Direto ao
ponto por Augusto Nunes, 08/09/2014,
www.veja.com.br.
“A Petrobras já está
privatizada”, informa o título do post publicado em 10 de junho de 2010.
Aparecem no texto, inspirado no surto de chiliques provocado pela criação de
uma CPI incumbida de investigar a estatal, personagens que acabam de sair da
caixa preta em poder do ex-diretor Paulo Roberto Costa. Confira:
O presidente Lula ficou muito
irritado com a instauração da CPI da Petrobras. Depois de ter feito o possível
para interromper a gestação, agora faz o possível para matá-la no berço. Baseado
no critério do prontuário entregou a Renan Calheiros o comando do grupo de
extermínio montado para o justiçamento. O senador do PMDB alagoano, diplomado
com louvor na escolinha que ensina a delinquir impunemente, é especialista no
assassinato de qualquer coisa que ponha em risco o direito conferido aos
congressistas leais ao Planalto de roubar sem sobressaltos.
O presidente da Petrobrás, Sérgio
Gabrielli, ficou muito irritado com a instauração da CPI da Petrobras.
Caprichando no palavrório que identifica os nacionalistas de galinheiro,
qualificou de “inimigos da pátria” os partidários da devassa na empresa ─ o que
promove automaticamente os defensores da nação em perigo os que tentam manter
fechada a caixa preta. Gente como Renan Calheiros. Ou Ideli Salvatti. Ou
Fernando Collor. Ou Romero Jucá, em aquecimento para encarnar o papel de
relator que impede a coleta de relatos relevantes.
O ministro de Minas e Energia, Edison
Lobão, ficou muito irritado com a instauração da CPI da Petrobras. Governista
seja qual for o governo, o agregado da Famiglia Sarney conhecido na Polícia
Federal pela alcunha de Magro Velho alegou que iluminar os porões de uma
empresa que é a cara do Brasil Maravilha espanta clientes, fornecedores e
possíveis parceiros. Se conhecessem a folha corrida de Lobão, todos os
clientes, fornecedores e possíveis parceiros já teriam saído em desabalada
carreira das cercanias da Petrobrás e do gabinete do ministério.
Os modernos pelegos ficaram muito
irritados com a instauração da CPI da Petrobras. Jovens velhacos da UNE
berraram que o petróleo é nosso para plateias insuficientes para eleger um
vereador de grotão. Velhos velhacos da CUT garantiram que CPI gera desemprego
para gente mais interessada no kit dupla sertaneja+pão com mortadela+tubaína.
Vigaristas do PT, do PP e do PMDB lembraram aos sussurros que o petróleo é
nosso, mas a eles compete a escolha dos diretores incumbidos de cuidar dos
interesses dos padrinhos, do partido e do país, nessa ordem.
Tudo somado, e embora a CPI nem tenha
ainda saído do papel, ficou mais difícil acusar os partidos de oposição, a
elite golpista, os paulistas quatrocentões, os capitalistas selvagens e os
loiros de olhos azuis de tramarem nas sombras a privatização da Petrobrás. A
empresa já foi privatizada ─ sem licitação. O novo dono é o PT, que arrendou
parte do latifúndio à base alugada.
Em 29 de outubro de 2009, os representantes da oposição abandonaram
a CPI. “Todos os requerimentos importantes são arquivados sem discussão pela
maioria governista”, disse o senador Álvaro Dias, que propusera a instauração
da comissão. Em 17 de dezembro, ao fim de 14 sessões reduzidas a shows de
cinismo, foi aprovado o papelório de 359 páginas “destinado a contribuir
com a Petrobras e com o Brasil”. O relator Jucá concluiu que todos os culpados
eram inocentes, não enxergou nenhuma irregularidade na compra de plataformas e
viu apenas maledicências nas denúncias de superfaturamento na construção da
refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.
Jucá, Lobão, Renan, chefões do PP, cardeais do PMDB, Altos Companheiros
do PT ─ um a um, os saqueadores da Petrobras, abraçados aos comparsas que
ampliaram a quadrilha nos últimos anos, vão sendo expelidos do baú de
bandalheiras aberto por Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento e
Refino. Foi para seguir embolsando sem sobressaltos propinas bilionárias que os
assassinos de CPIs escavaram em 2009 a cova rasa prestes a acolher outras duas
comissões que agonizam no Congresso. O enterro de CPIs não impediu a exumação
das verdades que têm assombrado desde sábado o Brasil que presta.
Para resgatar os fatos, foi suficiente que uma oportuníssima conjunção
dos astros juntasse agentes da Polícia Federal, procuradores de Justiça e um
magistrado desprovidos do sentimento do medo. O acordo de delação premiada foi
consequência do trabalho exemplar dos que investigaram, da altivez dos que
acusaram e, sobretudo, da coragem do juiz federal Sergio Moro, que tornou a
prender o ex-diretor da Petrobras inexplicavelmente libertado pelo ministro
Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal. (O acordo que abriu o bico de
Paulo Roberto Costa, aliás, precisa ser validado por Zavascki. É hora de
mostrar que não perdeu inteiramente o juízo).
Os brasileiros honestos descobriram que a praga da corrupção impune pode
ser erradicada sem a ajuda de parlamentares e ministros togados. Basta que não
atrapalhem.
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