Por Augusto nuns, 04/11/2015,
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José
Nêumanne publicado no Estadão
Na quinta-feira 29 de outubro, em Brasília, onde assumiu a Presidência
de fato no segundo mandato de sua substituta conveniente e conivente, Dilma
Rousseff, Luiz Inácio Lula da Silva divertiu sua claque no Diretório Nacional
do Partido dos Trabalhadores (PT) com as metáforas de hábito e a grosseria de
praxe. Nesse discurso, confessou que a afilhada praticara estelionato eleitoral
na campanha vitoriosa da reeleição em 2014. “Tivemos um problema político
sério, porque ganhamos a eleição com um discurso e depois das eleições tivemos
que mudar o nosso discurso e fazer aquilo que a gente dizia que não ia fazer”,
disse.
Na ocasião, proibiram investidas do PT contra o presidente da Câmara,
deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tido como o maior desafeto de Dilma e do partido.
“Tudo o que interessa à oposição é que a gente arrume quinhentos pretextos para
discutir qualquer assunto e depois não discutir o que interessa, que é aprovar
o que a Dilma mandou para o Congresso Nacional. A não ser que tenha alguém aqui
que ache que isso não é importante. Primeiro, vamos tentar derrubar o Eduardo
Cunha, depois derrubar o impeachment e, depois, se der certo, a gente vota nas
coisas que a Dilma quer”, ironizou. E recuou das rudes críticas que antes fazia
ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Nunca antes em sua vida pública, desde que assumiu a presidência do
Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, em 1975, Lula foi tão
claro, estratégico e cuidadoso em qualquer discurso. Fez-se muito barulho em
relação ao reconhecimento do estelionato, crime definido no Código Penal. Com a
agravante de ter sido um estelionato que vitimou a Nação, em especial o
eleitorado que não anulou voto, votou em branco ou se absteve de votar e, em
particular, os brasileiros mais pobres e menos esclarecidos que acreditaram em
sua candidata. E daí? Qualquer advogadinho do PT sabe e, na certa, lhe informou
que estelionato não basta para abrir processo de impeachment contra a
presidente.
Além disso, Lula recebe de novo inestimável apoio de quem se apresenta à
cidadania como adversário. Há um vácuo jurídico na Constituição de 1988:
inexiste lei que regulamente o impedimento de presidente. O texto legal de
1950, aos 65 anos de vigência, serviu de base para levar Collor a renunciar.
Mas não é suficiente para depor Dilma de forma democrática. E é nesse argumento
incontestável que os dependentes da miríade de boquinhas do governo
lulodilmopetista se apóiam para chamar de “golpista” quem não suporta mais a
presidente (7 em 10 brasileiros).
A Constituição vige há 27 anos, o oitavo mandato presidencial está
começando e nunca parlamentar algum cuidou desse detalhe. Este não é,
definitivamente, um pormenor para a oposição, que não encontrou até agora base
jurídica séria para fazer o que a Nação quase inteira exige: retirar a
estelionatária de palanque do cargo poderoso do qual comanda esta nossa marcha
da insensatez para monumentais crises moral, econômica, política e quase à
beira de outra, a institucional. Lula sabia disso quando confessou o delito da
preposta. Os adversários, tudo indica, não.
Em relação à reeleição, recorde-se ainda que o líder do PSDB na Câmara,
Carlos Sampaio (SP), requereu recontagem dos votos para verificar se não houve
fraude na vitória da presidente sobre o senador Aécio Neves (PSDB-MG) no segundo
turno do pleito de 2014. Qualquer usuário de computador em jardim de infância
sabe que, no sistema de coleta e contagem de votos no Brasil, recontar votos é
simplesmente impossível. Um ano depois, com a vencedora enredada em outras
suspeitas, Sua Excelência disse o que todos já sabiam: não dá para recontar.
Não contou, porém, por que, do alto de sua sapiência legislativa, não
empreendeu alguma lei que ao menos dificultasse as fraudes que qualquer hacker
iniciante pode praticar no Brasil.
O pior é que, mesmo sem o haver dito explicitamente, o ex no poder
avalizou o mais asqueroso pacto de conivência criminosa de nossa História. Nele,
a primeira mandatária da República e o presidente da Câmara dos Deputados,
Eduardo Cunha, dois degraus abaixo dela na escada sucessória, achincalham as
instituições garantindo um à impunidade da outra, e vice-versa. Em sua frase
aqui citada, Lula não precisou de nenhum argumento para mandar seus asseclas
evitarem incômodos a Cunha, fazendo ouvidos de mercador às evidências que
brotam no seu prontuário policial como capim em pasto farto. A aceitação muda e
mansa dos petistas à ordem do chefe, que, tal qual um Ulysses Guimarães do
século 21, passou a comandar o governo federal, o partido e a oposição, é a
maior prova de que apenas emudeceu o óbvio que, apud Nelson Rodrigues, ulula.
E se havia alguma dúvida de que o ex resolveu assumir, mantendo a
preposta como rainha da Inglaterra de plantão, esta foi dirimida por sua
guinada de 180 graus ao apoiar os ajustes e o ministro da Fazenda, Joaquim
Levy. O padim aceitou outro óbvio – de que a cabeça de Dilma está sob a espada
de Dâmocles, suspensa pelo fio do rabo de um cavalo. O fio é dos bancos, que
com a crise têm lucrado como nunca ninguém lucrou. Nisso ele é craque: há 40
anos o clã Lula da Silva morava numa vila operária e hoje se espalha em
apartamentos de luxo, até na praia, mercê de sua carreira de palestrante para
empresas acusadas de delinqüir – o que lhe permitiu movimentar R$ 52,3 milhões
em quatro anos, conforme o Coaf.
O descalabro de
quatro desgovernos do PT, delatado nas Operações Lava Jato e Zelotes e com 3
mil brasileiros perdendo o emprego todo dia, mostra que o cavalo de cujo rabo
pende a espada, e que Lula monta após destruir tudo ao redor – empresas, empregos,
crédito de agências de risco, honra e pudor –, não é de Átila, mas de Agamenon.
Pois, às portas de Tróia, abertas com a conivência de adversários néscios, ele
planeja invadir-lhe as ruínas.
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