Os senadores do PT estão ali com
o único objetivo de encenar a “paixão de Dilma”
Por Augusto
Nunes, 29/08/2016,
www.veja.com.br
Editorial do Estadão
O julgamento da presidente Dilma Rousseff já não
tem a menor importância, em si, para os petistas que a defendem no Senado. Por
se tratar de um processo essencialmente político, as favas já estão para lá de
contadas. Portanto, os senadores do PT estão ali com o único objetivo de
encenar a “paixão de Dilma”: diante das câmeras de documentaristas simpáticos à
causa lulopetista, encarregados de registrar os estertores de Dilma na
Presidência, esses histriões querem converter o julgamento em um dramalhão
épico, numa tentativa de ditar a história deste triste período.
Pode-se imaginar que o roteiro cinematográfico do
“martírio” de Dilma preveja como clímax a presença da presidente no Senado para
se defender, amanhã. Consta que a petista trará uma comitiva de três dezenas de
pessoas, entre as quais vários correligionários que foram seus ministros, que
certamente se comportarão, diante das câmeras, como devotados apóstolos. E há
ainda uma chance de ver Lula da Silva, a prima-dona da companhia, que planeja
aparecer no Senado para testemunhar o calvário de sua criatura. Como Lula
jamais será coadjuvante, em especial quando contracena com a inexpressiva
Dilma, pode-se deduzir que sua intenção seja roubar a cena – é ele, afinal,
quem julga ter um legado e uma história a defender, ao passo que Dilma, todos
sabem, é apenas um pedaço de sua costela.
Todos esses atores, portanto, estão a desempenhar o
papel que não lhes cabe: o de vítimas. Como Lula e grande elenco jamais
admitiram responsabilidade pelos grosseiros erros dos governos petistas, muito
menos pela corrupção sistêmica que carcomeu o Congresso e a administração
pública nos últimos dez anos, qualquer acusação de roubalheira ou de
irresponsabilidade só pode ser interpretada como campanha anti-PT.
Se o documentário sobre o impeachment de Dilma
fizer uso da técnica do flashback, poderá lembrar que, quando estourou o
escândalo do mensalão, Lula tratou de negar tudo. Confrontado com evidências
acachapantes do esquema de corrupção, Lula chegou a pedir desculpas ao País –
para salvar a pele, como sempre, o chefão petista não titubeou em jogar vários
de seus homens ao mar. Mais tarde, porém, diante do crescente desgaste de seu
partido, Lula tratou de mudar o discurso mais uma vez, dizendo que o PT não era
mais corrupto do que os outros partidos e que seus principais dirigentes
estavam sendo alvo de processos graças a uma perseguição deliberada contra os
petistas em geral. Tudo isso para salvar a pele dos corruptos de outros
partidos e aniquilar o “governo popular” do PT.
É com esse script, reescrito para as
circunstâncias, mas muito bem ensaiado, que os senadores petistas pretendem
constranger o Congresso perante as câmeras. “Qual é a moral deste Senado para
julgar a presidenta da República?”, perguntou a senadora Gleisi Hoffmann
(PT-PR), conspurcando a Casa para a qual ela mesma foi eleita. O evidente
desrespeito à democracia não passou despercebido pelo presidente do Supremo
Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, que, na condição de presidente da
sessão, admoestou a senadora quando ela insistiu, numa segunda ocasião, em
colocar todos os senadores no mesmo saco da imoralidade petista. “Não vou
admitir esse tipo de frase num julgamento como esse. Não volte a mencionar essa
expressão”, disse Lewandowski. Mas Gleisi, que afinal não estava preocupada com
nenhum julgamento, e sim com a construção da “narrativa” para a história, disse
que “esta Casa conspirou contra a presidenta Dilma”.
Eis então que representantes do partido que
protagonizou o mensalão e o petrolão, que tem três tesoureiros enrolados na
Justiça, que teve vários de seus principais dirigentes processados e presos e
cujo grande líder, Lula, acaba de ser indiciado pela Polícia Federal sob a
acusação de corrupção, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica julgam-se à
vontade para questionar a moral dos demais parlamentares.
Tudo tem um propósito claro: se todos são imorais,
então ninguém é – e se apenas os petistas são condenados, então isso só pode
ser “golpe”. É muito bom que tudo isso esteja sendo registrado em filme –
que servirá como precioso documento da incansável vocação dos petistas para
fraudar a realidade.
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