No mundo, o 'crime organizado';
no Brasil, também o 'crime institucionalizado'
Por Augusto
Nunes, 14/10/2016,
www.veja.com.br
Texto de Eliane Cantanhêde publicado no Estadão
Em depoimento à Comissão Especial que analisa as
dez medidas de moralização dos Poderes, o delegado aposentado da PF Jorge
Barbosa Pontes, que se formou no FBI e atuou na Interpol, disse que a corrupção
do Brasil não é só gigantesca como também criou uma nova modalidade de crime
ou, nas palavras dele, “um novo animal da criminologia”. Em vez de “crime
organizado”, aqui se tem “crime institucionalizado”, uma classificação
perfeitamente compatível com a expressão usada pelo ministro do Supremo Celso
de Mello para definir os desmandos revelados pela Lava Jato: “delinqüência
governamental”.
O delegado explicou a diferença entre esse “novo
animal” e o crime organizado tradicional: um, o “organizado”, é praticado por
grupos de pessoas; o “institucionalizado” é comandado pelo “núcleo do poder”,
no Planalto e na Casa Civil, por exemplo, “e não usa armas, mas o Diário
Oficial”. Lula, aliás, é três vezes réu.
O presidente e o relator da comissão, Joaquim
Passarinho (PSD) e Onyx Lorenzoni (DEM), querem discutir o parecer final no
início de novembro e a semana que vem será animada. A comissão ouvirá o
ministro Alexandre de Moraes (Justiça) na segunda-feira, terá depoimentos todos
os dias e chegará a cem depoentes sobre as dez medidas apresentadas por
procuradores e subscritas, agora, por três milhões de brasileiros.
Só esse número comprova o quanto a sociedade está
exausta de desvios milionários e onipresentes. Como disse o ministro do STF
Luís Roberto Barroso ao Estado, “onde você destampa tem alguma
coisa errada”. Ele não citou, mas bem poderia ter citado a Petrobras, a Casa
Civil, Fazenda, Planejamento, Minas e Energia, BNDES, Correios, Carf (o
conselho revisor de decisões da Receita), fundos de pensão e vai por aí afora.
Destampou, achou.
Também participaram da sessão da comissão na
terça-feira duas representantes da chamada “sociedade civil”, Ana Paula Sayão e
Rosa Richter, e elas, assíduas no acompanhamento dos trabalhos, dizem que se
surpreenderam com o ritmo frenético da Câmara e com a seriedade de
parlamentares que estão de fato envolvidos na aprovação das propostas. O
Congresso visto de dentro, é menos horripilante do que aparece na mídia…
Eis as 10 propostas: “testes de integridade” em
agentes públicos; criminalização do enriquecimento ilícito e do caixa 2 de
campanha; transformar corrupção em crime hediondo; apressar penas e prisões em
crimes comprovados; rapidez também nas ações de improbidade; acabar a
prescrição ou ampliar prazos; redução das nulidades penais; prisão preventiva
para evitar evasão do fruto do roubo; devolução do dinheiro desviado.
A questão do foro privilegiado para político fica
fora, porque exige Emenda Constitucional e poderia atrasar a aprovação do
pacote. Mas podem ser incluídas duas medidas pelas quais se bate Rubens Bueno
(PPS): aposentadoria para juízes afastados por corrupção e mais rigor com os
aditamentos em obras públicas, um ralo do dinheiro público.
Uma curiosidade: enquanto a comissão da corrupção
se reunia, o plenário guerreava para incluir no projeto de repatriação de
recursos a permissão para que familiares de políticos possam aderir e se
beneficiar da lei. Dureza, não?
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