Por Juremir Machado da Silva, 05/09/2013,
www.correiodopovo.com.br.
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homem coerente precisa parecer incoerente aos olhos dos dogmáticos. Só os
néscios mostram-se sem brechas nem sinuosidades. Um humanista não conservador
coerente, de 1989 para cá, votou por Brizola ou Lula na primeira eleição
pós-ditadura, aplaudiu a queda do Muro de Berlim e o fim do socialismo real do
Leste europeu, apoiou a abertura do Brasil aos mercados internacionais
defendida pelo presidente alagoano, vibrou com o fim do nacionalismo retrógrado
em matéria de informática, aderiu à luta pelo impeachment de Collor, saudou, na
contramão do petismo, o Plano Real e a estabilização da economia, defendeu
privatizações, por exemplo, na telefonia, e atacou o que Elio Gaspari chama de
“privataria”, uma ideologia do desmonte do Estado feita com dinheiro público,
pouca transparência e excesso de certezas.
Um
homem coerente recusa o Estado máximo e o Estado mínimo, investe contra o
neoliberalismo, contra as utopias de esquerda autoritárias e busca criticar a
esquerda sem cair no direitismo nem se refugiar na pasmaceira centrista dos
muros. Defende o liberalismo em se tratando de liberdade de expressão, mas
compreende a necessidade de democratização da mídia e de ampliação da
democracia formal para uma democracia mais participativa. Se precisar, defende
estrategicamente o neoliberalismo contra o stalinismo e, sempre, ataca o
stalinismo em nome da liberdade. Eu, que considero a coerência absoluta burra e
inumana, tenho buscado o máximo de coerência humana e inteligente na minha
vida: ataquei o petismo stalinista e o lullismo mensaleiro. Mas não deixo de
denunciar tentativas ideológicas da direita de transformar o PT no inventor da
corrupção no Brasil.
Nunca
fui de direita. Não sou de esquerda> Nem de centro. Nunca tive partido. Essa
liberdade me permite valorizar e criticar políticas de qualquer partido. Mas
recuso e sempre recusei o conservadorismo defensor da desigualdade como um
sistema de hierarquia social. O Brasil
de FHC deu-nos o decisivo Plano Real. Lula e Dilma, com as políticas sociais,
algumas continuando ou ampliando políticas do governo anterior, fizeram o país
dar mais um passo à frente. Cotas, ProUni e Bolsa Família, com problemas e
contradições, são grandes acertos. Só os cegos ideológicos não admitem isso. Um
humanista não conservador só pode apoiar a Comissão da Verdade e rejeitar a
tese dos “dois lados”, pois um lado, o do que resistiram à ditadura, foi
investigado, processado e julgado pelo Superior Tribunal Militar.
Um
homem coerente precisa andar meio de lado. Só não aparentam contradições os que
se comportam ideologicamente como monoblocos. A ilusão do ideologismo de
esquerda é imaginar que pode ver a ideologia adversária de um ponto fora do
sistema. A falácia do ideologismo de direita é pensar que ideologia é uma
irrealidade de esquerda. Eu, que jamais fui de direita, nunca me constrangi em
apoiar posturas abertas e emancipadoras de direitistas. Parte da melhor crítica
ao petismo, porém, hoje é feita pelo PSol. Um homem coerente não teme patrulhas
ideológicas, mantém sua alma livre, expõe-se e faz da vida um combate à cegueira
mesquinha.
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