Por Augusto Nunes, 06/12/2015,
www.veja.com.br
Texto de Miguel Reale Júnior
publicado no Estadão
O Estado Democrático de Direito está gravemente ferido. É necessário
reconstruir a democracia, da qual um dos alicerces consiste na confiança da
população nos agentes políticos que elege. Hoje, justificadamente, essa
confiança inexiste no Brasil.
A democracia destaca-se por viver e conviver com as divergências, a
serem superadas pelo diálogo e pela persuasão para a formação de uma maioria
parlamentar legítima, respeitada pelas minorias. Todavia o confronto de idéias
e de perspectivas, próprio da democracia, desapareceu do cenário político,
substituído por entendimentos promovidos graças a arranjos financeiros com
dinheiro público subtraído de empresas como Petrobrás, Sete Brasil, BR
Distribuidora, Angra 3, Belo Monte.
Não se fez política, nem se praticou
a democracia. Apenas se transitou num bazar de venda de apoios por dinheiro
vivo ou graças à ocupação de cargos na administração, colocando apaniguados em
postos estratégicos para obtenção de vantagens ou para demonstração de
prestígio. Instalou-se a desabusada prática de exercer o poder para
institucionalizar a ação corrosiva da corrupção como normalidade. A democracia
foi corroída por dentro ao se obter uma maioria marrom, enlameada pela compra
de consciências e do convencimento.
O poder econômico privado aliou-se a
administradores públicos venais, abocanhando serviços superfaturados cujos
frutos reverteram em parte para deputados e senadores, bem como para seus
partidos, visando a assegurar ao Executivo uma maioria comprada. Os partidos da
base governista fizeram caixa para enfrentar, com muitos recursos, as futuras
eleições.
Formou-se um círculo pernicioso com o
dinheiro público desviado desde o mensalão e consolidado no petrolão, pois
esses numerários, em conluio com empresários, saíram dos cofres de órgãos do
Executivo, pela ação de diretores, indicados por líderes políticos, e foram
usados para manutenção de apoio parlamentar ao próprio Executivo.
Uma organização criminosa passou a
dominar o País e suas instituições políticas, levando ao cúmulo de se eliminar
a divisão de Poderes e o jogo de contrastes de perspectivas próprio da
democracia. Parlamentares e administradores uniram-se na festança da fruição do
dinheiro público desviado. A corrupção tornou-se o denominador comum por via do
qual se compuseram Executivo e Legislativo visando à apropriação de vantagens
indevidas de toda ordem.
Tão grave quanto era o liame tentado entre Presidência da República e
presidência da Câmara dos Deputados, com vista a um acordo espúrio para
garantia de mútua impunidade: o apoio de deputados do PT à absolvição do
presidente da Câmara em troca da rejeição liminar dos pedidos de impeachment.
Todavia, ao se recusar o PT a apoiá-lo, Eduardo Cunha acolheu o pedido de
impeachment, escrevendo certo por linhas tortas.
A defesa do Estado Democrático de Direito é dever do advogado, como
assinala o artigo 2o do novo Código de Ética. Hoje o mais frágil e mais urgente
cliente do advogado é o Estado de Democrático de Direito. A sua defesa incumbe
a todos nós advogados, bem como às nossas instituições.
Agora não se trata de lutar contra uma ditadura, nem de resistir às
afrontas às liberdades civis e políticas, mas, sim, em ir mais a fundo, pois os
alicerces, fincados pela Constituição de 1988, apodreceram. É preciso,
portanto, reconstruir suas bases. Não é só o governo que está em crise, é o
regime democrático que está. Como principais defensores do Estado Democrático
de Direito, aos advogados cumpre assumir a dianteira para salvar a democracia,
reestruturá-la, não só afirmando a necessidade de punição daqueles que a
destroem pelo mal da corrupção, observado o devido processo legal, mas
pugnando, mais do que já se fez, por medidas impeditivas da corrosão da
democracia.
Os advogados, valendo-se de sua história de lutas, devem exigir,
pressionar com força por mudanças de fundo urgentes, para tanto mobilizando
novamente a sociedade, já mobilizada pelos diversos movimentos contra a
corrupção que levaram milhões às ruas, agora tendo por pauta a reforma
estrutural do Estado. Não basta afastar Dilma. É preciso também preparar o
futuro.
