Desembargador Ivan Sartori
demonstra espírito intolerante; e olhem que defendo a anulação dos julgamentos
dos policiais do Carandiru
Por Reinaldo
Azevedo, 05/10/2016,
www.veja.com.br
Eu não tenho compromisso com a
estupidez de ninguém e ela jamais estará do meu lado. O Tribunal de Justiça de
São Paulo anulou os julgamentos dos policiais que participaram da ação do
Carandiru, que ficou conhecida como massacre. Em quase toda parte, gritou-se
“Escândalo!”. Houve apenas o cumprimento da lei. É preciso individualizar a
conduta criminosa. É o que exige o Artigo 41 do Código de Processo Penal. A lei
é ruim? Que se mude a lei. Enquanto isso não acontece, que seja cumprida.
Simples e objetivo. O relator da matéria foi o desembargador Ivan Sartori. A
decisão foi endossada por dois outros. Sartori foi além e também pediu a
absolvição dos réus. Nesse particular, foi voz isolada.
Muito bem. Não é que o doutor Sartori,
inconformado com as críticas que recebeu, decidiu reagir no Facebook,
especulando se a imprensa não estaria recebendo dinheiro do crime organizado?
Escreveu ele: “Diante da cobertura tendenciosa da imprensa sobre o caso
Carandiru, fico me perguntando se não há dinheiro do crime organizado
financiando parte dela, assim como boa parte das autodenominadas organizações
de direitos humanos”.
Que coisa estúpida!
Eu poderia perfeitamente bem escrever
isto:
“Diante da decisão tendenciosa de alguns
juízes, fico me perguntando se não há dinheiro do crime organizado financiando
parte da Justiça”.
E aí? Como ficaríamos? Se eu, como
jornalista, não devo escrever o que vai acima — ou bem informo o caso concreto
ou bem não espalho uma suspeita sem fato —, como se concebe que um
desembargador possa fazê-lo, mas tendo a imprensa como alvo, só porque esta
reagiu de modo extremamente negativo à decisão tomada pelo trio?
Eu, por exemplo, estou na grande
imprensa que o doutor suspeita estar infiltrada pelo crime organizado e, ora
vejam! Acho que TJ fez o certo porque é o que pede a lei. Lá estivesse, também
teria votado pela anulação — mas não pela absolvição. Creio que é preciso haver
novos julgamentos, embora eu reconheça que o tribunal tem, sim, segundo jurisprudência
do Supremo, competência para absolver se a decisão do tribunal do júri se deu
contra as provas.
Independentemente do mérito do voto, o
senhor Sartori evidencia um espírito intolerante. Em vez de esclarecer as
coisas, ele prefere desqualificar os críticos e lançar contra eles suspeitas
irresponsável. E não é um qualquer que o faz: trata-se de um desembargador do
Tribunal de Justiça, do qual já foi presidente.
A anulação está certa, mas Sartori está
estupidamente errado e parece não se conformar com um dos pressupostos da
democracia: decisão da Justiça tem de ser cumprida, mas também tem de ser
debatida.
Mais: recomendo aos senhores togados,
todos, de qualquer instância ou esfera, que se mantenham longe das redes
sociais. Um juiz concentra poderes demais para sair por aí opinando como se
fosse um adolescente espinhento, passando por alguma revolução hormonal.
Tenha compostura, doutor!
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