A grande vantagem em relação ao
passado recente é que agora já temos a moeda. Embora maltratado, o real está aí
Por Augusto
Nunes, 09/06/2016,
Texto de Carlos Alberto Sardenberg publicado
no Globo
A parte animadora da história: Ilan Goldfajn, novo
presidente do Banco Central, cravou o compromisso de restabelecer o básico
tripé de política econômica, com meta de inflação, equilíbrio das contas
públicas e taxa de câmbio flutuante.
A parte triste: o país já havia se beneficiado
dessa combinação de estabilidade e crescimento, até que Dilma Rousseff resolveu
desmontar o tripé com sua nova matriz.
O Brasil levou 14 anos para sepultar a
superinflação e o total caos das finanças públicas. Isso aconteceu desde a
introdução do real (1994) e da série de reformas que sustentou a moeda —
formando o tripé — até a conquista do grau de investimento, em abril de 2008. A
Standard & Poor’s foi a primeira agência a conceder essa nota à economia brasileira,
reconhecendo inclusive a maturidade política do país. Isso porque Lula, que se
elegera pela oposição a FHC, havia mantido e até aprimorado o tripé no seu
primeiro mandato.
Em setembro de 2015, a mesma S&P foi a primeira
a retirar a nota e rebaixar o Brasil ao grau especulativo (ou junk, como dizem
no mercado internacional). Lula começou o desmonte no seu segundo mandato, mas
foi Dilma quem se dedicou meticulosamente à destruição das bases da
estabilidade. Em menos de cinco anos, conseguiu botar abaixo um edifício que
levara 14 anos para ficar mais ou menos pronto.
Assim, lá vamos nós de novo. As duas tarefas
principais são as mesmas de 22 anos atrás: eliminar o déficit das contas
públicas e voltar ao superávit primário para equilibrar e depois reduzir a
dívida pública; e colocar a inflação na meta, agora de 4,5% ao ano. A terceira
parte é garantir a taxa de câmbio (a cotação do dólar) mais flutuante do que
manipulada pelo Banco Central.
A grande vantagem em relação ao passado recente é
que agora já temos a moeda. Embora maltratado, o real está aí, pode ser
reequilibrado, o que afasta a necessidade de uma complicada reforma monetária.
Lembram-se da URV e da complexa troca do papel moeda?
Pois é, disso não se precisa mais. Aliás, convém
reparar: isso prova a força da construção anterior.
Outra vantagem é que o conjunto de regras de
estabilidade fiscal também já está montado. Essas normas foram desrespeitadas
na gestão Dilma — com as pedaladas e a contabilidade criativa ou simplesmente
mentirosa —, mas continuam vigentes. É preciso aperfeiçoá-las e garantir que
não possam ser dribladas.
Para isso servirá a proposta já anunciada pela
equipe econômica de estabelecer um teto para o gasto público: o valor do ano
anterior mais a inflação. Em termos reais, o que importa, a despesa total
ficará congelada.
O presidente Michel Temer disse que a proposta vai
ao Congresso na semana que vem. Será importante passo — a depender, como todos
os outros, do ambiente político.
A óbvia crise institucional pode atrapalhar e bloquear
a política econômica. Isso todos sabemos. Mas também é verdade que um bom
andamento na economia pode ajudar o governo a passar pelos impasses da política
partidária.
Daí a importância das medidas que o Executivo pode
tomar sem passar pelo Congresso. Além das mais óbvias — ações da Fazenda para
controlar as contas e do BC para apontar a inflação para a meta —, o que mais
ajudaria seria um bom programa privatizações e concessões.
Com o governo quebrado, a única possibilidade de
turbinar investimentos está no setor privado. A parte do governo nessa história
será preparar vendas e licitações competitivas e atraentes para o capital
nacional e estrangeiro.
Aliás, isso também já foi feito, no final dos anos
90 e início dos 2000. De novo aqui, é começar de novo.
Moral da história: o triste é ter que fazer tudo de
novo; o reconfortante, digamos assim, é saber que já foi feito uma vez e, pois,
pode ser feito de novo.
VIDA DURA
Vejam como é complicada a vida do gestor de
política econômica. Nos últimos dois dias, os mercados reagiram ao “efeito
Ilan”. O discurso do novo presidente do BC animou o pessoal. Vai daí, a bolsa
subiu, os juros caíram, e o dólar caiu.
É sinal de confiança.
E se dólar cair demais? Ajuda quem vai viajar — e
até pode melhorar o Índice de Confiança do Consumidor — mas atrapalha as
exportações, único setor que está em expansão.
Ilan Goldfajn disse que a taxa de câmbio deve ser
flutuante. Inclusive na faixa dos três reais ou menos?
Será um primeiro teste para o novo BC.
De todo modo, há fundos de investimentos — de
ótimos gestores — que estão “vendidos em dólar contra o real”. Ou seja, acham
que o dólar cai e o real se valoriza.
A ver.
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