A manobra espúria garantiu a Dilma o direito de exercer cargos públicos
Por Augusto
Nunes, 01/09/2016,
www.veja.com.br
Valentina de Botas
O que a Constituição une, o Senado não pode
separar. Mas separou pena e sentença: é o saco de gatunos do PMDB em ação.
Contudo, o que fica de essencial é que Dilma Rousseff vai, que o Brasil falará
de si, mudaremos de assunto finalmente. Há menos de dois anos, Dilma se
reelegia como poste que seria ponte para o Lula de 2018 e a resistência se
abatia com a derrota de Aécio Neves por tão poucos votos e por tanta
roubalheira. A Lava Jato, a pressão das ruas e a crise econômica frustraram o
pesadelo hegemônico. Me parece que a soma das crises – política, econômica e ética
– revelou um país novo que esboça a urgente mudança de crenças e valores dos
brasileiros quanto ao papel do Estado e da sociedade, provou o quão nefasta
pode ser a tutela e a intermediação do Estado em relações privadas e confirmou
a vocação totalitária do PT e adjacências.
Petistas, congêneres e defensores insistem na
mentira de que o governo Temer é ilegítimo, mas não disseram o mesmo sobre
Itamar Franco, que assumiu depois da destituição de Collor. Sentiram-se
vingados porque haviam perdido a eleição para o marajá caçador de marajás. O
esquerdismo, na sua versão ressentida, expõe uma especialidade da idiotia
latino-americana que culminou no bolivarianismo: o personalismo na política.
Então, tudo é transformado em questões pessoais; é assim, por exemplo, que Lula
toma como ofensa pessoal a dupla vitória de FHC sobre ele nas eleições
presidenciais de 1994 e 1998. No Brasil, esse personalismo apresentou outra
degeneração no oportunista populismo de gênero, com a ascensão de Dilma
Rousseff. Com um carisma artificial, a ex-presidente forjou certo dilmismo e
grassaram entre nós o getulismo, o lulismo, o malufismo e até o marinismo.
Não gosto de governantes carismáticos e não gosto
de nenhuma dessas figuras que batizam ismos. Desconfio quando o carisma parece
ser sua única ou a mais alta qualidade, quando tudo o mais que possam fazer ou
dizer se sustenta neste tal appeal. Gosto de Serra, Merkel, Anastasia, Uribe e
FHC. Evidentemente, a inteligência e os bons modos democráticos do sedutor FHC
o tornam um político carismático, mas o sóbrio carisma dele só é uma qualidade
porque há as demais que a ele se somam e até o suplantam. Nos demais políticos
carismáticos, como também na espertalhona Marina Silva, por exemplo – que se
pronunciou a favor do impeachment ao mesmo tempo em que o senador Randolfe
Rodrigues, o único que representa a Rede, votou contra, – com ares de mandona,
a prolixidade de quem não tem o que dizer e o despiste sempre que interpelada
com firmeza, o carisma é o diluidor da figura institucional do governante para
robustecer a persona dele.
O nefando personalismo na recente política
brasileira pariu um jeca que precisou de quase 40 anos de vigarice para
instaurar o lulismo; uma parvoíce que em apenas 6 anos nomeia como dilmismo uma
vertente da escória; e uma Marina que só precisou de duas campanhas para fazer
florescer o marinismo. Sempre usando os pobres como álibi moral, escudo contra
a lei e anteparo de críticas, é somente no culto secular a figuras
antidemocráticas e medíocres, que os esquerzoides podem ainda defender o
capitalismo estatista, o coitadismo, os fins justificando quaisquer meios, a
vigarice intelectual para fraudar a história e convencer quem pensa pouco de
que nos salvarão da direita má que quer exterminar direitos, do imperialismo americano
que espreita nossas riquezas e da elite perversa que só quer, bem, continuar
sendo elite perversa.
Me parece que esse personalismo, à parte demais
deformações, nutre a permanente atitude belicosa de Dilma Rousseff que se vai
prometendo guerra. Sabemos que para essa gente qualquer arma vale, mas não
seria hora finalmente de pensar no país? De se dar conta de que o combate não
prejudica Temer – que, de resto, nada fez contra ela –, mas o país? Não, a
coisa é pessoal. Para escapar da merecida cadeia, talvez a mulherzinha se
homizie em algum cargo de administrações petistas que lhe garanta foro
especial, já que nesse “impeachment de coalização”, segundo uma definição
perfeita que li em algum lugar, ela contou com a manobra espúria que lhe
garantiu o direito de exercer cargos públicos.
Dilma deixa algumas lembrancinhas como às contas
arruinadas, um país a ser reconstruído, o futuro adiado e a mais importante de
todas: PT e congêneres nunca mais. Finalmente, passaremos a falar do futuro que
temos para hoje: reforma, reforma e reforma – é isso o que nos colocará no
século 21. Reforma, sobretudo, de mentalidade. Parabéns, ao Brasil que foi às
ruas (nos domingos, sem depredar nada nem atrapalhar o cotidiano) esfregar na
cara dos caras que essa primeira mudança já raiou no horizonte. O impeachment,
esse lindo, é só o começo, mas o começo é por onde as coisas começam mesmo.
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