Por Augusto Nunes, 01/12/2015,
www.veja.com.br
Texto de Marco Antonio Villa publicado no Globo
Lembra o Conselheiro
Aires, célebre personagem de Machado de Assis, que o inesperado tem sempre voto
decisivo nos acontecimentos. O ano parecia caminhar para o encerramento. E em
tons inglórios. O enfrentamento da crise política estava sendo empurrado para
2016. Tudo indicava que o impasse — produto em grande parte da inoperância das
forças políticas de oposição ao projeto criminoso de poder — iria se prolongar,
até porque o calendário político do Congresso não é o mesmo que vigora para os
brasileiros comuns. Na Praça dos Três Poderes, 2015 termina por volta do dia 11
de dezembro, e o ano vindouro só começa depois do carnaval — e para alguns
somente em março.
Mas os
acontecimentos de 25 de novembro vieram para atrapalhar — ainda bem! No dia
anterior foi preso José Carlos Bumlai, considerado um dos melhores amigos de
Lula. Bumlai conseguiu empréstimos privilegiados do BNDES. Acabou falindo.
Contudo, a família está em excelentes condições financeiras. Um dos seus
filhos, segundo noticiou o Globo, é um rapaz de sorte. Tinha um
patrimônio avaliado em R$ 3,8 milhões em 2004. Seis anos depois, saltou para R$
95,3 milhões, um crescimento de 25 vezes, algo digno de um livro de como
prosperar rapidamente na vida. Mas o mais fantástico é que em 2012 o filho
prodígio mais que duplicou o patrimônio: R$ 273,8 milhões.
O amigão
de Lula vendeu uma de suas fazendas — a Cristo Redentor — para o banqueiro
André Esteves por R$ 195 milhões, valor considerado muito acima do preço de
mercado. O mesmo banqueiro, também no dia 25, foi preso, envolvido em
transações pouco republicanas. É um dos representantes de uma nova classe
criada pelo petismo: a burguesia do capital público.
Nesta
teia de relações foi incluído o senador Delcídio do Amaral, líder do governo no
Senado. O senador, além de vínculos com Estevão e Bumlai, nos últimos anos
esteve muito próximo de Lula. E todos eles estão relacionados com o petrolão,
alguns já presos; outros, ainda não. A camarilha tinha na Petrobras o
instrumento principal de saque. De acordo com perícia da Polícia Federal, o
desvio do petrolão foi de R$ 42 bilhões, algo desconhecido na história do
mundo.
Mesmo
assim, os cínicos que nos governam continuam agindo como se nada tivesse
acontecido — isso para não falar das obras da Copa, da Ferrovia Norte-Sul, da
Usina de Belo Monte e de Angra-3. E a conjunção da corrupção com a
irresponsável gestão econômica acabou jogando o país na crise mais grave da
história republicana. Teremos dois anos consecutivos de recessão — sem esquecer
que em 2014 o crescimento foi zero. E caminhamos para a depressão.
O
significado mais perverso do projeto criminoso de poder e da crise econômica é
a destruição dos projetos de vida de milhões de brasileiros. São projetos
acalentados anos e anos e que a discussão da macro política acaba deixando de
lado: os sonhos da casa própria, de obter um diploma universitário, de se
casar, entre tantos outros, que, subitamente são inviabilizados. E os maiores
atingidos são os mais pobres, que não têm condições de sequer vocalizar suas
queixas, seus protestos.
A
velocidade da crise não pode mais ser controlada. Quando o governo aparenta
viabilizar um acórdão negociado com o que há de pior na política brasileira,
vem a Operação Lava Jato para atrapalhar o negócio — pois não passa de um
negócio. A ação do juiz Sérgio Moro é histórica. Age dentro dos estritos termos
da lei e já obteve grandes vitórias. Até o momento, foram 75 condenações, 35
acordos de delações premiadas, 116 mandados de prisão e R$ 1,8 bilhão
recuperados. E a 21ª fase da Lava Jato acabou impedindo o acórdão. Não é que a
Justiça age na política. Não. É a política — entenda-se, os partidos e
parlamentares de oposição — que não consegue estar à altura do grave momento
histórico que vivemos. A oposição não faz a sua parte. Evita o confronto como
se a omissão na luta fosse uma qualidade. Se estivesse no Parlamento inglês, em
maio de 1940, defenderia negociar a paz com Adolf Hitler. O governo Dilma
caminha para o fim sem que a oposição seja o elemento determinante.
Há uma
fratura entre o povo brasileiro e a Praça dos Três Poderes. O poder é surdo aos
clamores populares. Não é hora de recesso parlamentar. Recesso para quê? Em
meio a esta crise? É justamente nesta hora em que o país precisa dos seus
representantes no Congresso Nacional. Também não cabe a quem é responsável no
STF pela Operação Lava Jato — ou ao conjunto da Segunda Turma — gozar as
intermináveis férias forenses. Há momentos na história de um país que férias ou
recesso não passam de subterfúgios para esconder o desinteresse pelos destinos
nacionais.
Só sairemos
da crise econômica quando resolvermos as crises ética e política. É uma tarefa
de sobrevivência nacional. Não é apenas um caso de corrupção de enormes
proporções. É mais, muito mais. O conjunto da estrutura de Estado está
carcomido pelo projeto criminoso de poder. A punição exemplar dos envolvidos no
petrolão abre caminho para enfrentar a corrupção em todos os setores do Estado
— pensando Estado no sentido mais amplo, incluindo o conjunto dos Três Poderes.
É indispensável retomar a
legitimidade. E só há legitimidade com o combate implacável à corrupção. A
impunidade está solapando as bases do Estado Democrático de Direito. A
democracia não é instrumento para roubar o Erário e os nossos sonhos. Pelo
contrário, é através dela que podemos exercer o controle efetivo da coisa
pública. É somente através da democracia que construiremos o Brasil que
sonhamos.
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