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segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Pedir a saída de Collor em 1992 era legítimo; cobrar a de Dilma, em 2015, é legítimo e também legal. Golpe é tentar silenciar a população



Por Reinaldo Azevedo, 07/08/2015, www.veja.com.br

Já faz tempo que essa conversa enjoada do PT está por aí, assegurando que um eventual processo de impeachment contra Dilma é golpe. Golpe uma ova! Aqui e ali também se diz: “Ah, Dilma não é Collor”. O que se pretende com isso? O fato de Dilma não ter na garagem uma Ferrari ou um Lamborghini não faz dela uma inimputável política.
No dia 11 de março, eu me ocupei desse tema aqui no blog. E constatei algumas coisas. Reproduzo parte daquele texto e depois avanço.
Há, sim, algumas diferenças fundamentais entre 1992 e 2015; entre as circunstâncias que acompanharam a denúncia apresentada à Câmara contra Fernando Collor, que resultou no seu afastamento, e as que estão presentes no debate sobre o impeachment de Dilma Rousseff. Em 1992, Barbosa Lima Sobrinho, então presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), era um dos signatários da petição. O outro era Marcelo Lavenère, então presidente da OAB. Em 2015, a ABI emprestou a sua sede para Lula promover um ato de suposta defesa da Petrobras. À porta da entidade, milicianos desceram o braço em pessoas que protestavam contra Dilma.
Em 1992, as esquerdas queriam chegar ao poder. Em 2015, os esquerdistas já estão no poder. E que fique claro: havia uma penca de motivos para denunciar Collor. Como acho que há uma penca de motivos para denunciar Dilma.
Trago de novo uma peça nem tão fácil de encontrar. Se vocês clicarem aqui, encontrarão em PDF o Diário do Congresso Nacional de 3 de setembro de 1992 que traz a íntegra da denúncia formulada contra Collor com base na Lei 1.079, a Lei do Impeachment. Se e quando tiverem tempo, vale à pena dar uma lida.
Se a história aceitasse recall com base em algumas avaliações influentes no presente, seria o caso de devolver o mandato a Collor, que lhe teria sido tomado, então, injustamente. Se faltam motivos para pedir o impeachment de Dilma Rousseff — porque, segundo dizem, não há provas contra ela —, então cabe perguntar quais eram as provas que existiam contra o então ex-presidente. A pergunta seria absurda, dado tudo o que se sabia, e se sabe, da promiscuidade entre o agora senador e PC Farias? Seria sim! Mas não menos do que essa história de que, até agora, nada pesa contra Dilma.
Collor foi denunciado com base no Inciso 7 do Artigo 8º e no Inciso 7 do Artigo 9º da Lei 1.079. Ele foi acusado de permitir infração de lei federal e de atentar contra o decoro do cargo. A lei exige que se apresentem provas. A dupla alinhavou algumas evidências colhidas pela CPI — e não custa lembrar que o homem foi absolvido pelo Supremo —, mas deixava claro, desde o início, que a questão realmente relevante era a política. Lá estava escrito:
“O impeachment não é uma pena ordinária contra criminosos comuns. É a sanção extrema contra o abuso e a perversão do poder político. Por isso mesmo, pela condição eminente do cargo do denunciado e pela gravidade excepcional dos delitos ora imputados, o processo de impeachment deita raízes nas grandes exigências da ética política e da moral pública, à luz das quais hão ser interpretadas as normas do direito positivo”.
A mim, então, me parece bem. Quando sei que existe uma cadeia de comando na Petrobras, que chega à presidente da República, e se sei que uma quadrilha lá está instalada com o intuito, entre outros, de arrecadar dinheiro para o partido do poder — dinheiro que, segundo consta, inundou a sua própria campanha —, parece-me que as raízes da ética na política e da moral pública foram desafiadas.
A petição contra Collor ensinava mais:
“Nos regimes democráticos, o grande juiz dos governantes é o próprio povo, é a consciência ética popular. O governante eleito que se assenhoreia do poder em seu próprio interesse, ou no de seus amigos e familiares, não pratica apenas atos de corrupção pessoal, de apropriação indébita ou desvio da coisa pública: mais do que isso, ele escarnece e vilipendia a soberania popular.”
E o texto prossegue:
“É por essa razão que a melhor tradição política ocidental atribui competência, para o juízo de pronúncia dos acusados de crime de responsabilidade, precisamente ao órgão de representação popular. Representar o povo significa, nos processos de impeachment, interpretar e exprimir o sentido ético dominante, diante dos atos de abuso ou traição da confiança nacional.
"A suprema prevaricação que podem cometer os representantes do povo, em processos de crime de responsabilidade, consiste em atuar sob pressão de influências espúrias ou para a satisfação de interesses pessoais ou partidários".
Acho que está tudo aí. Se e quando a oposição resolver apresentar uma denúncia contra Dilma na Câmara, sugiro que copie os termos da petição apresentada por Barbosa Lima Sobrinho, no tempo em que a ABI não abrigava milicianos, e por Lavenère, no tempo em que a OAB parecia ter mais coragem para defender o Estado de Direito.
Falei?
E observem que nem toquei nas pedaladas fiscais.
Concluo
O que estou deixando claro, meus queridos, é que, em 1992, bastou à legitimidade — a esmagadora maioria queria — para pôr Collor na rua. Os aspectos que diziam respeito à legalidade eram, para dizer pouco, cediços. Havia o que a gente sabia e coisa e tal. Mas já naquele tempo era preciso mais do que isso; era preciso ter provas.
Nos dias que correm, estão dadas legitimidade e legalidade. A esmagadora maioria também quer Dilma fora do poder. E, desta feita, a infração legal é explícita: se acham que suas digitais, ainda que sejam as da omissão, não estão no escândalo da Petrobras, seu movimento de pernas na contabilidade é inequívoco: ela pedalou.
De fato, 2015 não é 1992: desta feita, pedir — e decidir — o impeachment não é apenas legítimo. Também é legal.

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