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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Não me representa



(Fonte: CP 24/07/2013)

Virou o grande bordão do ano. Estará em todas as retrospectivas em dezembro. Dará chamada na televisão junto com aquelas musíquinhas nostálgicas. Para quem gosta de discussões intelectuais e não tem medo de pensar, que, de resto, não dói, salvo quando se tem creme de ervilha no cérebro, a pós-modernidade, esse nome assustador, sempre foi descrita por seus teóricos como o fim da representação. Na modernidade, o indivíduo via-se reduzido à contemplação das telas (televisão, cinema), à manipulação da mídia, à delegação dos seus poderes políticos nos eleitos e à vida por procuração, as grandes emoções sendo sentidas por meio dos olimpianos, das vedetes, das estrelas, das celebridades, dos especiais. 

O homem moderno era um idiota com muito passado, pouco presente e uma promessa de futuro radioso. Os gregos, como se sabe, não eram modernos. Eram antigos. Praticavam a democracia direta. Mas, pragmáticos, excluíram dessa participação à maioria da população. Séculos depois, aconteceu uma famosa controvérsia entre antigos e modernos. Os antigos do século XVII achavam que somente no passado clássico havia arte de primeira grandeza. Os modernos de hoje pensam como os antigos de ontem. Vivem de olho no retrovisor. Exatamente como os passadistas classicistas, os novos antigos estão sendo atropelados por novos modernos, os pós e hipermodernos. No popular, pela turba que cansou de ser representada e que fazer por si mesma. Fim da representação, da contemplação, da delegação e da vida por procuração.

Os representantes resistem. Conversei com vários deputados sobre a reforma política. Elas negaceiam: não é o que o povo pede, não sairá por falta de acordo no Congresso nacional, representamos, sim os nossos eleitores, não podemos jogar fora a criança (política) junto com a água suja da bacia (a descrença no sistema). A massa não quer reforma política. Não sabe, muitas vezes, o que significa. Quer apenas que não existam parentes como suplentes de senador, quer que os mais votados sejam eleitos, quer que as campanhas custem menos e não sejam pagas com caixa 2, quer que as eleições não sejam decididas pelo poder econômico, quer escolher nominalmente os seus candidatos e que o voto dado não vá eleger qualquer outro, quer ter contato frequente com quem escolhe, quer que não existam votações secretas no parlamento e que o poder não fique nas mãos de líderes.

A massa não sabe a diferença entre consulta popular, plebiscito e referendo. Ela sabe que quer ser ouvida diretamente sobre os grandes problemas nacionais. Ela não sabe se pode ou não existir uma constituinte exclusiva. Sabe, porém, que os eleitos atuais não são confiáveis para mudar regras que os favorecem. Na sua inteligência ignorante, a massa quer reforma política sem saber que os seus desejos têm esse nome. Ela que o fim da corrupção, do toma lá dá cá e das alianças espúrias pela governabilidade. Quer o fim até do que lhe parece grego: as coligações nas eleições proporcionais. A massa é moderna contra os antigos, pós-moderna, contra os modernos, hipermoderna contra os pós-modernos e clássica na sua expressão indignada e elegante: não me representa.

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