Sem argumentos legais ou
políticos para derrubar o impeachment, já que o afastamento de Dilma é consenso
entre os brasileiros e segue estritamente a previsão constitucional, Lula
deixou de lado o pouco que lhe restava de responsabilidade e partiu para o
ataque frontal às instituições
Por Augusto
Nunes, 27/04/2016,
www.veja.com.br
Editorial do Estadão:
A presidente Dilma Rousseff sofreu mais uma
significativa derrota na tramitação do processo de impeachment no Congresso. A
comissão do Senado que avalia o caso escolheu como relator o tucano Antonio
Anastasia (MG), ligado ao presidente do PSDB, Aécio Neves. Os governistas
tentaram de todas as formas impedir que Anastasia fosse eleito, mas o colegiado
foi implacável: seu nome foi avalizado com apenas 5 votos contrários entre os
21 membros titulares, placar que reitera a galopante desvantagem de Dilma na
luta contra o impeachment.
Essa desvantagem tende a crescer, porque o
presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em quem o Palácio do Planalto
depositava a esperança de manipular o processo em seu favor, demonstrou
indisposição para interferir nas escolhas da comissão e no prazo para a
conclusão dos trabalhos, que a maioria oposicionista pretende encurtar.
Os seguidos reveses de Dilma e do PT no campo
institucional – na Câmara, no Senado e no Supremo Tribunal Federal, que
avalizou todo o processo de impeachment até aqui – certamente explicam o
destempero do chefão petista Luiz Inácio Lula da Silva, que chamou sua tropa para
ir às ruas e desestabilizar um eventual governo de Michel Temer.
Sem argumentos legais ou políticos para derrubar o
impeachment, já que o afastamento de Dilma é consenso entre os brasileiros e
segue estritamente a previsão constitucional, Lula deixou de lado o pouco que
lhe restava de responsabilidade e partiu para o ataque frontal às instituições.
Em encontro da Aliança Progressista, que reúne
partidos de esquerda de várias partes do mundo, Lula disse que Dilma é vítima
de “uma aliança oportunista entre a grande imprensa, os partidos de oposição e
uma verdadeira quadrilha legislativa, que implantou a agenda do caos”. Essa
frase – que estava num discurso escrito, ou seja, não foi dita de forma
impensada – resume o atentado que Lula da Silva e seus comparsas estão
dispostos a cometer contra a democracia no Brasil.
Incapaz de reunir os votos necessários para impedir
o impeachment, nem mesmo depois de tentar comprar deputados num quarto de hotel
em Brasília, Lula agora desqualifica o mesmo Congresso que lhe foi tão útil
nesses anos todos – e que, acima de qualquer consideração sobre sua qualidade,
foi eleito pelo voto direto e, portanto, é legítima representação popular.
No discurso, Lula disse também que o impeachment é
uma “farsa” que “envergonha o Brasil aos olhos do mundo”, como se a grande
vergonha brasileira não fosse a devastadora corrupção capitaneada pelo PT e
seus acólitos, que gangrenou as estruturas do Estado, arruinou a Petrobrás e
rebaixou a política nacional a um ordinário balcão de negócios.
O que se vê é Lula fazendo o possível para ampliar
essa vergonha, lançando no exterior sua campanha para desacreditar as
instituições democráticas. Àqueles dirigentes partidários estrangeiros, o
chefão petista disse que “em todo o mundo há vozes responsáveis alertando para
os riscos de um golpe de Estado no Brasil” e pediu aos colegas que “levem a
seus países a mensagem de que a sociedade brasileira vai resistir ao golpe do
impeachment”.
O problema, para Lula, é que sua voz já não tem o
vigor dos tempos em que se julgava um grande líder mundial. A campanha movida
por ele e por Dilma para sensibilizar governos e entidades mundo afora contra o
tal “golpe” tem sido um completo fracasso.
Nem mesmo a União das Nações Sul-Americanas
(Unasul), bloco de inspiração bolivariana, conseguiu aprovar alguma moção de
repúdio ao impeachment.
Mas Lula não parece se importar com o vexame. “As
ameaças à democracia no Brasil e na América Latina dizem respeito a toda a
comunidade mundial. Dizem respeito à luta entre civilização e barbárie”, disse
o líder da tigrada. Ele tem razão: hoje, mais do que nunca, é preciso defender
a civilização, calçada no respeito às leis, contra a barbárie, representada
pela truculência daqueles que, por não terem mais um pingo de dignidade, não
sabem perder.
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