Lula deu 'ok' a empréstimos do mensalão e
recebeu de esquema, diz Valério
Por Felipe Recondo, Alana Rizzo e Fausto Macedo,
11/12/2012, de O Estado de S. Paulo.
Novas acusações fazem parte de depoimento prestado por empresário
mineiro à Procuradoria-Geral da República em 24 de setembro, dias após ser
condenado pelo STF.
O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza disse no depoimento
prestado em setembro à Procuradoria-Geral da República que o esquema do
mensalão ajudou a bancar "despesas pessoais" de Luiz Inácio Lula da
Silva. Em meio a uma série de acusações, também afirmou que o ex-presidente deu
"ok", em reunião dentro do Palácio do Planalto, para os empréstimos bancários
que viriam a irrigar os pagamentos de deputados da base aliada.
Valério ainda afirmou que Lula atuou a fim de obter dinheiro da Portugal Telecom para o PT. Disse que seus advogados são pagos
pelo partido. Também deu detalhes de uma suposta ameaça de morte que teria
recebido de Paulo Okamotto, ex-integrante do governo que hoje dirige o
instituto do ex-presidente, além de ter relatado a montagem de uma suposta
"blindagem" de petistas contra denúncias de corrupção em Santo André
na gestão Celso Daniel. Por fim, acusou outros políticos de terem sido
beneficiados pelo chamado valerioduto, entre eles o senador Humberto Costa
(PT-PE).
A existência do depoimento com novas acusações do empresário mineiro foi
revelada pelo Estado em 1.º
de novembro. Após ser condenado pelo Supremo como o "operador" do
mensalão, Valério procurou voluntariamente a Procuradoria-Geral da República. Queria,
em troca do novo depoimento e de mais informações de que ainda afirma dispor,
obter proteção e redução de sua pena. A oitiva ocorreu no dia 24 de setembro em
Brasília - começou às 9h30 e terminou três horas e meia depois; 13 páginas
foram preenchidas com as declarações do empresário, cujos detalhes eram
mantidos em segredo até agora.
O Estado teve
acesso à íntegra do depoimento, assinado pelo advogado do empresário, o
criminalista Marcelo Leonardo, pela subprocuradora da República Cláudia Sampaio
e pela procuradora da República Raquel Branquinho.
Valério disse ter passado dinheiro para Lula arcar com "gastos
pessoais" bem no início de 2003, quando o petista já havia assumido a
Presidência. Os recursos foram depositados, segundo o empresário, na conta da
empresa de segurança Caso, de propriedade do ex-assessor da Presidência Freud
Godoy, uma espécie de "faz-tudo" de Lula.
O operador do mensalão afirmou ter havido dois repasses, mas só
especificou um deles, de aproximadamente R$ 100 mil. Ao investigar o mensalão,
a CPI dos Correios detectou, em 2005, um pagamento feito pela SMPB, agência de publicidade de Valério, à empresa de
Freud. O depósito foi feito, segundo dados do sigilo quebrado pela comissão, em
21 e janeiro de 2003, no valor de R$ 98.500.
Segundo o depoimento de Valério, o dinheiro tinha Lula como
destinatário. Não há detalhes sobre quais seriam os "gastos pessoais"
do ex-presidente.
Ainda segundo o depoimento de setembro, Lula deu o "ok" para
que as empresas de Valério pegassem empréstimos com os bancos BMG e Rural.
Segundo concluiu o Supremo, as operações foram fraudulentas e o dinheiro, usado
para comprar apoio político no Congresso no primeiro mandato do petista na
Presidência.
No relato feito ao Ministério Público, Valério afirmou que no início de
2003 se reuniu com o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, e o tesoureiro
do PT à época, Delúbio Soares, no segundo andar do Palácio do Planalto, numa
sala que ele descreveu como "ampla" que servia para
"reuniões" e, às vezes, "para refeições".
Ao longo dessa reunião, Dirceu teria afirmado que Delúbio, quando
negociava com Valério, falava em seu nome e em nome de Lula. E acertaram, ainda
segundo Valério, os empréstimos.
Nessa primeira etapa, Dirceu teria autorizado o empresário a pegar até
R$ 10 milhões emprestados. Terminada a reunião, contou Valério, os três subiram
por uma escada que levava ao gabinete de Lula. Lá, na presença do presidente,
passaram três minutos. O empresário contou que o acerto firmado minutos antes
foi relatado a Lula, que teria dito "ok".
Dias depois, Valério relatou ter procurado José Roberto Salgado,
dirigente do Banco Rural, para falar do assunto. Disse nessa conversa que
Dirceu, seguindo orientação de Lula, havia garantido que o empréstimo seria
honrado. A operação foi feita. Valério conta no depoimento que, esgotado o
limite de R$ 10 milhões, uma nova reunião foi marcada no Palácio do Planalto.
Dirceu o teria autorizado a pegar mais R$ 12 milhões emprestados.
Portugal
Telecom. Em outro episódio avaliado pelo STF, Lula foi novamente colocado
como protagonista por Valério. Segundo o empresário, o ex-presidente negociou
com Miguel Horta, então presidente da Portugal Telecom, o repasse de recursos
para o PT. Segundo Valério, Lula e o então ministro da Fazenda, Antonio
Palocci, reuniram-se com Miguel Horta no Planalto e combinaram que uma
fornecedora da Portugal Telecom em Macau, na China, transferiria R$ 7 milhões
para o PT. O dinheiro, conforme Valério entrou pelas contas de publicitários
que prestaram serviços para campanhas petistas.
As negociações com a Portugal Telecom estariam por trás da viagem feita
em 2005 a Portugal por Valério, seu ex-advogado Rogério Tolentino, e o
ex-secretário do PTB Emerson Palmieri.
Segundo o presidente do PTB, Roberto Jefferson, Dirceu havia incumbido
Valério de ir a Portugal para negociar a doação de recursos da Portugal Telecom
para o PT e o PTB. Essa missão e os depoimentos de Jefferson e Palmieri foram
usados para comprovar o envolvimento de José Dirceu no mensalão.
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