Nenhuma autoridade do Judiciário
que se deparasse com esses cabeludos indícios de trambiques poderia deixar de
tomar as providências que a PF e a equipe da Lava Jato tomaram
Por Augusto
Nunes, 10/08/2016,
www.veja.com.br
Editorial do Estadão
A estratégia ficou clara diante da reação da defesa
de Lula à intimação de sua mulher, Marisa Letícia, e de um de seus filhos,
Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha. A notificação foi determinada pelo
delegado da Polícia Federal Márcio Anselmo, que integra a força-tarefa da Lava
Jato e quer ouvir esclarecimentos sobre um sítio em Atibaia que Lula jura não
lhe pertencer, mas que era freqüentado como se fosse seu e de sua família.
Uma reforma feita no sítio em 2014 teria sido paga
pela empreiteira OAS, envolvida na Lava Jato. Os investigadores informam que as
reformas começaram depois que o imóvel foi oficialmente comprado pelos
empresários Fernando Bittar e Jonas Suassuna, que seriam testas de ferro de
Lula e de Lulinha. Um laudo da PF aponta “evidências substanciais” de que a
reforma da cozinha do sítio – uma “cozinha gourmet”, como qualifica o
documento, avaliada em R$ 252 mil – foi “acompanhada por arquiteto da OAS, sob
o comando de Léo Pinheiro (dono da empreiteira) e, segundo consta nas
comunicações do arquiteto da construtora, com orientação do ex-presidente Lula
e sua esposa”.
O laudo apresenta ainda outros claros exemplos de
que aquela propriedade estava sendo reformada ao gosto da família Lula, sob a
liderança da “Dama”, apelido dado a Marisa Letícia pelos empreiteiros
encarregados do trabalho. Por essa razão, Marisa foi intimada a prestar
esclarecimentos.
Lulinha, por sua vez, foi chamado a depor porque há
dúvidas sobre sua evolução patrimonial e sobre sua relação com Fernando Bittar
e Jonas Suassuna, que são seus sócios em negócios que ninguém consegue explicar
direito quais são. A polícia quer saber, por exemplo, se Lulinha paga aluguel
para morar num apartamento avaliado em R$ 6 milhões cuja propriedade é
oficialmente atribuída a Suassuna. Suassuna e Bittar também terão de prestar
esclarecimentos à polícia.
Nenhuma autoridade do Judiciário que se deparasse
com esses cabeludos indícios de trambiques poderia deixar de tomar as
providências que a PF e a equipe da Lava Jato tomaram. No entanto, para a defesa
de Lula, o trabalho de investigação, que inclui ouvir os familiares do chefão
petista, nada tem a ver com Justiça.
Seus advogados reagiram à intimação de Marisa e de
Lulinha afirmando que se trata de “mais uma tentativa da Lava Jato de produzir
manchetes contra Lula”. Segundo eles, tudo não passa de “retaliação” pelo fato
de Lula “ter exercido o seu legítimo direito de ir à ONU” – referência à
patética denúncia que o petista fez à Comissão de Direitos Humanos da ONU,
segundo a qual ele estaria sofrendo perseguição política e que “esses abusos
não podem ser satisfatoriamente corrigidos na legislação brasileira”.
Ou seja, para os advogados de Lula, todos os
policiais e procuradores empenhados em esclarecer as suspeitas sobre o
ex-presidente integram uma maligna conspirata contra o “lutador dos direitos
dos trabalhadores”, como ele é descrito na denúncia à comissão da ONU. Naquele
texto, Lula manda dizer que não tem a “pretensão de estar acima da lei”. Sendo
assim, que ele e sua família prestem todos os esclarecimentos que lhes forem
solicitados, como qualquer cidadão teria de fazer.
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