Por Augusto Nunes, 08/08/2015,
www.veja.com.br
Uma
esplêndida crônica da escritora Lya Luft publicada em sua coluna na edição 2437
de VEJA, respondeu com uma semana de antecedência aos embustes e provocações
empilhados no programa partidário do PT. Não deixe de ler. (AN)
Texto
de Lya Luft
Sempre procurei, tantas vezes em vão,
encontrar o significado de tudo. Por exemplo, por que há pessoas boas e más,
por que as pessoas boas fazem coisas más e vice-versa, por que entre pessoas
que se querem bem pode haver frieza ou até maldade, por que… lista infindável,
ainda mais para quem tem um pouco de imaginação. A cada momento reinventamos o
mundo, reinventamos a nós mesmos, reinventamos nossos afetos para que seja tudo
menos doloroso.
Escrevendo sobre a situação do Brasil
um pequeno livro que deve aparecer em breve, observo ainda mais intensamente o
que acontece, tanta coisa inacreditável, mas real. Assim reflito quase
constantemente sobre todas as loucuras, baixezas, perigos, sustos, desalentos
atuais, aqui e ali uma luzinha minúscula que logo bruxuleia. Vai se apagar para
sempre? Nada é para sempre. As coisas más, as fases ruins, também hão de
passar. Mas, no momento, não sou otimista. Falsidade, mentiras, arzinho
superior e palavras fantasiosas sobre questões fundamentais, apontar o dedo
para o adversário, tudo é pior do que a dura verdade. Assustam-me discursos com
que neste momento dramático alguns negam ou diminuem a gravidade da situação,
revelando-se o desvio de inacreditáveis fortunas que deveriam atender o povo
mais carente, a maior vítima desse desastre, um povo despossuído, sem as coisas
essenciais que lhe têm sido negadas ─ não por uma fatalidade, mas por ganância
de quem já tinha uma boa fortuna, mas queria mais, e mais.
Hoje, os acusados reagem com ironias,
ameaças, invenções: mas fizeram de nós um dos piores países do mundo em quase
tudo, sobretudo educação e segurança. Ninguém assume sua responsabilidade,
antes critica adversários ou países mais adiantados, como se fôssemos todos uns
pobres crédulos. Começamos a perceber o que se passa no nevoento território da
política que fragilizou a economia, e é cenário de tão grave incompetência e
irresponsabilidade. Na grande negociata nunca vista, quase todos tinham seu
preço: não foi barato. Pouco sobrou para o brasileiro que ignorava esses fatos
que atingiram seu bolso, sua esperança e suas possibilidades de uma vida
decente.
A política influenciou e dominou nossa
existência nos últimos anos, com gestão incompetente, péssimo planejamento,
desorganização nas contas públicas, maquiagem do desastre que foi escondido de
um povo mal informado porque mal escolarizado (não é por acaso que negligenciamos
tanto a educação). A pátria-mãe desvia o rosto; nós, os filhos, largados na
floresta como num conto de fadas sinistro. Os próprios investigadores das
gigantescas fraudes, impressionados, admitem estar diante de tramas de dimensão
e sofisticação nunca vistas.
A paisagem brasileira está de pernas
para o ar: nada faz muito sentido, tamanho o escândalo. Para começar, os
salários com que tentamos manter uma vida honrada são patéticos diante das
cifras roubadas, apresentadas pelos competentes e corajosos investigadores.
Irresponsabilidade e incompetência comandaram as façanhas que esfacelaram o
país, agora rebatizadas de “malfeitos”. Espantoso: os desvios não eram
efetuados por bandidos oficiais, mas por grandes empresários que admitem, talvez
forçados pelo medo, que, se não tivessem entrado no esquema de corrupção e
pagados as irreais propinas, suas companhias teriam ficado “de fora” da roda
dos mafiosos, prejudicando seus acionistas e trabalhadores. Quase todos afirmam
com veemência que de nada sabiam: viviam em outro planeta. Não saber de nada
passou a ser um triste refrão.
Os investigados, denunciados e presos
continuam protestando contra tamanha maldade: todos vítimas do lobo mau da
Justiça. Seus defensores encenam uma ópera-bufa de delirantes explicações:
roubalheira mascarada de comportamento legal, nos parâmetros da decência. Se
essas ficções patéticas fizessem sentido, nunca teria havido tantos inocentes
no mundo: as elites e os estrangeiros seriam os culpados. Essa farsa acabou:
não há desculpa perante uma nação ferida.
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