Por Reinaldo Azevedo, 06/08/2015,
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Ai,
ai…
“Lúpus pilum mutat, non mentem” O lobo
muda de pelo, mas não de idéia, de caráter, de personalidade. Em português, já
escrevi aqui, outra versão se popularizou: “O lobo muda de pelo, mas não de
vício”.
O senador Fernando Collor (PTB-AL), um
dos investigados da operação Lava-Jato, fez nesta quarta um discurso de 18
minutos na tribuna do Senado contra Rodrigo Janot, procurador-geral da República
— que certamente lhe será grato, já digo por quê. Apontou o que considerou
desmandos dos procuradores — duas vezes se referiu à força-tarefa como
“grupelho”, defendeu-se das acusações que lhe faz a turma, discursando com
aparente serenidade, de forma pausada.
Mas sabem como é a natureza do
escorpião — ou, sei lá, do lobo. Ao sustentar que os carros apreendidos em sua
casa pertencem a suas empresas e têm origem lícita, fez uma pausa, não se
conteve e, entredentes, mas de forma muito clara, disparou contra Janot: “Filho
da puta!”. Vejam aí. O palavrão é pronunciado aos 5min04s.
Transcrevo o trecho:
“As empresas têm contrato social, estão
devidamente registradas na Junta Comercial, têm atividades de acordo com o que
define a legislação. Se existem parcelas em atraso, é uma questão comercial que
diz respeito a mim e ao credor, não podendo jamais, em tempo algum, sob risco
de uma grave penalização judicial a quem afirma, que tal atraso se deva ao não
recebimento de recursos escusos. Afirmações caluniosas e infames! Filho da
puta”.
Pois é…
Não se pode cassar de ninguém, nem de
Collor, o direito de se defender também politicamente, que é o que ele faz na
tribuna do Senado. Mas é aceitável que se manifeste desse modo? Ele reclama,
por exemplo, de uma indústria de vazamentos de informações que teriam origem na
Procuradoria. Que exponha lá, afinal, os seus motivos. Mas, ao partir para a
baixaria, fala mais de si do que de seus desafetos. É lamentável!
O senador reclama, por exemplo, que,
nesta terça, seus assessores receberam telefonemas de jornalistas às 10 da
manhã para saber se ele diria alguma coisa sobre parecer de Janot, que se
opunha à devolução dos carros, que ele, Collor, havia solicitado ao Supremo.
Emenda, então, o senador:
“Às 15 horas de ontem, meu advogado foi
recebido pelo Ministro Teori Zavascki, a quem deveria ser dirigido o parecer e
dado conhecimento exclusivo. Disse o ministro que, até aquele momento, não
havia recebido nenhuma comunicação do procurador-geral”.
E então conclui o senador: “Portanto,
vejam os senhores que informações que correm sob ‘segredo de justiça’ foram
vazadas seletivamente, de forma criminosa, pelo procurador-geral da República
aos meios, antes mesmo que o ministro relator do Supremo Tribunal Federal
tomasse delas conhecimento!”.
Collor acusa a existência de um conluio
entre a Procuradoria e veículos de imprensa e diz que Janot contratou uma
empresa de comunicação, a Oficina da Palavra, para organizar os vazamentos. Ele
diz haver irregularidade na contratação dessa empresa e afirma que a imprensa
se nega a apurá-las. Em socorro de sua tese, lê trechos de uma carta que
servidores da Secretaria de Comunicação Social do Ministério Público Federal
encaminharam, no dia 6 de março deste ano, a Janot (leiam o trecho citado por
Collor no pé deste post). De fato, há lá uma serie de acusações contra a
Oficina da Palavra.
Collor não escondeu o objetivo de sua
intervenção. Quer que seus pares rejeitem o nome de Rodrigo Janot. Afirmou:
“Pois bem, senhor presidente, volto
então a perguntar, como tenho feito há meses desta mesma tribuna: há ou não há
uma sórdida estratégia midiática promovida pela Procuradoria-Geral da
República? Por tudo isso, a responsabilidade institucional do Senado Federal,
quando da apreciação do nome indicado pela presidente da República ao cargo de
procurador-geral da República, será ainda maior. É preciso que todos,
parlamentares, mídia e população, abram os olhos para muitos dos aspectos que
estão por trás dessas investigações.”
Desde quando era presidente da República,
Collor é um de seus principais inimigos. A questão é saber se, com o discurso
desta quarta, arranjou mais aliados ou mais adversários para a sua causa. A
resposta, depois da grosseria inaceitável, me parece óbvia.
Trecho da carta que servidores da Secretaria
de Comunicação Social do Ministério Público Federal enviaram a Janot, em que
reclamam da atuação da empresa “Oficina da Palavra”, reproduzido por Collor em
seu discurso.
“Em dezembro de 2014, em conversa com o
Procurador-Geral da República, manifestamos nossa preocupação com o cenário que
se projetava com a contratação da Oficina da Palavra e com a forma como as
mudanças vinham sendo implementadas, mas julgamos que era possível dar um voto
de confiança à Administração. Contudo, nossas expectativas foram frustradas.
(…)
A análise que fazemos é de que a
estratégia adotada tem redundado em uma série de ações questionáveis, que
prejudicam a imagem e a reputação institucional. Essas ações também se revelam
contrárias aos princípios constitucionais, como o da impessoalidade e da
publicidade; aos preceitos da comunicação pública; e às diretrizes
institucionais, em especial da transparência e do profissionalismo.
É perceptível, e nos causa perplexidade,
o descontrole sobre as informações decorrentes da Operação Lava Jato, que
redundaram em vazamentos e, segundo a imprensa, colocam em dúvida a
legitimidade da atuação institucional e dão margem a questionamentos acerca do
tratamento diferenciado que se tem concedido a determinadas empresas de
comunicação.
(…)
Mesmo nos mais diversos círculos de
convivência, a instituição tem sido ridicularizada e sua isenção questionada,
por conta de declarações e imagens consideradas demagógicas e personalistas.
Este não é o primeiro período turbulento
e de grande repercussão pública que assola a instituição. Podemos lembrar os
acontecimentos decorridos durante os trabalhos do mensalão. Naquela ocasião não
ocorreram vazamentos nem a imagem institucional foi denegrida como está
acontecendo no momento presente.
(…)
Não podemos esquecer que o Ministério
Público Federal é uma instituição pública e fundamental para a democracia e a
cidadania. Portanto, suas ações não podem prescindir de uma comunicação pública
baseada na ética, na transparência e na verdade. Portanto, gostaríamos de saber
se é estratégia:
A: dar acesso a informações extremamente
sensíveis para uma empresa privada cuja finalidade precípua é obter lucro?;
B: vazar informações para
os grandes veículos de comunicação?;
C: fornecer informações
em off e privilegiar determinados veículos de comunicação?;
D: não divulgar antes nos
canais de comunicação do próprio Ministério Púbico Federal informações de
grande interesse público, como o envio ao Supremo Tribunal Federal a lista dos
ocupantes de cargos públicos suspeitos de envolvimento na Lava-Jato?;
E: é correto priorizar a
quantidade em detrimento da qualidade da exposição?;
F: é correto
desprestigiar a comunicação pública e substituí-la por barganhas e estratégias
próprias da comunicação mercadológica a fim de conseguir “capas de jornais e
destaques em jornais televisivos”?
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