Intervenção do Judiciário no Legislativo deve ser
exceção, e não regra, diz Barroso.
Por Tiago Décimo, Salvador, 25/05/2013, estadão.com.br.
'Cada um no seu quadrado'. Um dia após a indicação para ministro do
Supremo, advogado condena, em palestra, o 'ativismo judicial', o excesso de
emendas à Constituição e cita bordão usado por seus filhos para defender a
harmonia entre os Três Poderes.
Indicado
pela presidente Dilma Rousseff para a vaga de Carlos Ayres Britto no Supremo
Tribunal Federal, o advogado Luís Roberto Barroso emitiu claros sinais ontem de
que é contra a politização da Corte e crítico do "ativismo judicial".
"Penso que a regra geral, em uma democracia, deve ser: decisão política
deve tomar quem tem voto", afirmou em palestra no 13.º Congresso
Brasileiro de Direito do Estado, em Salvador.
Em tempos
de rusgas constantes entre os Poderes, Barroso, prestes a ser sabatinado pelo
Senado, defendeu um "ponto de equilíbrio dinâmico" entre Legislativo
e Judiciário. O título da palestra de Barroso - O Constitucionalismo
Democrático no Brasil: crônica de um sucesso imprevisto - revela o lado
espirituoso do futuro integrante da Corte Suprema.
"O
Judiciário deve ser deferente para com as escolhas feitas pelo legislador e
para com as decisões tomadas pela administração pública, a menos que - e aí,
sim, se legitima a intervenção do Judiciário - essas decisões violem
frontalmente a Constituição, algum direito fundamental ou alguma regra do jogo
democrático. Aí, sim, por exceção e não por regra, o Judiciário pode e deve
intervir."
O último
embate entre Legislativo e Judiciário foi provocado por uma intervenção do
ministro do STF Gilmar Mendes na tramitação de um projeto de lei, na Câmara,
que veta o repasse de fundo partidário e tempo de TV para novos partidos.
"Eu
qualificaria como ativismo decisões do Supremo Tribunal Federal em matérias
como a fidelidade partidária", disse o futuro ministro. "O Judiciário
tem um grande papel, de guardião da Constituição, dos direitos fundamentais e
das regras do jogo democrático. Já é um papel complexo e difícil. O que tange
para além dessas fronteiras, a política é que deve prevalecer",
acrescentou.
Defensor
da reforma política, Barroso expôs a rejeição à judicialização da política.
"Não há democracia sem política de boa qualidade. Ninguém deve achar que o
Judiciário vai ser o instrumento ideal de realização do governo das
maiorias."
Apesar de
expor tantos pontos de vista, ele fugiu de perguntas sobre a futura atuação no
STF e sobre temas polêmicos que poderá julgar. "Neste momento, estou com
uma crise de falta de opiniões."
Leveza.
Na bem-humorada exposição, repleta de citações e declamações de poemas - que
foram do espanhol Lupercio Leonardo de Argensola (1559-1613) ao sambista Nelson
Sargento -, o advogado enalteceu os 25 anos da Constituição de 1988, que
considerou responsável pela "travessia bem-sucedida entre o Estado
autoritário e por vezes violento e o Estado Democrático de Direito".
"Só quem vive às sombras não reconhece essa luz."
Arrancou
risos da plateia ao comentar a abrangência e detalhamento da Carta. "A
Constituição de 1988 só não traz a pessoa amada em três dias. Ela cuida de
muitos temas. Cuida de tributos, de previdência, mas também cuida de idosos, de
índios, de crianças e adolescentes, cuida até de onde vai ser a sede do Colégio
Pedro II."
A mudança
excessiva da Constituição com emendas, disse, "produz um arranjo
constitucional que fomenta a judicialização". "Há uma grande
quantidade de matérias que, na maioria dos países, são relegadas ao processo
político ordinário. Trazer uma matéria para a Constituição é retirá-la da
política e trazê-la para o Direito."
Segundo
ele, não causa surpresa o fato de que "no Brasil a judicialização se
estenda da importação de pneus à interrupção de gestação, de cotas raciais ao
colarinho do chope". "A judicialização é um fenômeno positivo, desde
que o Judiciário atue dentro de suas fronteiras. Cada um no seu quadrado, como
cantariam meus filhos."
Subjetivo.
Os julgamentos andam mais subjetivos, disse Barroso, "simplesmente porque
a vida está mais complexa - e, para mim, mais bonita". Citou até o caso da
biografia não autorizada do cantor Roberto Carlos. "É o tipo de situação
em que submeter os fatos às regras não é suficiente, porque os dois lados têm
razão. Nesse caso, o juiz tem de construir uma solução
argumentativamente." Barroso disse que ainda não se sente ministro e que
aguarda sua sabatina pelos senadores.
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