"Não perco o controle, não
perco o eixo, não perco a esperança. Porque sou mulher e me acostumei a lutar
por mim e pelos que amo". Era visível que, naquele momento, faltavam-lhe
controle, eixo e esperança
Por Reinaldo
Azevedo, 07/04/2016,
www.veja.com.br
Responda, leitor, leitora, uma pergunta
que hei de fazer de maneira bem crua, sem rodeios, sem subterfúgios: o quadrado
da hipotenusa deixará de ser igual à soma do quadrado dos catetos a depender do
que vocês tenham entre as pernas? Há alguma chance de duas vezes dois deixarem
de ser quatro a depender, digamos, do uso que você dê a esse aparelho
localizado entre os fêmures?
Tendo a achar que não. Como também
tendo a considerar que a cor da pele, por exemplo, não muda a composição da
água, do sal ou do enxofre. Ou ainda a fórmula de Bhaskara.
Por que isso? Dilma recebeu como sabem,
nesta quinta, um grupo de personalidades num tal “Encontro com Mulheres em
Defesa da Democracia”.
Já esse título deveria constranger uma
professora de filosofia — que se diz “filósofa”, como se fossem coisas
sinônimas — como Márcia Tiburi, que estava lá. Afinal, se aquele era o encontro
das mulheres “em defesa da democracia”, deve-se supor que as que defendem o
impeachment ou são contrárias à democracia ou mulheres não são.
Márcia levaria pau no curso Massinha I
de Escolástica. Imagino a confusão mental em que não entrou quando tentaram lhe
ensinar dialética, que ela se esforça, sem sucesso, para ensinar aos outros.
De uma professora de filosofia, a
primeira coisa que se espera é precisão com as palavras. Mas há muito o “logos”
não está entre as preocupações da midiática professora. Ela prefere a
logorreia. Cobrou a saída de Eduardo Cunha. Tou junto. Mas disse que as
críticas sofridas por Dilma são “do nível do estupro político”.
Claro! Esta senhora só apelou a tal
metáfora porque Dilma é mulher. Assim sendo, seus adversários, se homens, são
potenciais estupradores; se mulheres, condescendentes com o estupro.
O nome disso é delinqüência
intelectual. Mas sou justo: outro dia alguém fotografou um trecho de um livro
dessa Tiburi aí e me mandou, ainda da livraria, às gargalhadas. Não comprou,
claro! Eu diria que ela pensa como fala e escreve como pensa. Não sei se fui
muito sutil. Quando na televisão, as suas indignações primitivas eram
corrigidas pelo charme ou pela inteligência de suas parceiras. Entregue ao
comando do próprio cérebro, produz essas maravilhas.
É espantoso que Márcia e as demais
mulheres que ficaram entoando cantos contra o impeachment em pleno Palácio do
Planalto, em meio a gritos de “Fora Michel Temer”, acreditem que o fato de
pertencerem, digamos, ao mesmo gênero da presidente lhes confira especial
competência para avaliar, por exemplo, as provas da Lava Jato.
Olhem que vou recusar a crítica fácil e
bronca, que consistiria em indagar se, agora, os que defendemos o impeachment
podemos, afinal, criar o “Encontro com Homens em Defesa da Democracia”, tendo
como pauta a posse legítima de Temer… Seria uma tolice responder assim àquela
patuscada porque, obviamente, aquele encontro se assenta no fato de que a
mulher é, em muitos casos, oprimida na sociedade — e é mesmo.
Mas esse é o caso de Dilma, eleita e
reeleita, com os poderes quase imperiais de que dispõe um presidente no Brasil?
Mais: se há alguém que gosta de exercer o mando, sem ouvir ninguém, seja qual
for o padrão de comparação, masculino ou feminino, eis a senhora.
Mais do que isso: se a dona Tiburi está
em busca de estupro político, que procure ver o que Lula — não outro qualquer —
fez com Dilma, ao se impor como ministro, e a presidente oficial sabe disso,
sob a ameaça de o próprio PT deixá-la ao léu. Dilma aceitou ser a serva do
macho alfa, naquele que é, sim, o mais triste papel que uma mulher, diante de
suas semelhantes, poderia desempenhar no poder.
A ainda presidente voltou a vociferar
contra a Lava Jato, em mais um ato ilegal promovido no Palácio. Ela não tem o
direito de transformar um prédio público num aparelho de resistência ao Poder
Legislativo e Judiciário. Crimes estão sendo cometidos, é bom que se diga.
Dilma referiu-se aos dados que
circularam sobre a delação da Andrade Gutierrez. Chamou-os de “vazamentos
seletivos” e “premeditados”, a serviço do “golpe”. E tudo isso aos berros. E
emendou, com humor involuntário: “Não perco o controle, não perco o eixo, não
perco a esperança. Porque sou mulher e me acostumei a lutar por mim e pelos que
amo”.
Era visível que, naquele momento,
faltavam-lhe controle, eixo e esperança. E sobrava hipocrisia. A menos que esta
senhora venha a público reivindicar a inimputabilidade porque, afinal, é uma
mulher.
Nenhum comentário:
Postar um comentário