Por
Augusto Nunes, 23/07/2015,
www.veja.com.br
Texto de Eliane Cantanhêde publicado O Estado de S. Paulo
O momento brasileiro não tem graça nenhuma e o
vice-presidente Michel Temer, sempre tão sóbrio, foi no mínimo infeliz ao
imitar o ex-presidente Lula, sempre tão boquirroto, e dizer que toda essa baita
confusão não passa de uma “crisezinha”. A ebulição política não é só uma
“crisezinha”, tanto quanto o tsunami econômico internacional de 2008 não foi só
“marolinha”.
A “marolinha” de Lula pegou os Estados Unidos, a
Europa de jeito e o mundo inteiro de jeito, virou o que virou e até hoje é
pretexto, inclusive, para a desordem econômica herdada do primeiro mandato da
presidente Dilma Rousseff. Até o presidente do Supremo Tribunal Federal caiu
nessa, ou prefere cair nessa.
Quanto à “crisezinha” de Temer: o rompimento
declarado do deputado Eduardo Cunha com o governo acentua o clima de guerra
entre a Câmara e o Planalto e aumenta a desconfiança mútua entre o PMDB de
Temer e o PT de Dilma. Fosse só uma “crisezinha”, o Planalto não estaria de
prontidão, menos para atacar, mais para se defender.
Nesse tiroteio, com bala perdida para todos os
lados, a Lava Jato segue seu rumo, não propriamente a jato, mas no tempo certo,
e cria uma cena inédita na vida nacional: os atingidos não são pobres coitados
de favelas e periferias, mas ricos e poderosos encastelados nas grandes
empreiteiras. Se o mensalão meteu os corruptos na cadeia, o petrolão chega à
outra ponta: a dos corruptores.
A Justiça acaba de condenar três mandachuvas da
Camargo Corrêa e a Polícia Federal está indiciando o dono da Odebrecht, nada
mais nada menos que a maior empreiteira do País. Vocês lembram de algo
parecido? E não vai parar por aí, porque a fila é grande e a Lava Jato entrou
na fase do “anda rápido que atrás vem gente”. Depois dos empreiteiros,
diretores da Petrobrás e doleiros, está chegando à vez dos políticos.
Eduardo Cunha pode espernear à vontade, mas ele não
vai escapar tão fácil das investigações – e não está sozinho. Além dos colegas
do PMDB, inclusive o presidente do Senado, Renan Calheiros, a Lava Jato atinge
praticamente todo o PP, aliados governistas do PT e de vários partidos e até
gente da oposição. Logo, vice Temer, é até de mau gosto falar em “crisezinha”.
Se diplomatas irritam por falar muito e não dizer
nada, políticos falam muito, dizem cobras e lagartos dos adversários e muitas
vezes morrem pela boca. Os anais políticos são pródigos em expressões que ficam
como carimbos indeléveis. O “duela a quien duela” de Collor, o “esqueçam o que
escrevi” de Fernando Henrique (que ele nega), o “estupra, mas não mata”, de
Paulo Maluf, o “relaxa e goza” de Marta Suplicy, Lula chamando o filho Lulinha
de “Ronaldinho” dos negócios e, claro, Dilma enaltecendo a “mulher sapiens” e a
“mandioca”. Ela, aliás, bate todos os recordes.
Mas com crise não se brinca, seja política,
econômica, ética, ou, como agora, todas juntas. Lula falou de “marolinha” em
2008 por pura esperteza, mas Temer tentou fazer blague com a crise atual
chamando-a de “crisezinha” por simples falta do que dizer. Como ele poderia
escapar? Nem poderia romper com Cunha, muito menos poderia romper com governo.
Então, improvisou uma gracinha, mas, no dia seguinte, já admitiu que, “um dia”,
pode ocorrer de o PMDB deixar mesmo o governo.
Enquanto Temer está em Nova York menosprezando a
“crisezinha” política, aqui a recessão se aprofunda, o desemprego já empurrou
345 mil famílias no limbo e na incerteza neste semestre e a popularidade de
Dilma vai ficando abaixo do volume morto. Segundo a CNT-MDA de ontem, ela tem
7,7% de aprovação e 70,9% de rejeição. Pior: mais de 60% aprovam o impeachment.
E a pesquisa não é dramática só para o PT no
presente, mas também para o PT no futuro: se a eleição presidencial fosse hoje,
o antes endeusado Lula perderia no 2.º turno para Aécio Neves, José Serra ou
Geraldo Alckmin. Vocês acham mesmo que o PMDB vai segurar a onda de uma
“crisezinha” assim? É só questão de tempo.
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