É hora de nos engajarmos nessa luta pela democracia no Brasil, sem
meios-termos, sem receios, conclamando as demais entidades da sociedade civil
que congregam administradores de empresas, contadores, engenheiros, médicos,
auxiliares de saúde, arquitetos, promotores e juízes, trabalhadores da
indústria, comerciários, etc., bem como entidades do terceiro setor e os
inúmeros participantes dos movimentos construídos pelas redes sociais, para em
uma só voz exigir mudanças no sistema eleitoral, fonte de muitos males, e no
regime de governo, com a adoção, pelo menos, de presidencialismo
parlamentarizado, visando a facilitar a responsabilização dos governantes.
Cumpre, também, estabelecer eficaz e sério Programa de Integridade, com
inamovível e bem qualificado fiscalizador dos demais servidores em cada setor
da administração pública, bem como nos partidos políticos, a serem
responsabilizados pelos atos de seus membros. A eliminação de dois terços dos
cargos em confiança na administração direta e indireta, assim como a aplicação
de testes de honestidade e garantia de confidencialidade para informantes de
práticas de corrupção são outras propostas positivas.
Além do mais, é importante o fortalecimento dos Tribunais Regionais Eleitorais
e do Ministério Público Eleitoral, para fiscalizar a estrutura de campanha dos
candidatos e suas contas durante o processo eleitoral.<
Só assim se pode
refazer a confiança do povo no processo democrático. Dessa forma, cumpre aos
advogados tentar salvar, em conjunto com várias forças sociais, o seu cliente
preferencial, o combalido Estado Democrático de Direito. É a hora da sociedade
civil!
Comentários
Cristina
6/12/2015 às 16h01min
PARABÉNS PROFESSOR!!!!!!Como
uma ANTA daquele quilate tem condições para tentar divergir do professor (de
verdade) Miguel Reale????Aquela anta e a corja qual a cerca é um espanto!!Uma
horda de ignorantes, ladrões ou as 2 coisas juntas!!!TODOS PERNICIOSOS!!!!
Oliver
6/12/2015 às 15h09min
LIMPEZA PESADA
Quem sou eu – além de um
enxerido – para questionar as oportunas contribuições de um nobre jurista como
Miguel Reale Júnior? Também acho – e defendo aqui com unhas e dentes – que
nossa desgraça não finda em Dilma Rousseff e tirá-la de lá é só a ponta da
faxina. O que o nobre senhor aqui em moldura não nos fala – e entendo sua
omissão, uma vez que cabe a um advogado se ater aos fatos e não às versões – é
que trata-se de uma quadrilha bem fundamentada no poder. Parece um detalhe
irrelevante, mas não é. Já afirmei aqui mesmo que o crime é inerente à
sociedade, mas o crime organizado é um problema de governo, ou de ausência
dele, se preferirem. Note-se que a apodrecida Constituição de 88, apesar de
podre, nos deu os alicerces para nos livrarmos tanto dos Collores quanto dos
Lulas. E a sociedade já se organizou de forma suficiente para rechaçar ambas as
mentalidades, pútridas de nascença. Da direita à esquerda, ambos os extremos do
pêndulo da história já foram tentados por aqui como atalhos no caminho da
democracia plena e do capitalismo maduro. Ambos descambaram para a mais nojenta
roubalheira. O que se vê aqui é uma perversa conjunção de fatores – todos
visíveis para quem quiser enxergá-los – que ajuntam políticos de várias
vertentes, empresários grudados no governo, servidores públicos que a nada
servem e consciências compradas “da forma geral”, onde juristas, tribunos,
atores e jornalistas se misturam numa bela lama, seguindo o curso desta
catástrofe anunciada, entre tapas, beijos, sem lenço, documento ou vergonha na
cara. Evidente que já era para termos inclusive representantes políticos
defendendo uma devassa nas urnas e cercanias, uma vez que é deste instrumento
cooptado e manipulado que sai a nossa combalida representatividade torta. Da
Smartmatic à malemolência com que todos aqui permitiram campanhas milionárias
com dinheiro desviado, negociatas bem seladas, compadrios bem azeitados pela
máquina da roubalheira e da corrupção, tudo cheira a mais completa empulhação,
financiada com o nosso dinheiro. Não ver nossas oposições se insurgindo contra
isso – Marina, Aécio e FHC no bojo desse movimento pela transparência das
eleições – nos dá a exata medida de que tais insurgências inviabilizariam seus
interesses reais e imediatos, todos ancorados nessa esquerda velha e viciada na
droga do poder. De outras vozes e lugares devem brotar, portanto o grito dos
excluídos, meus caros. Somos muitos. Podemos exigir – ameaçar até – o sistema
atual para que se renda e saia com as mãos para cima. A casa caiu. Com ela essa
mentalidade bronca que não aceita ser fiscalizada, criticada, denunciada e
desmascarada sem fazer beicinho. Passou da hora de dizer a estes políticos
todos que eles NÃO NOS REPRESENTAM, e com todas as letras. Só assim, ameaçados
em seus feudos ideológicos marretas, veremos a política à serviço da sociedade
e não o contrário. Quero acreditar que todos estes nobres senhores, com as
penas das caudas chamuscadas, correrão a reformar e modernizar seus respectivos
discursos, sob pena de serem tragados – como já estão sendo – pelos anais da
história. É por lá que devemos trazê-los à realidade. Ou preferem pelas
orelhas, como fazia a minha avó?
