O Brasil está arrebentado pelo inchaço além de qualquer limite
suportável não só do numero de funcionários públicos, mas também do excesso de
privilégios que lhes foram concedidos
Por Augusto
Nunes, 06/09/2016,
www.veja.com.br
Ricardo Lewandowski é o Eduardo Cunha do Judiciário. Não que seja venal ou tenha aquela
atitude temerária do outro, mas, no escurinho, anda sempre “tinindo nos cascos”
para manipular regimentos e votações colegiadas para “amaciar” penas para
meliantes e transformar alhos em bugalhos.
Na semana passada deu um susto no Brasil quando
emergiu dos mais recônditos bastidores da “narrativa do golpe” cheio de
anotações e deu um tirombaço abaixo da linha d’água do “seu” próprio STF,
guardião da Constituição, colocando-a – e a ele até segunda ordem – abaixo do
regimento interno do Senado de Renan Calheiros e pondo a bandidagem política
como um todo em festa.
Se os seus presididos aceitarem essa demissão
virtual por “extinção de função” ou jogarem nas costas do Brasil o ônus do
golpe que houve, como querem os autores da “narrativa” do golpe que não houve,
terá sido o fim final da batalha épica para fazer a lei e a segurança jurídica
imperarem um dia no Brasil.
Esperemos que não o façam. Se alguém tem de ficar
desmoralizado, porque não há como sair da encalacrada sem isso, que não sejam o
STF, a Constituição e o Brasil. Quem pariu Mateus que o embale…
No mais, vamos perdidos, como sempre, no vácuo
entre o Brasil real e o Brasil “da narrativa”, que não se restringe à do golpe
ou não golpe.
O governo Temer, tangido pela opinião pública ou
por iniciativa própria, tem voltado sempre para o canal certo, até porque não
há alternativa para ele fora do canal certo.
O barulho todo que o PT fez, como não se cansam de
repetir seus batedores de bumbo, era apenas para “construir a narrativa do
golpe” a ser usada mais adiante, quando levar ao nível de saturação do costume
a atribuição aos bombeiros do incêndio que ateou. Na verdade, precisa livrar-se
do desastre ambulante Dilma Rousseff tanto quanto você e eu e, mais que dela,
da herança desses 13 anos de tramóias para nos impor, pela tangência das
instituições democráticas, esse “socialismo do século 21” que assola os países
que retiraram seus embaixadores em solidariedade ao Chefe de Todos os Chefes
caído. Mas não quer dizer que tenham desistido do poder em que tão gostosamente
se têm lambuzado.
O impeachment é a única chance de sobrevivência do
PT. Se tivesse de descascar sozinho o abacaxi que plantou, não sobraria nem o
pouco que sobrou. O problema é que deixar ao PT o comando do naufrágio do navio
cujo casco arrombou implicava o suicídio do Brasil, e já. De modo que, com ou
sem vaidades e más intenções na carona, assumir a “trolha” era inevitável.
Assim se inverteram os papéis: evitar o naufrágio passou a ser a única chance
de sobrevivência da oposição. E não há como evitá-lo senão fazendo a coisa
certa e, mais ainda, na dose certa.
O Brasil está arrebentado pelo inchaço além de
qualquer limite suportável não só do numero de funcionários públicos, mas
também do excesso de privilégios que lhes foram concedidos, especialmente à
minoria dentro dessa minoria, os “comissionados” e xeretes de encruzilhadas
estratégicas do “Sistema” que constituem o núcleo duro da militância do PT que
nunca caiu, antes ou depois da ascensão ou da queda do partido. Segundo
especialistas acima de qualquer suspeita como Ricardo Paes de Barros,
formulador do programa Bolsa Família, esse grupo desfruta salários diretos e
indiretos e vantagens tais que “distorcem a estatística de distribuição da
renda nacional”. Trata-se, portanto, de uma minoria dentro da minoria que é o
funcionalismo como um todo, menos de 5% da população que consome quase a metade
do PIB (46% contado só o “por dentro”) e não devolve aos 95% dos quais surrupia
esse balburdio senão humilhações, escândalos e o cipoal legislativo, tributário
e burocrático tramado com o propósito específico de impedi-los de trabalhar a
menos que comprem por bom preço a isenção a esse inferno.
No campo da Previdência a distorção é maior ainda.
Apenas 980 mil aposentados e pensionistas da União produzem um déficit anual de
R$ 93 bi, mais que o gerado pelos 32,7 milhões de aposentados e pensionistas do
setor privado somados. E há ainda os dos 25 Estados e 5.570 municípios…
Este, não obstante, continua sendo um “não
problema” que os governantes e administradores públicos não podem sequer
mencionar porque, sendo esse tema uma pauta rigorosamente banida de uma
imprensa decidida a não enxergar aquilo que lhe bate na cara, essas contas e a
sua tradução “cênica” de tão ricas possibilidades mobilizatórias são mantidas
fora do horizonte consciente do brasileiro médio, o que tira dos políticos e
administradores públicos bem-intencionados o “álibi” que se requer dentro dessa
ditadura velada em que vivemos para jogar a favor dos 95%. Falar do tema por
iniciativa própria dentro de qualquer instância política, partidária ou de
governo é morte certa.
Prevalece, assim, “a narrativa”, que a imprensa e
seus “especialistas” amestrados coonestam, que fala numa vaga “desorganização
da economia” herdada de Dilma Rousseff, sem nunca mencionar uma causa
localizada, precisa e escandalosamente definida como é de fato a única que
existe e, conseqüentemente, só pode ser combatida por “medidas impopulares” ou
“de redução de direitos” não de quem permanece flutuando acintosamente por cima
da crise e exigindo mais sangue, mas de quem já está morrendo de anemia.
Se o seu jornal ou canal de TV está entre os que
lhe servem toneladas de matérias para demonstrar, por exemplo, que o maior
problema do país mais miscigenado e libertino do mundo são o racismo e a
repressão sexual, e nem um grama de manchetes e cenas pungentes para cotejar as
agruras da “via-crúcis” em que penam os 95% com as doçuras da abundância e da
segurança inabalável em que permanecem escondidos os 5% que fabricam crises,
mas não as vivem, ele é um dos que estão cometendo o crime de responsabilidade
que mantém o País refém dessa máfia. Você deveria cobrá-lo com o rigor que um
crime desses merece.
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