'Homem de
Dilma' na Eletrobrás cobrou propina para a campanha de 2014, diz dono da UTC
Segundo a delação premiada do
empreiteiro Ricardo Pessoa, negociação do contrato de construção da Usina de
Angra 3 serviu para que Valter Luiz Cardeal, diretor da Eletrobrás que tem
livre acesso ao gabinete da presidente, cobrasse do consórcio de construtoras
“doação” à campanha petista do ano passado
Por Daniel Pereira e Robson Bonin, 10/07/2015,
www.veja.com.br
SINTONIA – O engenheiro Valter
Cardeal, diretor da Eletrobrás e braço-direito da presidente no setor elétrico:
conluio com o tesoureiro João Vaccari Neto em Angra 3.
Quando era presidente, Fernando Henrique Cardoso
cultivou a fama de exterminador de crises, que, dizia-se, sempre saíam do
Palácio do Planalto menores do que entravam. De Dilma Rousseff, fala-se
exatamente o oposto. Centralizadora e avessa a negociações, a presidente semeou
um quadro de recessão econômica e de derrotas no Congresso. Rejeitada por nove
em cada dez brasileiros, ela também perde apoiadores no grupo de políticos e
empresários que ditam o rumo do país. Até o ex-presidente Lula, seu mentor, lhe
faz críticas cada vez mais contundentes. Com apenas seis meses de segundo
mandato, Dilma está só, não exerce o poder na plenitude nem consegue mobilizar
a tropa governista. De quebra, é acossada por investigações que podem
destituí-la do cargo - entre elas, a Operação Lava-Jato, que esquadrinha o
maior esquema de corrupção da história do país. Diante de uma conjuntura assim,
a maioria dos governantes optaria por mais diálogo, sensatez e pés no chão.
Dilma não. Ela reage à crise com argumentações destrambelhadas, otimismo
exagerado e erros primários de avaliação. Pior: como de costume, alimenta a
agenda negativa.
Na semana passada, a presidente, contrariando o
mais elementar dos manuais de política, fisgou a isca dos adversários e abordou
novamente em público a possibilidade de enfrentar um processo de impeachment.
"Eu não vou cair, isso é moleza", desafiou em entrevista ao jornal
Folha de S.Paulo, na qual chamou setores da oposição de golpistas. A resposta
foi imediata: "Tudo o que contraria o PT é golpe", ironizou o senador
Aécio Neves (PSDB). Nos regimes democráticos, a destituição de um mandatário
depende de provas, do aval das instituições e do apoio da opinião pública (veja
a reportagem na pág. 54). Em sua defesa, Dilma alega que jamais se locupletou
de dinheiro sujo. Falta a essa versão o respaldo inequívoco dos fatos. VEJA
teve acesso a mais um testemunho de que propina cobrada em troca de contratos -
desta vez, no setor elétrico, a menina dos olhos de Dilma - abasteceu os cofres
do PT em pleno ano eleitoral. Os operadores da transação criminosa foram o
onipresente João Vaccari Neto, então tesoureiro do partido, e Valter Luiz
Cardeal, diretor da Eletrobrás, o "homem da Dilma" na estatal e um
dos poucos quadros da administração com livre acesso ao gabinete presidencial.
O relato desse novo caso de desvio de verba pública
para financiar o projeto de poder petista consta do acordo de delação premiada
firmado entre o engenheiro Ricardo Pessoa, dono da construtora UTC, e o
Ministério Público Federal. Num de seus depoimentos, Pessoa contou que em
setembro do ano passado o consórcio Una 3 - formado por Andrade Gutierrez,
Odebrecht, Camargo Corrêa e UTC Engenharia - fechou um contrato para tocar
parte das obras da Usina de Angra 3. A assinatura do contrato, estimado em 2,9
bilhões de reais, foi precedida de uma intensa negociação. A Eletrobrás pediu um
desconto de 10% no valor cobrado pelo consórcio, que aceitou um abatimento de
6%. A diferença não resultou em economia para os cofres públicos. Pelo
contrário, aguçou o apetite dos petistas. Tão logo formalizado o desconto de
6%, Cardeal chamou executivos do consórcio Una 3 para uma conversa que fugiu
aos esperados padrões técnicos do setor elétrico. Faltava pouco para o primeiro
turno da sucessão presidencial. O "homem da Dilma" foi curto e
grosso: as empresas deveriam doar ao PT a diferença entre o desconto pedido
pela Eletrobras e o desconto aceito por elas. A máquina pública era mais uma
vez usada para bancar o partido em mais um engenhoso ardil para esconder a
fraude.
A conversa de Cardeal foi com Walmir Pinheiro,
diretor financeiro da empresa, escalado para tratar dos detalhes da operação.
Depois dela, Vaccari telefonou para o próprio Ricardo Pessoa e cobrou o
"pixuleco". "Quando soube que a UTC havia assinado Angra 3, João
Vaccari imediatamente procurou para questionar a parte que seria destinada ao PT
- o que foi feito pela empresa", relatou o empreiteiro. Aos
investigadores, Pessoa fez questão de ressaltar que, segundo seu executivo, foi
Cardeal quem alertou Vaccari sobre a diferença de 4 pontos percentuais entre o
desconto pedido pela Eletrobrás e o concedido pelas construtoras. Perguntado
sobre o que sabia a respeito de Cardeal, Pessoa afirmou: "É pessoa próxima
da senhora presidenta da República, Dilma Rousseff".
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