As eleições provaram que o Brasil quer se arejar
Por Augusto
Nunes, 03/10/2016,
www.veja.com.br
Texto de Valentina de Botas
Tenho
parentes que trabalham na rede municipal de ensino de São Paulo que me contam
que a administração do PT questiona a separação dos banheiros entre meninos e
meninas nas escolas públicas da cidade. Uma divisão que, no mundo cretino
dessa gente, direciona a sexualidade das crianças – dos meninos para serem
meninos, e das meninas para serem meninas. Outra das brutalidades burguesas,
patriarcais, capitalistas, blábláblá. O fim absurdo da separação é apoiada
por grande parte dos professores e por toda a burocracia da Secretaria
Municipal de viés ainda mais à esquerda do PT. São Paulo tem 466 anos,
Fernando Haddad, o poste que Lula conseguiu instalar em São Paulo com
financiamento do Petrolão segundo a Lava Jato, degradou a cidade por 4 anos,
com a mais brutal má gestão e equívocos celebrados pelo eixo PUC-USP-Vila
Madalena e adjacências socioideológicas. Mas o que são 4 anos em 466? Muita
coisa, pois não moramos num país, mas numa cidade. É onde se opera o
cotidiano, onde tudo se particulariza e se encontra. É nela que nossos filhos
começam a freqüentar a escola e fazem os primeiros amigos, é nela que vamos
ao cinema, ao restaurante preferido, àquela mostra de brinquedos antigos, ao
mecânico de confiança. Fica na cidade aquele prédio histórico, aquele parque
com uma espécie rara de flor, o bar da moda e aquela livraria charmosa que
queremos mostrar a amigos e parentes vindos de fora para nos visitar: a
cidade é real como o “imaginário daquilo que imaginamos que somos”; o país é
quase abstração; e, se ambos se transformam no tempo como tudo o mais, é na
cidade que o tempo se revela a cada instante. Desafio os artistas; os
humoristas-a-favor de ladrão; as castas privilegiadas e ideologicamente
dogmáticas encasteladas nas universidades e protegidas da crise por integrarem
os grupos privilegiados do funcionalismo público do Estado patrimonial; os
descolados-tipo-bacanas que ainda acham chique ser de esquerda, enfim,
desafio toda essa gente que ainda cacareja o “fora, Temer” a encontrar apenas
um pai e uma mãe com filhos até 14 anos (para ficar no limite de idade da
alçada da prefeitura), habitantes do mundo exterior ao da
pose-tipo-assim-descolada-esquerda-chique, favoráveis ao fim da separação dos
banheiros nas escolas públicas. Não só a Lava Jato e a crise econômica
inédita levaram o eleitor a praticamente abolir o PT das prefeituras do país
nestas eleições inesquecíveis de 2016 que o partido desejará esquecer, mas
sobretudo porque a súcia e simpatizantes desconhecem o país e insistem em
ignorar as necessidades desesperadoras dele para ver nele bandeiras que ainda
lhe são estranhas, enquanto também desconhecem a gente de carne, osso,
costumes e valores próprios que o habita além das envelhecidas cercas
ideológicas e dos manuais vigaristas e embolorados. Entre as prioridades da
educação brasileira – em qualquer nível – não estão o uso do banheiro das
meninas pelos meninos e vice-versa e forçar a questão a ser uma questão dá a
medida do autoritarismo do PT e do desprezo que o partido tem por nossos
interesses legítimos e nossos problemas reais que deseja substituir pela
própria agenda.
Entre outras considerações aparentemente
sensatas, todos os analistas estão dizendo que Alckmin é o grande vencedor
destas eleições que se habilita para disputar a presidência em 2018, que ACM
Neto será o próximo governador da Bahia e que o PT é o grande pequeno
derrotado. Mas eu diria que perdeu o PT, digamos, expandido, aquele que
aglutina os blocos do “fora, Temer” e que acusam o impeachment de tropeço da
democracia brasileira – esta mesma que conseguiu ficar de pé apesar de o
ministro Ricardo Lewandoski ter chutado seu pilar, a Constituição, na
presidência do julgamento que a protegeu, ao contrário do que ele diz.
Perdeu estas eleições quem olha para o Brasil de
2016 que anseia pelo futuro e vê um país coagulado no mundo extinto da guerra
fria e da ditadura militar. A nação quer se arejar, a população mostrou isso
hoje ao repelir o PT da gestão de onde a vida acontece – as cidades. Quando
sai derrotado das eleições um partido que não a percebe como ela é, o grande
vencedor é ela. Como cerzir um país? Não sei ao certo, mas desconfio que só é
possível começar quando ele se livra daquilo que o impedia de começar.
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