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quinta-feira, 20 de agosto de 2015

O CARTEIRAÇO DA CIDADANIA



Por Rogério Mendelski, 24/06/2013,
 www.correiodopovo.com.br

O Brasil decente está respondendo a uma pergunta feita, em 1976, pelo então presidente da Arena, o deputado federal Francelino Pereira (nascido no Piauí, mas com carreira política em Minas Gerais): “Que país é este?” Renato Russo já tinha se manifestado a respeito quando compôs o rock com o mesmo nome da pergunta de Francelino, em 1987: “Nas favelas e no Senado/Sujeira prá todo lado/Ninguém respeita/A Constituição/Mas todos acreditam/ No futuro da nação…” Os brasileiros também responderam a Francelino Pereira nos comícios das diretas e nas caras pintadas que ajudaram a derrubar Fernando Collor, mas é bem provável que nunca, em tempo algum, o Brasil tenha mostrado o seu lado decente e cheio de indignação como neste mês de junho de 2013. Nosso país, como dizia outro compositor jovem como Renato Russo, Cazuza, está mostrando a sua cara, “pois queremos ver quem paga prá gente ficar assim” E estamos pagando para ver e para o Brasil (oficial) nos dizer “qual é o teu negócio e o nome do teu sócio?” Os poderosos, em todas as épocas, que jamais se assustaram com movimentos populares estão como porteiros de boate que só têm medo quando alguma autoridade pede para furar a fila dizendo “você sabe com quem está falando?” Nesta outra volta do parafuso, como dizia Henry James, chegou à vez do nosso carteiraço para os donos do Brasil: “Vocês aí, falsos proprietários do poder, sabem com quem estão falando?” E a nossa identidade legítima que centenas de milhares estão bradando num eco rigorosamente geográfico – do Oiapoque ao Chuí – é o carteiraço da cidadania. E por que os brasileiros estão gritando e protestando com chuva e frio aqui no Sul ou com calor no Norte, interrompendo pontes, rodovias e avenidas das grandes cidades? Por uma razão que pode ser singela nas sociedades mais avançadas que a nossa, mas decisiva para todos nós. Queremos abrir uma porta para a dignidade que não pode ser mais um espaço exclusivo de uma elite muito bem conhecida de todos nós. Lá dentro vamos encontrar leitos hospitalares, escolas para nossos filhos, transporte coletivo decente, segurança pública, empregos, paz e tranqüilidade. Chega de pagar o banquete e comer apenas a sobra da mesa. Quando sobra…


Ritos de passagem são celebrações que marcam mudanças de status de uma pessoa no seio de sua comunidade. A jovem democracia brasileira estaria nestes dias fazendo a sua cerimônia coletiva? Ela cansou de seus representantes eleitos e que deixaram de corresponder às suas expectativas? A presença do povo brasiliense nas portas do Congresso Nacional pode ser uma cerimônia de mudança?
O antropólogo Roberto da Matta diz que a malandragem brasileira é o reflexo de uma classe política. “A malandragem é uma prática quase que diária: é o dinheiro não declarado na declaração de renda, é o sinal de trânsito que o sujeito fura, é a gambiarra. De certo modo, a malandragem é o sintoma de uma sociedade que tem relação ruim com o Estado".


Mudar esse estado de malandragem institucional – um dos fatores dos protestos do povo brasileiro – necessita do que chamamos de vontade política; e vontade política não diz respeito simplesmente a fazer leis. Roberto da Matta entende que tudo “tem a ver com a percepção de que a sociedade é construída pelo Estado e pelos seus costumes”. “É uma dialética, um caminho que queremos que a sociedade trilhe, mas nenhuma sociedade conseguiu se desenvolver com facilidade. Todas tiveram seus problemas”.


Entreouvido num restaurante, em Brasília:- Os EUA lançaram um plano para comprar ativos podres. - E será que eles sabem que no nosso Congresso tem 513 deputados e 81 senadores à venda?


Ainda no mesmo restaurante, em Brasília, dois parlamentares conversando. -Vossa Excelência está sabendo que as manifestações populares não brigam apenas por 20 centavos a menos na passagem do ônibus, mas exigem também educação, saúde, segurança e transporte de qualidade? - Nobre colega, mas quem eles pensam que são? Nós?




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