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quinta-feira, 13 de março de 2014

Quando o Judiciário pode intervir?

Intervenção do Judiciário no Legislativo deve ser exceção, e não regra, diz Barroso.
Por Tiago Décimo, Salvador, 25/05/2013, estadão.com.br.

'Cada um no seu quadrado'. Um dia após a indicação para ministro do Supremo, advogado condena, em palestra, o 'ativismo judicial', o excesso de emendas à Constituição e cita bordão usado por seus filhos para defender a harmonia entre os Três Poderes.
Indicado pela presidente Dilma Rousseff para a vaga de Carlos Ayres Britto no Supremo Tribunal Federal, o advogado Luís Roberto Barroso emitiu claros sinais ontem de que é contra a politização da Corte e crítico do "ativismo judicial". "Penso que a regra geral, em uma democracia, deve ser: decisão política deve tomar quem tem voto", afirmou em palestra no 13.º Congresso Brasileiro de Direito do Estado, em Salvador.
Em tempos de rusgas constantes entre os Poderes, Barroso, prestes a ser sabatinado pelo Senado, defendeu um "ponto de equilíbrio dinâmico" entre Legislativo e Judiciário. O título da palestra de Barroso - O Constitucionalismo Democrático no Brasil: crônica de um sucesso imprevisto - revela o lado espirituoso do futuro integrante da Corte Suprema.
"O Judiciário deve ser deferente para com as escolhas feitas pelo legislador e para com as decisões tomadas pela administração pública, a menos que - e aí, sim, se legitima a intervenção do Judiciário - essas decisões violem frontalmente a Constituição, algum direito fundamental ou alguma regra do jogo democrático. Aí, sim, por exceção e não por regra, o Judiciário pode e deve intervir."
O último embate entre Legislativo e Judiciário foi provocado por uma intervenção do ministro do STF Gilmar Mendes na tramitação de um projeto de lei, na Câmara, que veta o repasse de fundo partidário e tempo de TV para novos partidos.
"Eu qualificaria como ativismo decisões do Supremo Tribunal Federal em matérias como a fidelidade partidária", disse o futuro ministro. "O Judiciário tem um grande papel, de guardião da Constituição, dos direitos fundamentais e das regras do jogo democrático. Já é um papel complexo e difícil. O que tange para além dessas fronteiras, a política é que deve prevalecer", acrescentou.
Defensor da reforma política, Barroso expôs a rejeição à judicialização da política. "Não há democracia sem política de boa qualidade. Ninguém deve achar que o Judiciário vai ser o instrumento ideal de realização do governo das maiorias."
Apesar de expor tantos pontos de vista, ele fugiu de perguntas sobre a futura atuação no STF e sobre temas polêmicos que poderá julgar. "Neste momento, estou com uma crise de falta de opiniões."
Leveza. Na bem-humorada exposição, repleta de citações e declamações de poemas - que foram do espanhol Lupercio Leonardo de Argensola (1559-1613) ao sambista Nelson Sargento -, o advogado enalteceu os 25 anos da Constituição de 1988, que considerou responsável pela "travessia bem-sucedida entre o Estado autoritário e por vezes violento e o Estado Democrático de Direito". "Só quem vive às sombras não reconhece essa luz."
Arrancou risos da plateia ao comentar a abrangência e detalhamento da Carta. "A Constituição de 1988 só não traz a pessoa amada em três dias. Ela cuida de muitos temas. Cuida de tributos, de previdência, mas também cuida de idosos, de índios, de crianças e adolescentes, cuida até de onde vai ser a sede do Colégio Pedro II."
A mudança excessiva da Constituição com emendas, disse, "produz um arranjo constitucional que fomenta a judicialização". "Há uma grande quantidade de matérias que, na maioria dos países, são relegadas ao processo político ordinário. Trazer uma matéria para a Constituição é retirá-la da política e trazê-la para o Direito."
Segundo ele, não causa surpresa o fato de que "no Brasil a judicialização se estenda da importação de pneus à interrupção de gestação, de cotas raciais ao colarinho do chope". "A judicialização é um fenômeno positivo, desde que o Judiciário atue dentro de suas fronteiras. Cada um no seu quadrado, como cantariam meus filhos."
Subjetivo. Os julgamentos andam mais subjetivos, disse Barroso, "simplesmente porque a vida está mais complexa - e, para mim, mais bonita". Citou até o caso da biografia não autorizada do cantor Roberto Carlos. "É o tipo de situação em que submeter os fatos às regras não é suficiente, porque os dois lados têm razão. Nesse caso, o juiz tem de construir uma solução argumentativamente." Barroso disse que ainda não se sente ministro e que aguarda sua sabatina pelos senadores.

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