Novas delações premiadas
complicarão o cenário. Prováveis acusados buscam mecanismos para garantir o
foro privilegiado
Por Marco Antonio Villa, 11/08/2015,
www.oglobo.com.br
O projeto criminoso de poder está com os dias
contados. Deixa como legado escândalos e mais escândalos de corrupção, uma
estrutura de Estado minada pela presença de milhares de
funcionários-militantes, obras superfaturadas (e inacabadas) e um país
paralisado. Sem esquecer que produziram a mais grave crise econômica do último
quarto de século.
Ao longo de 12 anos, conseguiram organizar um
aparato de proteção nunca visto na nossa história. Quiseram transformar as mais
altas Cortes de justiça em braços do partido. Os meios de comunicação de massa
foram sufocados pela propaganda oficial. Os bancos e as empresas estatais foram
convertidos em correias de transmissão dos marginas do poder, como bem definiu,
em um dos votos da Ação Penal 470, o ministro Celso de Mello. Não houve nenhum
setor da sociedade sem que a presença do projeto criminoso de poder estivesse
presente. Pelo medo, poder e omissão de muitos (empresários, jornalistas,
políticos, intelectuais, entre outros), conseguiram impor a ferro e fogo sua
política.
Deve ser recordado que, ao terminar seu segundo
mandato, Lula era avaliado positivamente pela ampla maioria dos brasileiros.
Diziam que seria candidato a secretário-geral da ONU ou a presidência do Banco
Mundial. Tudo graças a sua sensibilidade social, aos êxitos econômicos e à
preocupação com os mais pobres. Hoje, sabemos que no mesmo período o petrolão
alcançou seu ápice e bilhões de reais foram roubados do Tesouro, no maior
desvio de recursos públicos da história da humanidade. Os que denunciavam a
pilhagem do Estado eram considerados enragés. Não foi nada fácil remar
contra a corrente e enfrentar a violência governamental e de seus asseclas.
Como em outros momentos da nossa história, já está chegando o dia de o passado
ser reescrito. Muitos dos que se locupletaram vão se travestir em adversários
ferrenhos do lulismo. Haja hipocrisia.
Vivemos a crise mais profunda dos últimos 60 anos.
Em 1954, tudo acabou sendo resolvido em menos de três semanas, entre o atentado
da Rua Tonelero (5 de agosto) e o suicídio de Getúlio Vargas (24 de agosto). No
ano seguinte, em novembro, o país teve três presidentes, mas a crise foi logo
solucionada. Em 1961, a renúncia de Jânio Quadros — que quase arrastou o Brasil
a uma guerra civil — foi solucionada em duas semanas, com a posse de João
Goulart, a 7 de setembro. Três anos depois, o mesmo se repetiu, e a 11 de
abril, com a eleição de Castelo Branco pelo Congresso Nacional, foi resolvido o
impasse político. Em 1992, o momento de crise mais profunda ficou restrito há
três meses, entre julho a setembro, quando a Câmara autorizou a abertura do
processo de impeachment do presidente Fernando Collor.
A crise atual é mais complexa — e mais longa. No
tempo poderia ter uma data: a vitória de Eduardo Cunha, a 1º de fevereiro. A
candidatura Arlindo Chinaglia empurrou Cunha para os braços da oposição — até
então muito fragilizada, mesmo após o excelente resultado obtido no segundo
turno por Aécio Neves. As revelações diárias sobre a extensão do petrolão ampliaram
a crise, pois estabeleceu conexão entre o escândalo, às lideranças históricas
do partido e o financiamento eleitoral, inclusive da campanha presidencial de
2014, em que propina virou doação legal.
As novas delações premiadas vão complicar ainda mais
o cenário. Prováveis acusados estão, preventivamente, buscando mecanismos para
garantir o foro privilegiado, temendo serem presos. E a instalação das CPIs do
BNDES e dos fundos de pensão vai ter de devassar as relações do projeto
criminoso de poder com a burguesia petista, aquela do capital alheio, do nosso
capital, entenda-se.
O aprofundamento da crise econômica — com dados que
tinha sido escondidos pelo governo, especialmente durante a última campanha
eleitoral — a divisão da base política congressual — inclusive de partidos que
tem presença no governo, como a PDT e PTB —, as sucessivas derrotas em votações
no Congresso relacionadas ao ajuste fiscal, à impopularidade recorde de Dilma,
o desespero do PT, e o esfacelamento da liderança de Lula sinalizam claramente
que não há mais governo. O que é bom e ruim. Ruim, pois este projeto de poder
fará de tudo para permanecer saqueando o Estado; bom, porque os brasileiros
romperam o feitiço de mais de uma década e, finalmente, entenderam o mal
representado pelo lulismo.
Na última quinta-feira, era esperado que o PT
reconhecesse os erros e apontasse para alguma proposta de negociação, de
diálogo com a oposição. E mais, que buscasse apoio dos 71% de brasileiros que
consideram o governo ruim ou péssimo. Não o fez. Satanizou a oposição. Associou
1964 a 2015. Tachou a oposição de golpista. Ironizou os protestos. Conservou a
política do conflito, do nós contra eles. Isso quando estão isolados e sem
nenhuma perspectiva, mesmo a curto prazo, de que poderão reconstruir sua base
política.
A gravidade do momento e o autismo governamental
obrigaram as oposições a se mexer. A necessidade de encontrar uma rápida saída
constitucional para a crise é evidente. A sociedade civil pressiona. As
manifestações do próximo dia 16 vão elevar a temperatura política. Quanto mais
tempo permanecer o impasse, pior para o Brasil. Se 2015 já está perdido,
corremos o sério risco de perdermos 2016 e 2017.
É inegável que Lula e o PT já estão de mudança para
o museu da história brasileira. Mais precisamente para a ala dos horrores — que
é vasta. Será necessário reservar um espaço considerável. Afinal, nunca na
nossa história um projeto político foi tão nefasto como o do lulismo.
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