Superfaturamento de US$ 900
milhões na compra de 36 caças supersônicos pode ter favorecido Luís Cláudio
Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, e o prefeito de São Bernardo, Luiz
Marinho
SIGILO
BANCÁRIO
Documentos
da PF e do MP prova que Luis Cláudio Lula da Silva recebeu R$ 10 milhões de
forma ilegal
PREFEITO LOBISTA
Luiz Marinho
voou no caça sueco e foi decisivo para o contrato de US$ 5,4 bilhões
Por Mário
Simas Filho, 03/06/2016,
O Ministério Público e a Polícia Federal estão convencidos
de que Luís Cláudio Lula da Silva, filho caçula do ex-presidente Lula, e o
prefeito petista de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, estão envolvidos com o
recebimento de propinas na compra dos 36 aviões caças suecos Gripen feita pelo
governo federal em outubro de 2014. O negócio no valor de US$ 5,4 bilhões é um
dos mais nebulosos realizados pela gestão de Dilma Rousseff. A hipótese de um
superfaturamento estimado em US$ 900 milhões vem sendo apurada há algum tempo,
mas, na semana passada, agentes da Operação Zelotes que tiveram acesso à quebra
do sigilo bancário da empresa de Luís Cláudio se convenceram de que propinas
foram efetivamente pagas. A LFT Marketing Esportivo, empresa do filho do
presidente, era investigada por ter movimentado irregularmente R$ 4,6 milhões.
Os documentos bancários, porém, provam que Luís Cláudio recebeu mais R$ 10
milhões dos lobistas Mauro Marcondes e Cristina Mautoni. Ambos atuaram, com o
aval e apoio do prefeito Marinho, na venda dos caças.
O ESCOLHIDO
O Gripen era o azarão e acabou favorito. Qual o segredo?
O dinheiro encontrado nas contas da empresa de Luís
Cláudio será rastreado e, nos próximos dias, toda a documentação será remetida
para um outro grupo do Ministério Público do Distrito Federal que investiga
especialmente o negócio feito com os suecos. O inquérito aberto para apurar a
compra dos aviões chegou a ser arquivado em outubro do ano passado, mas foi
reaberto em fevereiro após uma busca e apreensão feita no escritório dos
lobistas, atualmente presos pela Zelotes. Agora, com a descoberta dos R$ 10
milhões do filho de Lula as investigações se afunilam. “A escolha dos caças da
empresa sueca pode ter sido resultado não apenas de critérios técnicos, mas de
possível influência indevida”, redigiu o procurador Anselmo Cordeiro Lopes no
despacho que reabriu as investigações. “Essa influência envolve corrupção de
agentes ou ex-agentes públicos federais”. O contrato assinado pelo governo tem
um valor US$ 900 milhões acima da proposta efetuada pela própria empresa sueca.
Emails apreendidos pela Operação Zelotes mostram que um executivo da Saab
(representante do Gripen) procurou a ajuda de Marcondes e do prefeito Marinho
para agendar reuniões com o ex-presidente Lula meses antes de ser assinado o
compromisso.
“Temos indícios de que os R$ 10 milhões localizados
na conta da LFT tenham origem no esquema dos aviões”, disse à ISTOÉ na
quarta-feira 1 um dos procuradores que acompanham a Operação Zelotes. “E temos
provas concretas de que o prefeito Luiz Marinho participou desse negócio”. O
procurador estranha o fato de o prefeito ter influenciado na compra dos caças,
ainda que em São Bernardo esteja uma das unidades da Saab. “Por que um prefeito
que não tem nenhuma relação com as Forças Armadas e nenhum conhecimento técnico
sobre aviões de guerra exerceu tanta influência nessa negociação?”, questiona o
procurador.
É verdade que o prefeito, ex-sindicalista, não tem
conhecimento técnico para optar sobre a compra de caças supersônicos e
participou ativamente do processo que escolheu os caças Gripen para equipar a
FAB. Mas o que não lhe faltou durante os anos de governo do PT foi influência
política. Marinho é íntimo da família do ex-presidente. Considerado por Lula o
melhor candidato para disputar o governo de São Paulo em 2018, é um dos poucos
petistas que visita o ex-presidente sem avisar com antecedência. Embora tenha
se reunido com americanos e franceses que concorreram com os suecos, Marinho
sempre se mostrou um parceiro da Saab. Em 2010, o prefeito, embora não tivesse
nenhum cargo formal para tratar do caso, viajou a Suécia e chegou a voar em um
caça Gripen. Naquele momento, Lula havia praticamente se comprometido a comprar
aviões franceses e no início do governo de Dilma os caças norte-americanos
foram apontados pelo Ministério da Defesa como os favoritos. A escolha do
Gripen surpreendeu a todos os especialistas. “O peso político do prefeito,
muito próximo da família Lula foi determinante para a decisão”, afirma um
lobista que defendia a compra dos caças norte-americanos.
De acordo com os delegados e procuradores que atuam
na operação Zelotes, o rastreamento dos R$ 10 milhões encontrados na conta da
empresa do filho de Lula certamente indicará a origem dos recursos. Num
confronto preliminar feito com os documentos apreendidos no escritório dos
lobistas, os investigadores encontraram indícios de que a empresa possa ter
sido usada para receber as propinas e que parte do dinheiro possa ter sido
repassada a Luiz Marinho. O prefeito nega qualquer irregularidade, mas admite
ter defendido a compra dos aviões suecos junto a autoridades do governo
federal. Segundo ele, o objetivo não era obter vantagens indevidas, mas criar
um pólo de desenvolvimento tecnológico em São Bernardo. Dois oficiais da FAB
ouvidos na semana passada por ISTOÉ, no entanto, asseguram que houve pagamentos
de propinas e lamentam o fato de a própria Aeronáutica não ter tido uma
participação mais efetiva na elaboração do contrato.
O ex-presidente Lula já depôs nesse processo e
disse achar “um absurdo” a possibilidade de seu filho e de Marinho terem se
beneficiado. Nas próximas semanas, tanto o prefeito como o caçula de Lula
deverão ser convocados para dar explicações.
NEGOCIAÇÃO
Lula com José Mindlin, na época à frente da Metal Leve, em 1977
O jogo duplo de Lula
O novo e último livro da série do
jornalista Elio Gaspari sobre a ditadura militar brasileira, “A Ditadura
Acabada”, é a parte mais conhecida da narrativa sobre os anos de chumbo. Vai do
desmantelamento de regime autoritário, a partir de 1977, até a abertura,
marcada pela eleição de Tancredo Neves, em 1985. Passa assim pelo nascimento de
Luiz Inácio da Silva, o Lula, como liderança. Gaspari mostra como nas grandes
greves metalúrgicas do Grande ABC, em São Paulo, Lula cresceu e se tornou uma
figura de destaque nacional. Mas o ganho de popularidade pessoal do então líder
do Sindicato dos Metalúrgicos não foi, como se sabe, acompanhado pela vitória
dos trabalhadores representados por ele. O livro relaciona fatos, entrevistas e
documentos que legitimam a desconfiança da composição do líder com os “patrões”
na derrota da paralisação de 1979. Ilustram declarações (de “companheiros”,
inclusive) e a reprodução de um bilhete afetuoso a Cláudio Bardella, com quem
Lula negociou a capitulação de 1979, uma derrota para a categoria que
representava. (Ana Weiss)
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