Por Reinaldo
Azevedo, 20/01/2017,
Depois de alguma hesitação, o governo federal
parece ter-se dado conta do que está em curso no país. As rebeliões nos
presídios não constituem apenas uma ameaça à segurança pública - e isso já
seria grave o bastante. A questão é, sim, de segurança nacional. A barbárie
agride as instituições, os fundamentos do Estado democrático e um padrão mínimo
de civilidade do qual não podemos abrir mão. O que estamos dispostos a fazer em
nossa defesa?
O governo federal tem se comportado de modo
adequado nestes 20 dias da fase mais aguda da crise. A propósito: se alguém
esconde uma grande ideia que consiga conjugar mais eficiência com ainda mais
rapidez, que não se faça de rogado. Até porque o que se tem até agora é muito
pouco quando nos damos conta do atraso no setor. Os enfezados de hábito estão
certos na sua preguiça de pensar: nenhuma das medidas adotadas vai
"resolver" o problema. Então é preciso dizer o que resolveria.
O país em que presos são mortos e estripados por
seus pares assiste, algo inerme e conformado, a mais de 50 mil homicídios por
ano. O Brasil mata mais do que qualquer das guerras em curso no mundo. As
organizações criminosas que dominam as cadeias também tiranizam morros e periferias.
Chegaram ainda mais longe. Nas eleições de 2016, à
sombra de togados do STF - que proibiram a doação de empresas a campanhas
eleitorais-, as organizações criminosas elegeram prefeitos e vereadores nas
vastas solidões morais de Banânia. E não estou aqui a falar apenas dos grotões.
Setores do Judiciário, e o noticiário está à disposição, já foram expostos ao
mal.
Os Estados, com uma exceção aqui e outra ali, falharam miseravelmente na tarefa de garantir a segurança pública. A omissão da União, nessa matéria, é histórica. E, em seus atos iniciais, o presidente Temer parece disposto a romper o padrão. Tomara que seja verdade. E que não lhe falte ousadia.
Considerados os mandados de prisão por cumprir, o déficit
prisional do Brasil se aproxima de 700 mil vagas. Sem eles, de 300 mil. No
primeiro caso, a conta fica em torno de R$ 45 bilhões; no segundo, de R$ 18
bilhões. Refiro-me ao custo da construção de presídios. Depois será preciso
inserir a sua gestão nos gastos correntes. Esse dinheiro não existe.
A esquerda estúpida tem uma resposta para a crise:
"Abram-se as portas das cadeias; o Brasil prende demais!". A direita
estúpida tem uma resposta para a crise: "Os presos que se matem; não é
problema nosso!". Jamais ocorrerá à esquerda estúpida que o país dos 50
mil homicídios prende é... De menos! Jamais ocorrerá à direita estúpida que a
guerra dentro dos presídios reflete a disputa das facções pelo mercado do crime
que está além daqueles muros.
O governo tem de conversar com a sociedade, por
intermédio dos seus representantes, para definir de onde sairão os recursos
bilionários que vão devolver os presídios à ordem legal. Um imposto? Uma
percentagem dos fundos públicos? A ver. Mais: é preciso criar uma autoridade federal
para cuidar do assunto, com um mandato conferido pelo Congresso Nacional.
Há dias me ocupo deste aspecto e o deixo registrado mais uma vez, agora na Folha: assim como temos uma lei, ainda que frouxa, contra o terrorismo, há de haver uma outra que puna, com especial rigor, o "crime de facção", do qual se ocuparia um juizado especial.
Os três Poderes da República, aviltados pela
ousadia dos criminosos, têm de dar uma resposta para preservar a democracia. E
tem de ser agora, não depois. O principal risco que corremos hoje é o
estabelecimento de uma "pax" com as facções. Que Temer não caia nessa
tentação.
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