Já que não dá para dizer outra coisa aos que escarnecem o povo com
interpretação perversa das leis e direitos só para os que 'pensam como nós'
Por Vilma
Gryzinski, 03/05/2017,
www.veja.com.br
O poder que
nos humilha, massacra e despe: venezuelano nu é um símbolo da revolta dos
abandonados
O venezuelano nu diante da força do Estado mostrou
o desespero de um país que chegou a uma situação extrema.
Hans Wuerich que, há duas semanas, tirou a roupa
para mostrar os sinais das balas de borracha no corpo magro, virou um símbolo e
um aviso: chega uma hora em que não dá mais para agüentar.
É um recado que não tem fronteiras, a mensagem sem
palavras dos que são tripudiados por aqueles a quem deveriam representar e
defender. Os eleitos pelo voto, os concursados, os nomeados, os togados.
Os que sabem falar bem, emitir opiniões e
interpretar leis, mas pervertem suas obrigações funcionais, morais,
profissionais e humanas.
Os que, evidentemente, soltam condenados pela
justiça porque um julgamento em primeira instância não vale nada. Desde que os
julgados sejam aqueles a quem desejam proteger, sob a capa negra dos argumentos
falsificados de defesa do estado de direito.
A interpretação perversa das leis e a defesa dos
direitos universais apenas aos que “pensam como nós” não é exclusiva dos
togados e dos eleitos. Organizações não-governamentais e profissionais que têm
o dever de informar incorrem nas mesas deformações.
Alguns exemplos recentes, ocorridos no Brasil, da
mesma forma que poderiam ter acontecido em outros lugares do mundo, desde que
as liberdades democráticas permitam estes abusos.
Devido a assaltos contra empresas de transporte de
valores, com roubo dos armamentos pesados, vem sendo sugerido que a solução
seria desarmar estas empresas. Ou seja, depois da cassação do direito à
legítima defesa dos cidadãos comuns, a proposta é tirar as armas das empresas
que permitem o dinheiro aparecer nos caixas eletrônicos e os celulares, entre
outros produtos valorizados, chegarem às mãos dos contribuintes desprotegidos.
Antes, evidentemente, que criminosos armados os
levem e as vítimas ainda precisem agradecer a providência divina, na falta da
humana, por não terem levado um tiro no processo.
Além de usar armas pesadas, mesmo que isso faça
parte intrínseca de sua função, as empresas de segurança também parecem cometer
o pecado imperdoável de serem empresas. Utilizam armamentos, representam o
capitalismo e provavelmente merecem ser eliminadas da face da terra, é o
raciocínio implícito.
Seus funcionários, expostos a alto risco e
alvejados por criminosos, não são lembrados nem uma única vez. Merecem morrer
mesmo, é, mais uma vez, o raciocínio implícito. O mesmo aplicado aos policiais
que “agridem estudante”.
Tomara que o estudante se recupere, que retorne à
vida, à família e aos estudos. Mas qual é a parte da constituição brasileira
que garante a manifestantes o direito de cobrir o rosto?
Tomara que o policial que o feriu, se comprovado o
abuso, seja tratado como prescreve a lei. E tomara que os estudantes que
gritavam “abuso de poder”, repetindo idiotices provavelmente ouvidas de
professores idiotas, algum dia entenda que a expressão certa não é “abuso de
poder”.
E os “imigrantes estrangeiros agredidos” pela
“extrema direita” em São Paulo? Além do pleonasmo, os absurdos lógicos são
escandalosos: os policiais presentes e as primeiras instâncias jurídicas
consideraram que os “imigrantes estrangeiros” jogaram uma bomba na “extrema direita”,
resultando numa “confusão”, a palavra preferida pelos espíritos mornos.
Mas só os “imigrantes estrangeiros” foram presos,
reclamaram os informadores. O que levaria à seguinte situação: se um cidadão
conseguir reagir a um assalto e ferir um criminoso, contrariando todos os
conselhos dos especialistas que culpam as vítimas quando esboçam algum sinal de
inconformidade, ambos devem ser presos.
Principalmente se o cidadão for de “extrema
direita”. Esta se fizer manifestações, estará sempre incorrendo em crimes
inomináveis. Se for do outro lado do espectro político, em compensação, será
“manifestante”, “estudante” ou até “participante”. De extrema esquerda, jamais.
E por que será que a “extrema direita” começa a
atrair simpatizantes? O desamparo e a revolta dos cidadãos abandonados por
todos, principalmente os que sabem falar bem, teriam algo a ver com isso?
Togados e não-togados entendem as conseqüências de
seus atos? Percebem que o venezuelano nu diante do poder do Estado pode ser um
sinal de coisas que estão por vir? Entendem a voz dos que os maldizem?
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