entra e sai.
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