Quem no Brasil ainda teme que
Lula, duas vezes réu e agora sem máscara, ainda reine?
Por Augusto
Nunes, 22/09/2016,
www.veja.com.br
Texto de José Nêumanne publicado no Estadão
Do alto de sua empáfia, o decano dos suspeitos submetidos
a investigações no Supremo Tribunal Federal (STF) e auxiliar de fatiador da
Constituição Renan Calheiros, presidente do Senado, disse: “O exibicionismo da
Lava Jato tira prestígio do Ministério Público”. Agora cessa o que a antiga
musa canta, pois um poder mais justo se alevanta: o juiz federal Sergio Moro
calou os críticos da força-tarefa da “república de Curitiba” ao aceitar a
denúncia dela contra Lula.
Ainda é difícil saber se, mesmo não estando mais
incólume, o teflon que protegia Lula perdeu a capacidade de lhe manter o
carisma. Antes de Renan, outros críticos desdenharam do pedido de sua prisão
pelo promotor paulista Cássio Conserino. Tal impressão foi desfeita pela juíza
Maria Priscila Ernandes Veiga Oliveira, da 4.ª Vara Criminal de São Paulo, que
não achou a acusação tão imprestável assim: afinal, não a arquivou e, sim, a
encaminhou para o citado Sérgio Moro, titular da 13.ª Vara Federal do Paraná e
responsável pela Operação Lava Jato, decidir. E as mesmas vozes ecoam esgares e
esperneio da defesa de Lula contra o show de lógica clara dos “meninos de
Curitiba”.
Acontece que em nada o dito espetáculo de uma
semana atrás diferiu das coletivas anteriores, realizadas para a força-tarefa
da Lava Jato comunicar à população, o que é necessário nesses casos pela
gravidade dos crimes investigados e pela importância dos acusados sobre os
quais recaem as acusações. À exposição sobre o cartel de empresas compareceram
os mesmos procuradores, foi apresentado um libelo acusatório mais copioso (de
quase 400 páginas à época e de 149 agora) e também se utilizaram recursos
visuais (powerpoints) para ilustrar informações e explicações. Ainda como em
todas às vezes anteriores, nesta a defesa do Lula respondeu apelando para
recursos idênticos, e agora com uma agravante: a insistência numa frase para
desmoralizar os procuradores, mas que não foi dita por nenhum deles: “Não temos
provas, temos convicções”.
Em parte por nostalgia de suas ilusões, como
milhões de brasileiros encantados com o coaxar rouco do líder que Brizola
chamou de “sapo barbudo pra burguesia engolir”, em parte por medo da vingança
do ex-ídolo, se lhe forem devolvidas as chaves dos cofres da viúva, os
neocríticos crédulos perdem o sono. O pavor do chororô da jararaca que vira
crocodilo é antigo. Em 2012, a delação proposta por Marcos Valério Fernandes,
que cumpre pena pelo mensalão, sobre a compra do silêncio de um chantagista que
ameaçava comprometer Lula, José Dirceu e Gilberto Carvalho na morte de Celso
Daniel, sucumbiu à omissão do então procurador-geral, Roberto Gurgel, e do
ex-presidente do STF Joaquim Barbosa.
O episódio acima foi narrado ao juiz Sergio Moro
por Marcos Valério Fernandes, cuja versão não foi levada em conta porque seria
um “bandido apenado”, ao contrário dos cúmplices com mandato, indultados no
Natal pela mui compassiva companheira Dilma Rousseff. Deles só José Dirceu e
Pedro Corrêa ainda moram na cadeia, acusados de terem delinqüido direto das
dependências do presídio da Papuda.
A versão de Valério, no depoimento repetido quatro anos
depois, coincide com outra, que não deveria ser desqualificada, de vez que foi
narrada pela voz autorizadíssima do ex-líder dos governos petistas no Senado
Delcídio do Amaral (sem partido-MS). Nos autos do processo criminal, Sua
Ex-excelência contou que, no início do primeiro mandato, o governo Lula era
“hermético” e dele só participavam aliados tradicionais. Disso Dirceu
discordava, pois já tinha combinado com o presidente do PMDB, Michel Temer, a
continuação da “governabilidade” gozada pelo antecessor tucano, Fernando
Henrique. Ante a perspectiva do impeachment, contudo, o chefão constatou: “Ou
abraço o PMDB ou eu vou morrer”. Eis aí a lápide que faltava no quebra-cabeças.
Esta explica por que a bem pensante intelligentsia
brasileira cantou em coro com os advogados dos empreiteiros nababos condenados
por corrupção e a tigrada petralha o refrão “Valério bandido jamais será
ouvido”, que manteve Lula fora do mensalão. E esclarece futricas da República
de Florença em Brasília que põem o PMDB de Temer e Calheiros a salvo da
luminosidade dos holofotes da História. Assim, enquanto acompanha Gil e Caetano
entoando em uníssono “eu te odeio, Temer”, a esquerda vadia e erudita se
acumplicia ao direito ao esquecimento que têm desfrutado o atual presidente e
seus devotos do maquiavelismo no Cerrado seco.
Sabe por que esses celebrados “formadores de
opinião” rejeitam a “nova ordem mundial” (apud Caetano Veloso, promovido sem
méritos à companhia de Cecília, Drummond e Rosa, citados pela presidente do
STF, Cármen Lúcia, em sua posse)? É que agora a corrupção não fica impune como
dantes. E a maior evidência de que o velho truque de esconder castelos de areia
sob tapetes palacianos escorre nos esgotos das prisões é o fato de os
empreiteiros Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro optarem entre colaborar com a
Justiça ou mofar na cadeia, por mais caros e bem relacionados que sejam seus
causídicos. Só ficaram soltos os felizes mandatários que gozam de prerrogativa
de foro. A patota desfruta o privilégio de não responder pelos próprios crimes
e modificar as leis para moldá-las à sua feição.
É por isso que, enquanto faz juras públicas de amor
à Lava Jato, o alto comando do Planalto planta suas “preocupações” com a
excessiva vaidade ostensiva, capaz de cuidado, comprometer o “digno” trabalho
da força-tarefa. Pois saibam todos que estas linhas lêem que a fraude Lula não
engana mais a grande maioria, como já enganou um dia. E que, ao contrário de
antes, ele vai desmoronar, mercê do combate mundial à formação de quadrilhas
que usam a Justiça Eleitoral para lavar dinheiro sujo. De fato, Dallagnol e
Pozzobon atiraram nos pés. Nos de Lula…
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