A proliferação indiscriminada de
partidos políticos sem um mínimo de representatividade popular é mais um dos
graves defeitos da Constituição de 1988
Por Augusto
Nunes, 16/01/2017,
www.veja.com.br
Editorial do Estadão
Como escrito há dias em nota intitulada A importância dos partidos políticos, a existência de legendas
partidárias, pessoas jurídicas de direito privado “unidas em torno de um núcleo
de princípios e idéias”, responde à necessidade do “aprimoramento, a difusão e
a aplicação efetiva das idéias e propostas que circulam fecundamente numa
sociedade”. Essa é a teoria. Sobre a prática nos ensina a leitura do noticiário
político em geral e, no momento, o relativo à próxima eleição da nova Mesa
Diretora da Câmara dos Deputados. Os interessados nessa eleição, candidatos ou
não, aproveitam o recesso parlamentar para procurar colegas em seus rincões de
origem e com eles discutir fraternalmente, olho no olho, o assunto com o qual
quase todos eles estão prioritariamente preocupados: nomeações para cargos e
funções públicas.
Não faltam na pauta política temas relevantes como
o reajuste fiscal, as reformas partidária, da Previdência e tantas outras. Há
até mesmo a questão da política a ser executada pelo futuro presidente da
Câmara diante dos projetos do governo que já estão ou serão submetidos à
apreciação dos parlamentares. Sobre essas questões, porém, não se extrai nem
uma mísera linha das notícias relativas à sucessão no comando da Câmara dos
Deputados. A grande maioria dos representantes do povo quer saber, antes de
qualquer outra coisa, que cargo vai ocupar na nova Mesa Diretora ou nas
comissões fixas ou especiais da Casa, ou como fica aquela sua indicação para a
diretoria daquela estatal ou ainda para a chefia daquela repartição federal em
seu reduto eleitoral. A regra é clara: quem não dá cá, não toma lá. É para isso
que serve a maioria dos partidos políticos brasileiros, fundados apenas com o
objetivo de permitir que seus dirigentes compartilhem dos recursos públicos.
A proliferação indiscriminada de partidos políticos
sem um mínimo de representatividade popular, que servem apenas a interesses
escusos de chefetes inescrupulosos, é mais um dos graves defeitos da
Constituição de 1988. Tendo a intenção de acabar com o autoritarismo por mais
de 20 anos imposto ao País pelo regime militar, os constituintes não cuidaram
de calibrar adequadamente o sistema de freios e contrapesos que deve balizar,
no sistema democrático, a separação, a independência e a harmonia dos Poderes.
A legitimidade da representação popular que preenche cargos do Legislativo e do
Executivo fica comprometida quando aos partidos políticos é permitido comportar-se
à margem de “princípios e idéias” e atender a interesses escusos. Quando a
contaminação do sistema partidário por esses interesses excede certos limites,
a desarmonia e o conseqüente entrechoque de poderes coloca toda a sociedade
diante do desafio de mudar o sistema para recuperar a seriedade e o equilíbrio.
A quem possa duvidar da gravidade da situação
política num país em que já lutam por espaço e por cobiçados recursos públicos
35 legendas partidárias basta atentar para o fato de que, neste exato momento,
o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registra 50 pedidos de criação de novos
partidos, como mostrou reportagem do Estado. Chega a ser paradoxal o fato de
que se pretenda criar tantas novas legendas exatamente no momento em que a
classe política atinge níveis altíssimos de desprestígio e repúdio, em boa
parte como conseqüência dos escândalos de corrupção sob investigação pela
Operação Lava Jato e congêneres.
Esse fenômeno da corrida pela criação de tantas
novas legendas partidárias pode ser explicado pela conjugação de dois fatores,
além de uma legislação eleitoral inadequada: o baixo nível de informação e
formação dos eleitores de modo geral e a convicção que têm os picaretas que
enxergam na política um atalho para vencer na vida de que essa situação perdurará
por muito tempo.
A imposição democrática de freios ao domínio desse
tipo de picaretagem na política é um objetivo que pode ser em boa medida
alcançado pela PEC, já aprovada pelo Senado, que estabelece cláusula de
desempenho para a habilitação do acesso dos partidos a recursos do Fundo
Partidário e ao horário eleitoral gratuito. Ninguém sabe dizer, porém, quando a
Câmara dos Deputados se disporá a examinar essa proposta. É aí que mora o
perigo.
Comentários
VAGNER F BARBOSA
Imagens da tragédia anunciada.
O blog está tinindo! A foto do profeta lula impondo as mãos e
“ungindo” o congresso – acima da foto do presídio pegando fogo – está
sensacional!
Rodrigues Junior
Algumas constatações assustam, principalmente porque é a
nossa triste realidade… “o baixo nível de informação e formação dos eleitores
de modo geral e a convicção que têm os picaretas que enxergam na política um
atalho para vencer na vida de que essa situação perdurará por muito tempo”. E o
pior! É ignorância em excesso de um lado e uma esperteza sem precedentes do
outro.
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