Por Ruy
Castro, 23/12/2016,
www.folhades.paulo.com.br
RIO DE JANEIRO - Fui amigo de Ivan Lessa (1935-2012) por 40 anos e
tínhamos várias fixações em comum: baixos profundos como Billy Eckstine, Al
Hibbler e Herb Jeffries, artigos de Kenneth Tynan, filmes com Maria Montez e
Sabu. Nossa única discordância se devia à sua mania de chamar o Brasil de
"Bananão". Eu achava a classificação injusta – não que o Brasil não
fizesse por merecer, mas porque não se aplicava tecnicamente.
O termo "República das bananas" foi
criado em 1904 pelo contista americano O. Henry, que se refugiou numa delas
para fugir à polícia de seu país. A dita república era Honduras, com seus
espessos bananais, mas o epíteto definia também o Panamá, Cuba, Haiti, a
Nicarágua e a República Dominicana, todos dominados pela United Fruit por volta
de 1900. O presidente Teddy Roosevelt (1901-09) gostou da expressão e decretou
que os EUA tinham o direito de intervir nas "Repúblicas das bananas"
quando quisessem.
O Brasil, por produzir café, ficou meio a salvo
dessa categoria. Além disso, os EUA nunca se meteram a bestas conosco — não
ostensivamente. Depois, diversificamos a produção e até nos industrializamos.
Mas Ivan não se convencia. De sua janela em Bolton Gardens, Londres, onde
passou seus últimos 34 anos, continuou a nos ver como o "Bananão".
Mas eu estava certo, e a Lava Jato tem provado isso
a todo instante no noticiário. A cada corrupto ou corruptor exposto nas
investigações, surgem dezenas, centenas de "laranjas", que emprestaram seus nomes ou empresas — amigos,
filhos, cunhados, mulheres, ex-mulheres, caseiros, faxineiras, gráficas,
oficinas, borracharias, "consultorias" e o que for, todos fantasmas,
sem falar num certo lava-jato em Brasília —, pelos quais escoaram bilhões em
propinas, caixas dois, "palestras", imóveis, jóias.
"Bananão"? Não. Um
fértil e imenso laranjal.
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