Por Augusto Nunes, 18/02/2016,
www.veja.com.br
Editorial do Estadão:
A tigrada petista deflagrou há alguns dias uma campanha para defender
seu timoneiro, Luiz Inácio Lula da Silva, sobre quem pairam suspeitas
espantosas para um homem que assegura ser o mais honesto do Brasil. O slogan da
campanha é “Lula, eu confio”, com o qual a militância pretende dizer que é
capaz até de pôr a mão no fogo pelo ex-presidente. Isso é que é coragem.
Afinal, não são poucas nem superficiais as evidências de que Lula anda
escondendo detalhes – pois, como se diz, o diabo está nos detalhes – de suas
relações com os maiores empreiteiros do Brasil.
Mas a militância pode ser irracional. E, nesse caso, não se pode esperar
dela nenhuma consideração pelos fatos, caso estes contrariem suas certezas, nem
pelas instituições, se estas insistirem em investigar seus líderes. Que essa
turma acredite, portanto, que Lula seja vítima de injustiça, como resultado da
mancomunação de “setores” do Judiciário, da Polícia Federal e da imprensa, é
perfeitamente compreensível. O que não é compreensível – nem tolerável – é que
a presidente da República, Dilma Rousseff, tenha despido a indumentária
institucional, que exige respeito aos demais Poderes, e vestido a fantasia da
militante, para dizer que Lula é “objeto de grande injustiça”.
Ora, quem Dilma julga ser para antecipar-se às investigações a respeito
de Lula – e a um eventual julgamento do ex-presidente pela corte apropriada – e
declarar que o líder petista está sendo injustiçado? De que informação Dilma
dispõe para sugerir que o trabalho das autoridades judiciárias sobre seu
padrinho já produziu “grande injustiça”, nesta etapa em que apenas indícios
estão sendo colhidos e nenhuma acusação formal foi feita? Que dirá Dilma,
então, se e quando Lula for formalmente acusado? Cometerá a imprudência de
declarar que se trata de um processo “político”, tal como os petistas
qualificaram o julgamento da quadrilha do mensalão?
Quando se elegeu presidente, Dilma jurou respeitar e fazer respeitar a
Constituição, e nela está expressamente escrito que ninguém está acima da lei.
Pois os petistas, Dilma à frente, parecem considerar que Lula está tão acima da
lei que nem sequer deve ser investigado, seja lá por que motivo for, porque,
afinal, conforme as palavras da presidente, “o país, a América Latina e o mundo
precisam de uma liderança com as características do presidente Lula”.
Dilma se pronunciou dessa forma, deixando de lado a cautela que seu
cargo exige, depois de ter sido cobrada por Lula, que esperava ser defendido
pela sua criatura de um modo mais enfático. Ordem dada, ordem cumprida. A
presidente poderia ter dito simplesmente que, assim como o resto do país,
espera que tudo se esclareça no prazo mais breve possível. Essa teria sido a
atitude correta. Mas Dilma preferiu o caminho da ilação irresponsável para
defender seu guia.
Provavelmente por determinação de Dilma, o ministro da Justiça, José
Eduardo Martins Cardozo, foi na mesma linha inconseqüente. “Como pessoa que
conhece o presidente Lula há muito tempo, eu sempre o tive como um grande
líder, eu sempre o tive como uma pessoa que se comporta com absoluta lisura”,
disse Cardozo, ao comentar as investigações. Assim, para o ministro sob cuja
pasta atua a Polícia Federal, a “absoluta lisura” de Lula deveria descartar
liminarmente qualquer suspeita a respeito do líder petista.
O barulho em torno do caso sugeriu Cardozo, se deve apenas ao fato de
que “muitos setores da oposição” estão interessados em “criar situações que
atinjam a imagem de uma pessoa que foi um presidente indiscutivelmente
aplaudido durante todo o período de sua gestão pelas substantivas melhoras e
mudanças que empreendeu no país”. Para o ministro, portanto, Lula é na verdade
vítima de forças perversas, que não se conformam com sua popularidade.
Que os militantes
petistas queimem a mão por colocá-la no fogo por Lula é problema apenas deles;
que Dilma e seus ministros se chamusquem para defender o ex-presidente,
ignorando seu papel como funcionários a serviço do Estado, é problema de todo o
país.
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