Entre os efeitos maléficos da
corrupção para a economia nacional, os autores apontam a redução do
crescimento, a diminuição dos investimentos públicos e a gradativa deterioração
da infraestrutura
Por Augusto
Nunes, 13/08/2016,
www.veja.com.br
Editorial do Estadão
Práticas irregulares na gestão do dinheiro público
disseminaram-se pelo País, como mostra o fato de que houve alguma forma de
corrupção em pelo menos 15,65% das ações de responsabilidade das prefeituras
bancadas com recursos da União. A constatação foi feita por uma pesquisa
baseada em auditorias realizadas pela antiga Controladoria-Geral da União
(CGU), hoje Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle. Dada a grande
dificuldade na identificação e caracterização dos atos de corrupção, pois eles
são praticados de maneira dissimulada e de modo a não deixar vestígios, não
parece exagerado supor que deve ser ainda maior o índice de ilegalidades
cometidas com o dinheiro que a União transfere para os municípios, por
imposição legal ou por decisões político-administrativas.
A pesquisa teve como fonte as auditorias realizadas
pela CGU entre 2006 e 2010 em 840 municípios. Não parece coincidência que os
atos ilegais detectados tenham ocorrido no período que começa pouco depois de
vir à tona o escândalo do mensalão e abrange aquele em que, como vem mostrando
a Operação Lava Jato, o governo do PT coordenou um imenso esquema de assalto à
Petrobrás. Os exemplos criminosos vinham
de cima.
É imenso o custo social dessa prática, que se
tornou endêmica no País, como mostra a pesquisa, cujas conclusões foram
divulgadas pelo Broadcast, serviço de informação em tempo real da Agência
Estado. Os pesquisadores Olavo Venturim Caldas, da Secretaria de Transparência
e Prevenção da Corrupção da CGU; Cristiano Machado Costa, da Unisinos (RS); e
Marcelo Sanches Pagliarussi, da Faculdade de Economia e Administração da USP de
Ribeirão Preto, responsáveis pela pesquisa, concluíram que a corrupção nos
municípios se concentra nas áreas de saúde (houve irregularidades em 19% das
ordens de serviços analisadas) e educação (17,5%). Ilegalidades foram
identificadas também em 1,25% das ações da área de assistência social e em
6,56% das demais.
Entre os efeitos maléficos da corrupção para a
economia nacional, os autores apontam a redução do crescimento, a diminuição
dos investimentos públicos e, em conseqüência, a gradativa deterioração da
infraestrutura. Para a população, a corrupção tem efeitos que, embora não tão
notáveis, podem ser mais perniciosos e duradouros, como a perda da qualidade do
ensino e dos serviços de saúde oferecidos à população.
Em balanço divulgado no início do ano, a CGU
mostrou que, desde 2003, irregularidades constatadas em 199 dos 2,7 mil
municípios fiscalizados resultaram no desvio de R$ 2 bilhões destinados à
merenda e ao transporte escolar por meio de programas federais. Há relação
estreita entre a má gestão pública e o desempenho dos estudantes. Nos
municípios onde a corrupção é mais intensa o desempenho é pior.
A corrupção tem outro aspecto particularmente
nocivo, pois ela prejudica mais os mais carentes. “Nos municípios com maior
incidência de corrupção as escolas têm infraestrutura pior, os professores
recebem menos treinamento e relatam maior preocupação com a falta de recursos”,
diz o estudo.
“Infelizmente há um ciclo viciado que impede que o
povo seja mais educado e tenha mais poder de fiscalizar”, observa Olavo Caldas,
um dos autores do trabalho. No atual ambiente institucional, diz ele, as
políticas sociais não alcançam plenamente seus objetivos, “pois o dinheiro para
essas áreas é desviado”.
Além do controle falho, também normas legais
favorecem o desvio dos recursos que as prefeituras destinam para a área social.
Uma delas é a que obriga as prefeituras a aplicarem pelo menos 25% da receita
na área de educação e 15% em saúde – ou seja, 40% da receita têm destino certo.
“A obrigatoriedade de alcançar o mínimo exigido pela legislação freqüentemente
resulta em gastos não prioritários, gerando incentivos para que os agentes se
engajem em atividades consideradas corrupção”, afirmam os autores do estudo. Em
outras palavras, a vinculação das receitas, como é conhecida a obrigatoriedade
de aplicação do dinheiro em determinados setores, alimenta a ineficiência e a
corrupção.
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