Leonardo
X
6/12/2015 às 15h06min
Artigo que vale por um
manifesto para despertar a consciência dos brasileiros, espero, antes da 25ª
hora.
Texto escrito corretamente
para informar honestamente, por meio de uma análise lúcida da realidade
solertemente desfigurada pelos “formadores de opinião”, com sua lábia
“politicamente correta” a soldo da mentira oficial.
Que a hora da sociedade
civil – não a organizada e aparelhada pelo PT, PCdoB e quejandos, e dos
advogados conclamados pelo autor do texto, decerto, não aqueles que estudaram
Direito pelo Manifesto Comunista de Karl Marx, que o desqualificava como
“ciência dos burros” – seja esta em que o país experimenta os resultados de uma
crise que converge todas as outras, como as nuvens de um ciclone subtropical.
É bem provável que à hora e
a vez da luz da verdade, da fogem como o diabo, da cruz, aqueles que não
suportam ver a fealdade do seu negror devassado. E desmoralizada sua fábula
perversa que converte bandidos em “heróis do povo brasileiro”.
A democracia, a república, a
pátria que é um patrimônio comum herdado dos nossos antepassados – mas que as
“esquerdas progressistas” só conseguem ver como uma “dívida social histórica” –
carecem que homens como Miguel Reale Jr. assomem à tribuna da verdadeira
cidadania e façam coro aos poucos escritores e jornalistas, como o nosso
querido Augusto Nunes, que dignificam nossa cultura e honram suas profissões.
Que o nosso hino seja sempre
para louvar os raios fúlgidos de amor e esperança, não o da Internacional
Socialista, que incita ao ódio e justifica o crime.
Abração, meu velho amigo.
Marcio
6/12/2015 às 14h52min
“Não é só o governo que está
em crise, é o regime democrático que está. Como principais defensores do Estado
Democrático de Direito, aos advogados cumpre assumir a dianteira para salvar a
democracia” – Isso resume tudo: não se trata somente de apear Dilma e o PT do
poder, é preciso reestruturar tudo, restabelecer a ordem para que possamos
progredir
Junior
6/12/2015 às 14h38min
Todos aqueles que querem a
mudança, legitimamente, pois representa a vontade do povo, devem, como cidadãos
responsáveis, se apresentarem em todas as manifestações contra este Governo corrupto
e incompetente.
É nossa obrigação, sob pena
de assistirmos apenas as manifestações daqueles que recebem comida e dinheiro
para defenderem este Governo irresponsável.
Por um verdadeiro Estado
Democrático de Direito e contra esta “ditadura de esquerda” que tomou conta do
país.
Jonas
Mesquita
6/12/2015 às 14h27min
Concordo com o que foi
exposto. O sistema está podre. Os políticos não são confiáveis. Os governantes
faltam com a verdade. As Empresas são corruptoras. O suborno corre solto.
Loan
6/12/2015 às 14h24min
Vamos pra rua. Não podemos deixar a caravana passar.
Jonas
Mesquita
6/12/2015 às 14h18min
Concordo e aplaudo, de pé, as idéias do Dr. Miguel Reale
Junior
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