Juiz da Lava Jato é o primeiro
palestrante do Exame Fórum 2015. Ele cobra uma 'faxina interna' nas
empreiteiras brasileiras
Por Luís Lima, Nicole Fusco, Talyta Vespa e Walter Nunes,
31/08/201, www.veja.com.br
O juiz federal Sergio Moro, responsável pelas ações
penais da Operação Lava Jato, afirmou nesta segunda-feira que o Brasil
"perdeu a sua dignidade", diante de um quadro de corrupção sistêmica
escancarado pelo esquema bilionário de desvios de recursos que se instalou na
Petrobras. "Perdemos a dignidade. Temos dificuldade de encarar a nós
mesmos diante do espelho, perante a comunidade internacional, diante de um
quadro de corrupção sistêmica", disse Moro no Exame Fórum 2015, promovido
em São Paulo pela revista EXAME, da Editora Abril, que também publica VEJA.
Moro que foi fortemente aplaudido, por mais de uma
vez, afirmou que, no caso da Lava Jato, mais "assustador" do que a
corrupção em si - que segundo ele, sempre irá ocorrer - é a naturalização do
pagamento de propina. Além dos custos diretos, como o reconhecimento dos
desvios de 6 bilhões de reais na Petrobras, há custos indiretos, como a
interferência de agentes públicos e privados no planejamento econômico. "O
enfrentamento da corrupção sistêmica trará ganhos significativos a todos: às
empresas, e à economia em geral. O custo da corrupção sistêmica é
extraordinário", disse, citando o caso da refinaria de Abreu e Lima, em
Pernambuco, que deve causar um prejuízo de 2 bilhões de dólares à Petrobras.
O magistrado disse que a corrupção faz o país
"andar pra trás". Para o juiz, os crimes de colarinho branco tiram a
confiança de agentes do mercado na concorrência justa e dos cidadãos e das
instituições privadas nas leis. "Afinal, estamos em um governo de leis ou
em um governo de homens? A lei se aplica para todos ou não?", questionou.
Ao comentar a onda de protestos contra o governo
federal no país, Moro disse que é preciso aproveitar o momento em que as
pessoas deixam a condição de consumidores para se tornarem cidadãs. "Esse
momento é muito raro. Apesar de o quadro econômico ser ruim há esperança -
desde que não nos acomodemos", disse.
O juiz também contestou o argumento de advogados de
defesa dos empreiteiros presos na Lava Jato e afirmou que as prisões decretadas
ao longo da operação são um recurso sempre excepcional, porque a "regra é
que o suspeito só pode ser punido depois de ser julgado". "O que eu
entendo é que o que existe [na Lava Jato] são indícios de um quadro de
corrupção sistêmica, e nesses casos há a necessidade de estancar a hemorragia
dos cofres públicos. E os tribunais têm entendido dessa forma, o que me deixa
em posição de maior conforto", afirmou.
Faxina - Moro disse que "não é contra acordos"
para que as empresas possam voltar a ter contratos com o setor público, mas
afirmou que eles precisam seguir regras e prever a colaboração das companhias.
Segundo o juiz, as empreiteiras têm de se comprometer em acabar com a
corrupção, a revelar todos os fatos pregressos e indenizar o poder público em
toda sua extensão. Ele também cobrou que as empresas troquem os cargos de
comando. "Não é possível seguir com acordos com os mesmos dirigentes que
estavam quando houve corrupção. É preciso que a empresa faça uma faxina
interna", disse.
Moro evitou comentar sobre as medidas que toma para
manter sua segurança pessoal e sobre o medo de retaliações. O magistrado
arrancou risos da platéia ao dizer que "por questões de segurança, não
fala sobre segurança". Ele também disse que não se sente confortável em
responder se a Lava Jato atingiria "o topo" do poder nacional.
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