Nunca houve prosperidade global
em ambiente de protecionismo. Muito menos quando combinado com disputas
geopolíticas
Por Augusto
Nunes, 02/02/2017,
www.veja.com.br
Texto de Carlos Alberto
Sardenberg publicado no Globo
Deixemos a política provisoriamente de lado e
olhemos os números da economia, aqui e lá fora. O resultado, já adiantando, é
claro: 2017 será melhor que o ano passado, isso querendo dizer mais crescimento
por toda parte, em ambiente equilibrado. Vale para o Brasil e para o mundo.
Os Estados Unidos terminaram o ano passado em
aceleração e devem seguir assim ao longo de 2017, com um PIB um ponto acima do
resultado de 2016. Pouco? Pois coloque 1% sobre uma economia de US$ 18,5
trilhões. Dá um bocado de produto.
Inglaterra ainda cresce mais de 2% anuais. Os
países do euro e até o Japão aceleraram no fim do ano passado. A China vai
garantindo a expansão dos seus 6,5%, e os emergentes em geral ganharam mais
condições com a alta e depois estabilização dos preços de commodities.
Tudo somado e subtraído, o PIB mundial pode crescer
3,5% neste ano, meio ponto acima de 2016.
E o Brasil? Também está melhor. Verdade que depois
de dois anos de recessão, com uma queda do produto acumulada de quase 9%,
qualquer coisinha já é melhor. De todo modo, há quase um consenso de que o país
volta a crescer, acelerando moderadamente no segundo semestre, podendo chegar
ao final de 2017 com uma expansão do PIB entre 0,5% e 1%. A inflação está
desabando, pode cair ainda mais, o que significa que os juros vão cair mais e
mais depressa — dos atuais 13% para 9,5% em dezembro.
Isso explica a melhora nos índices de confiança
medidos pela Fundação Getulio Vargas. Esses índices chegaram ao fundo do poço
durante o processo de impeachment, passaram a se recuperar com a troca de
governo, tiveram uma pequena queda em dezembro, recuperada agora em janeiro.
Com base em entrevistas, os índices procuram medir
a disposição das pessoas nos diversos setores da economia, consumo, indústria,
comércio, construção e serviços. E separam a percepção da situação atual das
expectativas.
Por exemplo: os consumidores brasileiros, em
janeiro, deram 68,1 pontos na avaliação da situação presente, mas 88,1 quando
perguntados sobre expectativas para os próximos meses. Esse padrão se repete
nos demais indicadores: a situação hoje não é lá essas coisas, mas deve
melhorar.
Resumindo: os dados econômicos, desemprego em alta,
especialmente, e renda em queda, jogam para o pessimismo. Inflação em queda,
custo de vida mais comportado, juros desabando jogam para uma expectativa
realista de saída da crise. Com a ajuda da economia global.
Certo?
Certo até que se introduz o fator político. Trump,
por exemplo, pode iniciar uma guerra comercial e cambial dentro do mundo
desenvolvido e com a China, o que comprometeria o comércio global e reduziria o
crescimento mundial. Sem contar os rolos que o presidente pode criar na
geopolítica, com ameaças à segurança internacional.
A Inglaterra, a rigor, ainda não iniciou o Brexit,
mas o processo terá efeitos contracionistas.
Há eleições na zona do euro neste ano — inclusive
nos três grandes, França, Alemanha, Itália — com chances de a direita
nacionalista e antiglobalização ganhar ou ao menos impor partes de sua agenda.
A registrar: nunca houve prosperidade global em
ambiente de protecionismo e guerras comerciais. Muito menos quando isso é
combinado com disputas geopolíticas.
E no Brasil, temos claro, os estragos da Lava Jato.
Quais efeitos negativos podem ocorrer para a economia?
O ponto principal está nas reformas —
previdenciária, trabalhista e tributária — sem as quais o Brasil não tem como
voltar a crescer de modo sustentado. As reformas dependem de ação política do
governo Temer e de suas bases no Congresso. Se a um dado momento, todos ou, vá
lá, muitos líderes estiverem mais preocupados em se livrar das delações da
Odebrecht, a tramitação das reformas fica prejudicada.
Por outro lado, a Lava Jato não tem dado trégua e,
mesmo assim, o governo conseguiu avançar com as reformas e outras medidas
pró-recuperação, como a nova Lei do Petróleo. É o que precisa manter, tocar as
reformas mesmo em meio às investigações. E dar ênfase a coisas que pode fazer
sem o Congresso, como acelerar as concessões de obras públicas, instrumento
poderoso para novos investimentos.
Convém ressaltar: o principal efeito econômico da
Lava Jato é positivo para o país. Trata-se de eliminar a corrupção que
compromete a produtividade da economia e desperdiça investimentos públicos e
privados.
Pode, porém, criar obstáculos no curto prazo, na
medida em que atinge políticos e empresários que estão operando a economia.
Paciência. Temos que passar por isso. O esforço deve ser o de manter o ritmo de
reformas mesmo no meio da confusão. O que pode ser feito, ou só pode ser feito
pelas lideranças que não estão na Lava Jato.
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