A PEC 55 segue a lei de
responsabilidade fiscal, um instrumento do qual o Brasil riu – mas engoliu
Por
Guilherme Fiuza, 24/12/2016,
www.época.com.br
A PEC do teto foi aprovada. Não vamos cansar a
beleza do leitor explicando pela enésima vez a importância dela. Vamos apenas
nos concentrar numa notícia: a ONU condenou a PEC.
Eis aí uma notícia realmente relevante. Não que
alguém tenha revogado, do dia para a noite, a irrelevância da ONU. O importante
é que o distinto público não se perca no andamento do espetáculo, sem se
confundir com os atores e seus respectivos papéis. E que possa, assim, ver
teatro só quando vai ao teatro.
A PEC do teto dos gastos públicos segue exatamente
os princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal – um instrumento apresentado ao
Brasil quase 20 anos atrás e do qual o Brasil riu. Riu, mas engoliu. O
mecanismo de combate à orgia dos governantes com seus orçamentos foi
inicialmente desacreditado, enquanto ainda era um projeto, porque ninguém por
aqui acreditava – nem os bem-intencionados – que se poderia proibir um
governante de gastar mais do que arrecadou. No país da malandragem e do calote,
jamais vingaria uma coisa dessas.
Mas vingou – por uma razão singela: os brasileiros
estavam sob os primeiros efeitos do Plano Real, uma cirurgia de medula que
instituíra uma moeda nova e confiável. O país estava entendendo que tinha pela
primeira vez nas mãos um dinheiro não avacalhado – e que isso decorria de um
controle sem precedentes das contas públicas. Foi sob essa cultura, sob esse
estado de quase comoção geral, que a Lei de Responsabilidade Fiscal passou.
Mas os ratos estão aí mesmo para roer. E o PT
conseguiu, trabalhando duro na complexa engenharia da contabilidade criativa,
das pedaladas fiscais e outros contrabandos revolucionários, torpedear a Lei.
Claro que o exemplo pedagógico do governo federal foi regiamente seguido pelo
país afora – até o dia em que a presidente da República foi deposta por causa
disso. Vamos repetir, porque o teatro está barulhento: Dilma caiu por causa da
Lei de Responsabilidade Fiscal.
Não que o governo da mulher honrada, afilhada da
alma mais honesta do planeta, precisasse disso. Eles tinham as obras completas
da Lava Jato para colocá-los na rua. Mas o gigante estava dormindo, e o
processo de impeachment acabou dependendo da boa vontade de Eduardo Cunha –
personagem que dispensa apresentações. Cunha achou melhor não fazer onda no mar
de lama da Petrobras e fez uma leitura seletiva do pedido assinado por Hélio
Bicudo, Miguel Reale e Janaina Paschoal.
Foi assim que os delitos fiscais do governo
companheiro entraram para a história – muito embora, sabemos agora, isso não
comova a ONU.
Segundo o relator especial das Nações Unidas para a
extrema pobreza e os direitos humanos, Philip Alson, a PEC do teto vai elevar
“os níveis de desigualdade em uma sociedade já extremamente desigual”. Quando o
PT estava no poder estuprando as contas públicas e produzindo a maior recessão
da história recente do país, aviltando e empobrecendo democraticamente a
sociedade inteira, não se teve notícia de algum comunicado sombrio do senhor
Alson.
A relatora especial sobre direito à educação da
ONU, Kombou Boly Barry, endossou o alerta de que a PEC ameaça o direito das
crianças brasileiras de ir à escola. Barra pesada.
Essa senha do Apocalipse foi divulgada pela
Organização das Nações Unidas três dias antes da votação da PEC no Senado.
Confirmando o que você já tinha entendido: a mítica e imaculada ONU estão
fazendo política. Rasteira. Vamos explicar que política é essa: com os
guerreiros da narrativa progressista todos no xadrez ou a caminho dele, a
indústria da bondade humanitária foi à luta por novos símbolos – e descobriu a
“PEC do fim do mundo”. Estudantes profissionais, militantes de aluguel e
burocratas da diplomacia coitada deram-se as mãos em torno dessa nova e bendita
assombração do capitalismo selvagem.
Você sabe que sua vida e a de seu país vão melhorar
se esses parasitas do Apocalipse não atrapalharem. No Plano Real foi
igualzinho. O PT e sua brigada panfletária internacional mandaram chumbo no
Plano e na Lei de Responsabilidade Fiscal, gritando que aquilo era um atentado
letal contra os pobres. Agora você já sabe, ou deveria saber; que essa turma
não defende os pobres – defende a pobreza. Vejamos até quando o Brasil vai
tolerar essa elite miserável.
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