T
|
eriam
os políticos uma natureza diferente? Em que consistiria essa natureza? Depois
de ler “O Que Eu Não Quero Esquecer”, livro do deputado Henrique Eduardo Alves,
que me foi presenteado, a título de curiosidade, pelo deputado gaúcho Jerônimo
Goergen, eu penso ter compreendido essa natureza. É a chamada resiliência. No
popular, estômago de avestruz. Todo mundo sabe que políticos costumam suportar
coisas que nenhum ser normal aguentaria. Mas o livro do Henrique Alves me
mostrou que a dimensão da resiliência política é incomensurável.
A
obra-prima do próximo presidente da Câmara dos Deputados tem 260 páginas
coloridas impressas à custa dos contribuintes. São fotos do autor, elogios a
ele e elogios feitos por ele. O fato de eu ter sido capaz de ler parte desse
calhamaço indigesto prova que também possuo avantajado grau de resiliência, que
é a capacidade de adaptação necessária para sobreviver em situações extremas.
Na física, a resiliência é descrita como a propriedade de certos corpos
acumularem energia sob tensão sem ruptura. A vara verga, mas não quebra. O
corpo volta ao estado norma depois de ter sido submetido a uma forte pressão. O
termo resiliência tornou-se mais amplo. Passou a significar maleabilidade e
jogo de cintura.
U
|
ma
passagem em “O Que Eu Não Quero Esquecer” me escancarou a natureza da
resiliência política. Alves refere-se, em discurso na tribuna, a um embate com
o petista Cândido Vaccareza na noite da votação do Novo Código Florestal:
“Líder Vaccareza, nos meus 11 mandatos nesta Casa, talvez a palavra mais dura
que eu tenha recebido de um líder foi de V. Exª". Alves toma um pau. Fica deslumbrado: “V, Exª,
no seu papel impecável, exemplar, ético, honesto e desassombrado, assumiu esta
tribuna e foi duro demais”. Henriquinho, contudo, desculpa o colega: “Mas V. Exª
fez aquilo naquele momento para tentar o impossível, que era mudar o
resultado...”.
M
|
agnânimo, vitorioso, Alves diz ter aprendido a
admirar Vaccareza naquela disputa. Afinal, se o outro falava por “dever de
ofício”, ele “por idêntico dever – doído – ouvia e respeitava”. Depois dessa
refrega, conta o bravo parlamentar desflorestador, os dois foram jantar juntos
e foi “como se, de repente, desaparecesse por completo aquele sentimento de
incompreensão”, surgindo a “empatia do homem público respeitado e respeitador”.
Só um político é capaz de apanhar, aplaudir, sair para jantar com o algoz e vir
a público contara anedota como exemplo de elevado grau de civilidade e espírito
republicano. Em outras palavras, era puro jogo de cena. Nem mesmo as baratas
atingem tal patamar de resiliência.
Atualmente,
Henrique Alves está sendo obrigado a ler um livro sobre ele escrito pela mídia.
O título poderia ser: “O que Ele Gostaria de Esquecer”. Tenho certeza de que as
verdades reveladas não o abalarão. Não duvido de que venha a elogiar os
jornalistas que o estão detonando. Nem que os convide para jantar. Só não tenho
certeza de que ele pagaria a conta. Salvo se pudesse pedir nota para apresentar
à Câmara dos Deputados. É da sua natureza. Por Juremir
Machado da Silva, www.correiodopovo.com.br..
Nenhum comentário:
Postar um comentário