Por
Reinaldo Azevedo, 06/07/2015,
www.veja.com.br
Quando, na semana passada, José Eduardo
Cardozo, ministro da Justiça, espalhou que estava pensando em deixar o governo,
tirei o sarro dele neste espaço. Afirmei o óbvio: quem realmente quer se
demitir não fica espalhando ruído pelos corredores; pede pra sair e pronto! Ele
só queria fazer firula. Eis que, nesta segunda, na Folha, lá está o homem, de
novo, a dar suas pedaladas jurídicas. Cresce o bochicho em Brasília sobre uma
eventual renúncia da presidente Dilma Rousseff ou sobre seu impeachment. E o
ministro da Justiça, em mais um exercício de direito criativo grita: “Golpe!”.
É mesmo?
Disse ele ao jornal: “É de um profundo
despudor democrático e de um incontido revanchismo eleitoral falar em
impeachment da presidente como têm falado alguns parlamentares da oposição”.
Como? Então vamos ver.
As contas do governo referentes a 2014
ainda não foram chanceladas pelo TCU. Vamos ver como o governo pretende operar
no tribunal. Se fossem avaliadas hoje, haveria a recomendação para que o
Congresso as rejeitasse. Se isso acontecer, é evidente que, à diferença do que
diz o ministro, abre-se o caminho para a denúncia por crime de
responsabilidade.
Segundo Cardozo, a análise das contas
feita pelo TCU “não pode causar nenhuma imputação de crime de
responsabilidade”. É mesmo? Vai ver a Lei 1.079 que está no arquivo do ministro
é diferente daquela que você pode ler aqui. A versão dele deve ter sido estornada dos Artigos 10 e 11, que
caracterizam as pedaladas como crime de responsabilidade, sim.
Há mais: a oposição ofereceu uma
denúncia contra Dilma à Procuradoria-Geral da República — cadê Rodrigo Janot? —
em razão da lambança fiscal, acusando-a de ter transgredido o Artigo 359 do
Código Penal. Não entrou em minudências agora — já expliquei isso aqui —, mas
também nesse caso se abre uma vereda para a perda do mandato.
E há a investigação em curso no TSE
sobre o uso de recursos irregulares na campanha de 2014. A VEJA desta semana
antecipa parte do conteúdo da delação premiada de Ricardo Pessoa, dono da UTC.
Ele entregou à força-tarefa da Lava Jato planilhas que evidenciariam que, entre
outras doações, repassou ilegalmente para a campanha de Dilma R$ 7,5 milhões.
Ele teria sido, digamos, convencido por Edinho Silva, então tesoureiro da
campanha e hoje ministro da Comunicação Social, que lhe teria lembrado gentilmente
que tinha muitas obras na Petrobras… Pessoa, a exemplo do doleiro Alberto
Youssef, vai depor à Justiça Eleitoral.
Não é só isso: em seu depoimento,
Youssef diz ter sido procurado por um emissário do PT no começo do ano passado
para repatriar R$ 20 milhões — isto é, trazer de volta dinheiro sujo enviado
para fora do país — para a campanha de Dilma. O doleiro afirmou ainda que só
não fez a operação porque foi preso antes. Crime eleitoral como esse, se
realmente ficar caracterizado, resulta na cassação da diplomação de Dilma. E
ela cai, sim.
Todos esses são caminhos absolutamente
legais, que só podem ser considerados golpistas por uma mente perturbada.
Notem: se o TSE condenar Dilma e lhe cassar o diploma, isso só será feito em
virtude da lei. Se o TCU recomendar a rejeição das contas de Dilma e se o
Congresso acatar o parecer, trata-se apenas do triunfo da lei. Se isso resultar
numa denúncia à Câmara com base na Lei 1.079, será, mais uma vez, em razão da
lei. Se Janot oferecer uma denuncia contra Dilma ao STF em razão da agressão ao
Código Penal — e caso ela venha a ser condenada ao fim —, mais uma vez, o que
se terá é o exercício da lei.
Golpista é querer ganhar o debate no
berro, fazendo de conta que inexiste um arcabouço legal no país. O discurso não
cola mais. Para citar o petista Chico Buarque, o tempo passou na janela, e só
as Carolinas lesas do PT não viram.
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