Renan
não está sozinho.
Na
política, tudo costuma ser jogada ensaiada. Se um deputado sinaliza fortemente
que está indo para um lado, há fortes possibilidades de que vá para o outro. A
isso se chama de astúcia política, mais ou menos como se jogar para cavar o
pênalti enganando o árbitro. Se um candidato potencial a um cargo afirma que
não está pensando no caso ou que talvez não concorra, é balão de ensaio: quer
ver a reação para impor a sua vontade. Como se diz popularmente, político não
prega prego sem estopa. O jovem senador Randolfe Rodrigues vem fazendo o papel
que lhe caba, o de “enfant terrible” da casa. Há dois dias, revelou o esquema
secreto que vem garantindo a vergonhosa candidatura de Renan Calheiros à
presidência do Senado.
É simples como são, em geral, as
armações da políticas. Simples e funcionais: Calheiros trabalhou para
transformar em pizza a CPI do Cachoeira, que, apesar de relatada por um
petista, incomodava muita gente importante, inclusive do petismo. Resultado:
ninguém foi indiciado. O governador de Goiás, o tucano Marconi Perillo, atolado
até o último fim de cabelo, escapou limpinho. O PT gostou e resolveu apoiar
Renan para a chefia do Senado. Renan Calheiros, desde o tempo em que era
colorido, é um mestre na arte do toma lá dá cá. Randolfe denunciou o “mensalão
do Renan”, uma troca de votos na CPI do Cachoeira pelo apoio à sua tomada da
presidência do Senado. Nada mudou. Cada voto tem preço.
Randolfe Rodrigues, pelo jeito, daria
um ótimo presidente do Senado. Seria um choque de renovação. Aos olhos das
velhas raposas, porém, ele é cheio de defeitos: é muito jovem, não gosta de
pizza política, integra o PSOL, que incomoda por ser marxista e “radical”. Na
política tradicional brasileira radical é um rótulo para adversários da
“sensatez” e a “moderação” dos arranjos convencionais que perpetuam os
Renan, Sarney, Jader Barbalho, Paulo Maluf e outros da mesma laia nas suas
zonas de conforto. Os “radicais” são cheios de convicções “desagradáveis” e
costumam defender temas inconvenientes como ecologia, combate à homofobia e ao
trabalho escravo, fim de mordomias do tipo salário-moradia para magistrados que
moram nas suas casas e outras coisinhas desse tipo que não chocam os
“razoáveis” encastelados no poder.
Dificilmente Randolfe Rodrigues será
presidente do Senado. Ele tem qualidades demais para isso. Na vida, quase
sempre é muito perigoso ter excesso de competência. Provoca inveja e prevenção.
Além disso, ele comete um pecado mortal em política: diz o que pensa
publicamente. A grande arte da política consiste em pensar uma coisa e dizer
outra para ludibriar o oponente. É no jogo de esconde-esconde que se constroem
os grandes poderes. Renan Calheiros não tem moral para presidir um lupanar. Não
me choca que ele insista. Faz parte da sua falta de superego. Chocante é que seus
colegas o apoiem. Por que não transferem seus votos para Randolfe Rodrigues?
Será que quase todo mundo tem o rabo preso em nosso Senado?
Renan Calheiros não está sozinho.
Há muitos coleguinhas dispostos a votar
nele.
Sinal de que o Senado ainda não se tornou
republicano. Por Juremir Machado da Silva, 31/01/2013, Correio
do Povo – Política.
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