Não é
possível construir uma democracia moderna com a permanência de odiosos
privilégios que desfiguram o espírito republicano
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A 29 de outubro de 1945
Getúlio Vargas foi derrubado por um golpe militar. A história registra esse
momento como o término do Estado Novo, ditadura implantada em 10 de novembro de
1937. Com forte influência do fascismo italiano, o regime varguista vinha paulatinamente
lançado os fundamentos do corporativismo, como durante a eleição para a Assembléia Constituinte, em 1933: dos 254 constituintes, 214 foram
eleitos diretamente e 40 foram indicados: 20 pelos sindicatos e 20 por
entidades empresariais. Mas foi a partir de 1937 – e com a Constituição
“Polaca” — que o corporativismo se consolidou como política de Estado.
Numa sociedade
invertebrada, como a brasileira, o corporativismo acabou obtendo legitimidade.
Pressionado por um Estado todo poderoso, o indivíduo não tem mecanismos de
proteção e de identidade. Como não encontra instituições sólidas, tem de buscar
uma corporação. Nela encontra abrigo. Obtém garantias. Sente-se seguro. Passa a
comungar do credo da “sua” corporação. Sabe que ela é a sua única defesa.
As corporações, ao longo
das décadas, conquistaram enorme espaço na estrutura do Estado, chegando a ter
até presença na Constituição, como na de 1988, o que é um despautério. As
corporações mais poderosas foram consolidando privilégios – mais do que direitos.
Foi sendo ampliando o fosso
entre os setores corporativos e o conjunto da sociedade – daqueles que não
conseguiram se organizar e ter presença na estrutura de Estado.
E foi se formando uma
sociedade de castas à brasileira.
A permanência das
corporações e de seus privilégios é um impedimento ao pleno funcionamento do
Estado democrático de Direito. Há uma contradição entre as novas instituições
criadas pela Constituição de 1988 e as velhas práticas corporativas. E mais
ainda: com os desafios de uma sociedade complexa, como a brasileira.
A dissociação entre o
passado e o presente reforça a necessidade de eliminar o corporativismo. Não é
possível construir uma democracia moderna com a permanência de odiosos
privilégios que desfiguram o espírito republicano. Não podemos dar longa – e
eterna – vida ao Estado Novo. Como se o 29 de outubro de 1945 não tivesse
existido. Para que a Constituição cidadã floresça – e dê frutos – é condição
indispensável enterrar a sete palmos a “Polaca.”
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