Crédito farto do BNDES para criar
gigantes empresariais brasileiras deixou histórico de quebras de companhias e,
agora, registra o maior pedido de recuperação judicial da história
Veja,
21/06/2016,
www.veja.com.br
Débitos da
Oi somam 65,4 bilhões de reais
Nesta segunda-feira, a Oi entrou com pedido de recuperação judicial. A dívida da companhia, de 65,4
bilhões de reais, faz desse o maior pedido do gênero já registrado no país - e
joga de vez uma pá de cal sobre a malograda política de campeões nacionais,
empreendida pelo governo petista a partir de 2008.
Apesar de toda a ajuda federal, essas companhias
nem sempre se mostraram capazes de assumir a posição de liderança que
almejavam. No caso específico da Oi, a "supertele nacional" jamais
chegou a ameaçar a posição das rivais Vivo, Claro e TIM em telefonia celular.
Entre outros negócios que foram eleitos como
prioritários pelo governo, o resultado foi variado: enquanto a JBS se tornou
líder global em carnes e a Fibria é a maior empresa de celulose do país, a LBR,
de lácteos, pediu recuperação judicial e saiu do mercado. O frigorífico Marfrig
também tem atuado no vermelho e precisou vender ativos.
E mais: a política de eleger campeões nacionais
para competir globalmente criou um grupo de "perdedores nacionais",
segundo quem não estava no grupo dos ungidos. Em setembro do ano passado, o empresário Graciano Roberto Russo, ex-controlador do frigorífico
Independência, compareceu ao Congresso para prestar depoimento à CPI do BNDES, que
analisava, entre outras coisas, os critérios de escolha dos tais campeões
nacionais.
As declarações de Russo foram didáticas e pungentes
sobre os efeitos colaterais da estratégia criada pelo governo. "Quando se
faz uma política de campeões nacionais e o governo arbitra, automaticamente
cria-se uma cadeia de perdedores", disse ele. O Independência, um dos
"perdedores", quebrou em 2009, enquanto a JBS virou uma gigante
global - com as bênçãos do BNDES.
A "supertele nacional" surgiu em 2008,
quando a Oi se fundiu com a Brasil Telecom, criando à época uma empresa com
atuação em todos os Estados, à exceção de São Paulo. Para que essa fusão fosse
feita, o governo teve de mexer na legislação - havia uma série de entraves
legais aos negócios.
Em 2013, também com uma ajuda do governo, a Oi, já
em dificuldades, se uniu a Portugal Telecom. A ideia foi vendida, à época, como
uma forma de criar uma multinacional de língua portuguesa capaz de concorrer
até em outros continentes. Mas nada disso deu certo, a dívida da empresa não
parou de subir e acabou culminando na recuperação judicial.
Insucessos - "O BNDES até ajudou companhias no passado. As
que prosperavam eram aquelas que precisavam de capital e tinham bons
projetos", Sergio Lazzarini, professor do Insper. A Embraer, por exemplo,
foi um caso que contou com ajuda estatal e conseguiu prosperar.
O exemplo de sucesso da Embraer não tem paralelo
com a política mais recente, em particular com a Oi. "No caso da Oi, houve
uma conjugação política importante. Foi uma movimentação que buscava duas
coisas: resolver os conflitos que estavam ocorrendo entre os acionistas e a
decisão do governo Lula de criar grandes grupos", afirma o professor.
De acordo Lazzarini, a política de campeãs
nacionais acabou no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. "Um
divisor de águas foi a tentativa do Abílio Diniz de fundir o Carrefour e o Pão
de Açúcar, com o dinheiro do BNDES. Na época, foi extremamente criticado."
Em entrevista recente, Rodrigo Zeidan, professor de
economia da Fundação Dom Cabral, disse que um dos problemas da política de
campeãs nacionais foi não ter focado em setores estratégicos, mas sim em
empresas que mantinham boa relação com o governo.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo,
em 2013, o então presidente do BNDES, Luciano Coutinho, afirmou que a promoção
da competitividade de grandes empresas era uma política que havia se exaurido.
Coutinho contestou, à época, o termo "campeãs nacionais". O BNDES diz
que associar o banco a campeãs nacionais pressupõe que há privilégios a poucas
empresas, o que seria incorreto. No entanto, as empresas que não entraram na
lista de eleitas dizem que o que ocorreu foi exatamente isso - o benefício aos
amigos do governo -, como atesta o depoimento de Graciano Roberto Russo à CPI
do BNDES em 2015.
Prioridade - Pelo menos, agora, com o pedido de recuperação
judicial, o BNDES terá uma vantagem. Os credores com garantia real - casos do
BNDES e o BRB (Banco de Brasília) - são os que deverão receber primeiro, além
dos credores trabalhistas. Os demais credores entram em fila separada. "No
fundo, o pedido de recuperação judicial não é ruim para a Oi. Eles caíram na
real de que a situação é crítica e que a reestruturação terá de ser
feita", disse uma fonte a par do assunto.
(Com Estadão Conteúdo)
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