Por Reinaldo Azevedo, 18/09/2015,
www.veja.com.br
Ah, leitor! Ah, leitor! Você sabia que,
segundo o Supremo Tribunal Federal, a corte constitucional brasileira, estamos
sendo governados por uma presidente ilegítima, por 27 governadores ilegítimos e
por pelo menos 5.570 prefeitos igualmente ilegítimos? Além, é claro, da
ilegitimidade de 513 deputados, 81 senadores, e, por óbvio, prefeitos,
vereadores e deputados estaduais igualmente usurpadores? É, amiguinhos!!! Esse
é o resultado objetivo, inescapável, indeclinável de um julgamento conduzido
por nossa corte de notáveis, pela “crème de la crème” das lentes jurídicas
brasileiras.
Se os oito ministros do Supremo que
declararam ser inconstitucional o financiamento privado de campanha se levassem
a sério; se eles levassem o país a sério; se levassem o tribunal a sério,
teriam de declarar, que, por enquanto ao menos, somos governados por políticos
ilegítimos, o que ilegítima, ora vejam, todas as suas decisões. O país iria
para a breca, mas eles não passariam vergonha ao menos.
Estou sendo irônico? Não! Estou fazendo
o que fazem os americanos. Estou fazendo o que fazem os franceses. Estou
fazendo o que fazem os holandeses. Estou fazendo o que fazem os chilenos. Estou
fazendo o que fazem os… bolivianos. Estou levando ministros da corte
constitucional a sério. Ou será que faço mal?
Os nobres doutores decidiram que o
financiamento de campanhas eleitorais por empresas é ilegal. Assim, é ilegal —
e qualquer primeiro-anista de direito sabe disso — tudo aquilo que decorre da
ilegalidade primitiva. “Pô, Reinaldo, mas não existe uma lei para esses casos?”
Ah, amiguinhos, existe: é a 9.868, de 10 de novembro
de 1999. No seu Artigo 27, ela estabelece:
“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.”
“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.”
Entenderam? Isso é o que se chama
“modular uma decisão”. Para que uma decisão seja modulada, é preciso contar com
o voto de pelo menos oito ministros. O tribunal conta com 11. Joaquim Barbosa —
que não integra mais a corte e já votou — e Marco Aurélio Mello já se disseram
contra a modulação.
Barbosa não está mais na corte, certo?
Sobram dez ministros. Marco Aurélio já se declarou contrário. Restaram nove. Se
os três que se opuseram à absurda proibição (e bastariam dois deles) se negarem
a fazer a modulação, o STF estará declarando ilegais os mandatos de Dilma, dos
27 governadores, dos 5.570 prefeitos, dos 513 deputados, dos 81 senadores, de
quase 60 mil vereadores e de todos os deputados estaduais.
Eis o fruto da sabedoria da OAB e dos
ministros que tomaram tão sábia decisão. Por incrível que pareça, restou na
conta justamente dos magistrados que entendem que a doação de empresas não é
inconstitucional a tarefa de não jogar o país num buraco jurídico. Atenção! Dos
oito ministros que tomaram a decisão estúpida, restam sete na corte. Um — Marco
Aurélio — já disse que não modula. Assim, seis poderiam fazê-lo. Não satisfaz a
exigência legal. São necessários dois daqueles três votos que disseram “não” à
OAB.
É nessa hora que eu, Reinaldão, não
serviria para a tarefa. Nessa hora, eu jogaria Mateus no colo de quem o pariu.
“Ah, é? Vocês querem brincar com o perigo e depois jogam a conta de sua
irresponsabilidade nas costas alheias?”
Em que corte do mundo oito ministros de
um grupo de 11 tomariam uma decisão que, se levada a sério, conduz o país a uma
crise sem precedentes?
Há gente querendo cassar Dilma? Nem
precisa! O STF já cassou. E, com ela, mandou para o buraco o mandato de 27
governadores, de 513 deputados, de 81 senadores, de 5.570 prefeitos, de quase
60 mil vereadores e de todos os deputados estaduais.
Nessas horas, eu realmente sinto
vergonha de também ser bípede e não ter nem penas nem bico.
Borat não foi capaz de imaginar como
seria a corte do Findomundistão!
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