Por
Rogério Mendelski, 27/02/2013,
www.correiodopovo.com.br
Não sei se é correto dizer que a
barbárie é filha da impunidade, pois barbárie sempre é um sinal de regressão
comportamental, mas aplicada a nós, nos dias de hoje, o parentesco com a
impunidade vigente é inevitável.
Há quem diga com humor ferino que se o
Brasil continuar do jeito que está; nas três ou quatro próximas eleições iremos
eleger bugios como nossos representantes parlamentares.
Na verdade, o que ocorreu nesta semana
na frente do Mercado Público com a morte de um morador de rua a golpes de
socos, chutes e culminando com o esfacelamento da cabeça da vítima, revela o
parentesco da barbárie com a impunidade.
Basta que se busque o motivo da
violência inominável contra o morador de rua. Ele acabara de assaltar um dos
linchadores que pediu socorro a outras pessoas nas proximidades.
O grupo que assassinou o morador de rua
poderia tê-lo imobilizado e chamado a polícia para prendê-lo. É aí, nesse
quadro (não é diferente do que ocorre todos os dias na nossa cidade) que a
impunidade se apresenta com seu sorriso maroto, como a serpente tentando Adão
no paraíso, sugerindo “por que não apagar esse bandido?”
Quem pode garantir que o assaltado, no
calor de seu ódio, não teve alguns segundos de projeção de cenas que mostram
assaltantes permanecendo por um tempo menor na delegacia do que suas vítimas
que foram registrar a ocorrência?
Quem já foi vítima dessa impunidade
legal esquece que só a lei pode punir o crime e a isso se chama de justiça e
nada pode estar acima da lei. Mas que lei é essa que estabelece a diferença
maior entre povos civilizados e povos em busca de civilidade?
Nas civilizações mais adiantadas, os
bandidos, os assassinos, os ladrões do dinheiro público, os pedófilos, os
estupradores vão para a cadeia. Nós, contemporâneos da barbárie nacional, na
maioria das vezes elegemos os nossos bandidos para nos representar nos
parlamentos e em outros cargos importantes.
E assim como “não dá em nada roubar e
ser bandido no Brasil,” será que os assassinos do pobre morador de rua não
agiram baseados nessa lógica perversa? Confiantes numa impunidade que também
poderia ser estendida a eles?
No Mercado Público tivemos um
linchamento que é apenas o crime de justiça com as próprias mãos, ou ainda,
justiça desprovida de inteligência, ou brutalidade e barbárie. O velho oeste
começa a se projetar em nós, não como um filme, mas como um sinal de
embrutecimento da sociedade que já está cansada de tanta impunidade.
“Quanto
àquele “filho” (Gil Rugai) que matou o pai e a madrasta, foi condenado com mais
de trinta anos de cadeia e saiu livre do Tribunal do Júri, vamos colocar os
pingos nos is. Ele saiu livre, afrontando o Tribunal do Júri e rindo
moralmente da sociedade, porque o juiz não quis prendê-lo. A condenação pelo
Tribunal do Júri constituía fato novo superveniente à liminar do STF. E
fato relevantíssimo, pois só é possível desconstituir a decisão dos jurados se
houve alguma nulidade, o que não foi alegado, ou se ela foi proferida
manifestamente contra a prova dos autos, o que é muito difícil acontecer”.
“Recorrer em liberdade de decisão do
Tribunal do Júri não é direito do réu, mas faculdade que o juiz, interpretando
a lei a favor do réu lhe confere. Fui juiz criminal e fiz dezenas e
dezenas de júris. Todos os réus condenados saíram presos e algemados. É
hora de a sociedade acordar para essas interpretações do Judiciário boazinhas
com a bandidagem.”
Com a exceção dos títulos dos dois
tópicos acima, os textos sobre o tratamento que a bandidagem deve ter por parte
do Poder Judiciário são de autoria do desembargador Irineu Mariani, do nosso
Tribunal de Justiça. Se o desembargador Mariani vivesse no século 18
estaria atuando na defesa do moleiro de Sans-Souci, na corte judicial de
Berlim.